Acórdão nº 284/03 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Maio de 2003

Data29 Maio 2003
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

Proc. n.º 5/03 Acórdão nº 284/03 1ª Secção

Relatora: Maria Helena Brito

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

  1. A. e mulher, B, interpuseram, junto do Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra, “recurso contencioso de anulação de um acto administrativo dos Serviços do Registo Predial” (cfr. fls. 2), tendo conjuntamente demandado o Estado Português, representado pelo Ministério Público, a Conservadora destacada da Conservatória do Registo Predial de Coimbra e o Director-Geral dos Registos e Notariado. Na petição do recurso concluíram do seguinte modo:

    “

    1. Os recorrentes são donos e legítimos possuidores de uma fracção «AE» que adquiriram por escritura pública de 21/08/84 à C. e tiveram-na inscrita a seu favor no Registo Predial entre 24/08/84 e 30/03/87 quando foi declarado caduco.

    2. E adquiriram esta fracção, de um prédio urbano constituído em Propriedade Horizontal, por escritura pública de 11/04/83, registadas e inscritas todas as fracções a favor da C., em 08/07/83 e nestas condições foi vendida aquela fracção.

    3. Caducado o registo da fracção «AE», voltaram os recorrentes a requerer o registo daquela aquisição efectuada pela escritura de 21/08/84 pela apresentação n° 43/22032000, tendo sido a mesma registada provisoriamente por dúvidas, o qual, por isso, caducou passado que foram 6 meses, sem que fossem removidas as dúvidas.

    4. Mas, o registo efectuado nos termos descritos, eventualmente por dúvidas, que mais parece uma recusa, fora assim efectuado sem prévia audição dos interessados no registo e ora recorrentes, nos termos do art. 100° do CPA.

    5. E apresentado recurso hierárquico para a Direcção Geral do Notariado, na Conservatória pretendeu-se recusar o recurso, por falta de preparo, sem se ter notificado os recorrentes, nos termos do art. 113° do Cód. Proc. Adm., por se entender que também estes comandos não se aplicam aos serviços prestados nas Conservatórias.

    6. E colocada esta questão à Direcção Geral, por Despacho do Senhor Director Geral, foi dada razão à Senhora Conservadora, determinando-se que os serviços públicos das Conservatórias não estão sujeitos ao que determina o art. 100° e 103° daquele C.P.A.

    7. Assim, salvo o devido respeito as decisões da Senhora Conservadora e do Senhor Director Geral, violaram os arts. 100° e 103° por força dos nºs 5, 6 e 7 do art. 2° do Cód. Proc. Adm.

    Nestes termos e melhores de direito, deve ser julgado procedente o recurso e, por via do mesmo, revogar-se os Despachos que determinaram o registo provisório por dúvidas, sem audição dos interessados, assim como recusaram a aplicação do Cód. Proc. Adm. e que foram pelo Director Geral sancionados.”

    O representante do Ministério Público, logo no momento inicial (fls. 119), sustentou, em síntese, que “a petição inicial de RCA não respeita os requisitos impostos pelo artigo 36º da LPTA, pelo que se deverá notificar os recorrentes para procederem à sua regularização”, tendo os recorrentes respondido a fls. 121 e seguintes.

    O Director-Geral dos Registos e Notariado deduziu a resposta de fls. 131 e seguintes, na qual sustentou, entre o mais, não possuírem os tribunais administrativos competência para decidir sobre a matéria em causa. Os recorrentes, a fls. 173 e seguintes, retorquiram que os tribunais administrativos eram competentes, atendendo a que “no recurso a que diz respeito os presentes autos não está em causa a recusa do registo, mas apenas os trâmites legais efectuados pela Conservatória para chegar à decisão que pode ser levada ao Tribunal Cível”.

    O representante do Ministério Público emitiu o parecer de fls. 179 e seguinte, no qual se pronunciou no sentido da incompetência material dos tribunais administrativos, nos termos que seguem:

    “[...]

    Os actos objecto do presente recurso contencioso de anulação estão inseridos no procedimento registral, que não se confundem, no que se refere à sua impugnação, de outros actos de conteúdo funcional e orgânico praticados pelos serviços dependentes da Direcção-Geral dos Registos e Notariado.

