Acórdão nº 115/98 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Fevereiro de 1998

Magistrado ResponsávelCons. Ribeiro Mendes
Data da Resolução04 de Fevereiro de 1998
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 115/98

Proc. nº 249/97

  1. Secção

Rel: Cons. Ribeiro Mendes

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

1. E..., LDA, sociedade identificada nos autos, deduziu reclamação, nos termos do nº 4 do art. 76º da Lei do Tribunal Constitucional, contra o despacho do Conselheiro relator no Supremo Tribunal de Justiça que não admitiu recurso de constitucionalidade do acórdão deste Alto Tribunal através do qual foi negado provimento a um recurso cível de revista interposto por aquela sociedade.

Invocou como fundamentos da reclamação os seguintes:

- A reclamante propôs processo cível na comarca de Lisboa contra a sociedade comercial que adquirira um prédio urbano sito na mesma cidade onde aquela instalara, no respectivo telhado, um anúncio publicitário luminoso, ao abrigo de contrato celebrado com os anteriores proprietários do imóvel. Pediu a declaração de nulidade da cláusula contratual que permitia a

denúncia do contrato, qualificado de arrendamento, para instalação de anúncio luminoso, bem como do próprio acto de denúncia praticado pela actual proprietária do imóvel. Cumulou com estes pedidos o pedido de pagamento numa indemnização computada em quantia certa relativamente a danos já verificados, e ainda numa indemnização a liquidar em execução de sentença referente a danos futuros:

- Em recurso de apelação interposto pela ora reclamante contra o saneador-sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados contra a ré e procedentes os pedidos reconvencionais, foram proferidos dois acórdãos, um acórdão a julgar o recurso e outro aclaratório deste, tendo ficado claro que o Tribunal da Relação de Lisboa considerou válida a denúncia contratual por considerar aplicável à situação sub judicio o disposto na alínea b) do nº 2 do art. 1083º do Código Civil, norma interpretada autenticamente pelo art. 5º, nº 2, alínea e), do Regime do Arrendamento Urbano (RAU);

- Inconformada, a autora, ora reclamante, interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo nas respectivas alegações suscitado questões de inconstitucionalidade normativa relativamente ao art. 5º, nº 2, alínea e), do RAU (violação da alínea h) do nº 1 do art. 168º da Constituição, versão de 1989), considerando que a autorização legislativa do RAU não permitia que o Governo, ao editar este último diploma, estabelecesse uma interpretação autêntica da indicada norma do Código Civil. Suscitara, ainda, a questão da inconstitucionalidade material da interpretação do art. 1083º do Código Civil (independentemente de ter sido ou não feita interpretação autêntica pelo RAU) que subtraísse este contrato de arrendamento ao regime vinculístico de proibição de denúncia livre pelo senhorio, por ofensa dos princípios da igualdade e da proporcionalidade;

- O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que julgou improcedente a revista, confirmou a qualificação aceite pelas instâncias do contrato como de arrendamento, tendo decidido que, quanto a esse contrato, não vigorava a proibição de denúncia por parte do senhorio no domínio da legislação anterior ao RAU, não valendo quanto a esse tipo de locação a regra do art. 1095º do Código Civil. No mesmo acórdão considerou-se que não se havia feito aplicação do art. 1083º do Código Civil, pelo que não cumpria conhecer da questão de inconstitucionalidade dessa norma suscitada pela recorrente, mas admitiu-se que, ainda que na resolução do caso se tivesse aplicado a alínea b) do nº 2 do art. 1083º do Código Civil - aplicação preconizada pelo Prof. Antunes Varela em anotação referida no acórdão - não se via como a norma, assim interpretada, pudesse ofender os princípios da igualdade e da proporcionalidade, consagrados na Constituição. Por outro lado, nesse acórdão afirmou-se que não era aplicável ao caso o disposto no art. 5º, nº 2, alínea h), do RAU, pelo que não se conheceria da questão de inconstitucionalidade deduzida;

- Face a este acórdão, a recorrente, ora reclamante, pedira a respectiva aclaração, mas o seu pedido foi indeferido, considerando o novo acórdão