    Como muito bem diz o Exmº Sr. Director-Geral dos Registos e Notariado, os actos agora impugnados, tendo em conta a sua natureza para-judicial ou jurisdicional, uma vez que têm por finalidade titular ou publicitar de modo autêntico e juridicamente eficaz o estado civil e os direitos individuais das pessoas singulares e colectivas, não são actos administrativos, e, depois de esgotados os meios de impugnação graciosa – designadamente, o recurso hierárquico (onde, também aqui, apenas se aprecia o mérito, a juridicidade da decisão assumida pelo Conservador), só podem ser sujeitos ao controlo dos tribunais comuns, através dos meios processuais expressamente previstos no Código de Registo e Notariado, mas nunca pelos Tribunais Administrativos, que para tal são incompetentes em razão da matéria.

    É o que claramente resulta das disposições constantes do Título VII – «Da impugnação das decisões do conservador» – do Código de Registo Predial.

    Assim sendo, somos de parecer que deverá ser rejeitado o presente recurso contencioso de anulação, por incompetência material do tribunal administrativo, de conhecimento prioritário e autónomo, conforme decorre dos arts. 2°, 3° e 4° da LPTA.”

  2. Por sentença de fls. 181 e seguintes, o Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra declarou-se incompetente em razão da matéria para apreciar e decidir o recurso, pelos seguintes fundamentos:

    “[...]

    Da leitura do processo resulta que os actos recorridos são os seguintes:

    1. – despacho que recaiu sobre a ap. 43/22032000, proferido sem que tenha sido cumprido, antes, o art. 100° do C.P.A.;

    2. – despacho proferido no recurso hierárquico interposto deste primeiro despacho (que julgou extinta a instância do recurso e ordenou a cobrança de emolumentos), proferido sem que tenha sido cumprido, também, o disposto no art. 100° do C.P.A.

    Vejamos, então, o que diz o Código de Registo Predial (na redacção dada pelo D.L. 533/99, de 11/12).

    No título dedicado à impugnação das decisões do conservador, resulta que das decisões do conservador de recusa da prática do acto requerido pode ser interposto recurso hierárquico para o director-geral dos Registos e do Notariado ou recurso contencioso para o tribunal da comarca a que pertence a sede da conservatória – art. 140°, do C.R.P.

    Por outro lado, a interposição de recurso contencioso faz precludir o direito de interpor recurso hierárquico, equivalendo à desistência deste quando já interposto – art. 141°, n° 2, do C.R.P.

    Agora, e quanto ao recurso contencioso, dispõe o art. 146° do C.R.P.:

    1 – Recebido em juízo e independentemente de despacho, o processo vai com vista ao Ministério Público, para emissão de parecer.

    2 – O juiz que tenha intervindo no processo donde conste o acto cujo registo está em causa fica impedido de julgar o recurso contencioso

    .

    Na realidade, esta norma não determina qual seja o tribunal competente para conhecer do recurso contencioso interposto de acto do conservador.

    Mas já temos aquela outra norma, constante do art. 140°, que diz expressamente que o tribunal competente para conhecer do recurso contencioso interposto do acto de recusa é o tribunal da comarca.

    E neste outro caso a competência pertence ao mesmo tribunal.

    Desde logo, era absolutamente irrazoável atribuir naquele caso a competência ao tribunal de comarca e neste ao tribunal administrativo.

    Mas, além disso, o art. 147°, n° 1, atribui a possibilidade de recurso para a Relação da sentença proferida em processo de recurso contencioso.

    E também diz que da decisão da Relação não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – n° 3.

    Resulta claramente da lei que o tribunal competente para conhecer do recurso das decisões aqui atacadas é o tribunal da comarca.

    [...].”

  3. Desta sentença interpuseram A. e mulher recurso jurisdicional para o Supremo Tribunal Administrativo (fls. 190), tendo nas alegações respectivas (fls. 196 e seguintes) apresentado as seguintes conclusões:

    “

    1. Os recorrentes vieram...

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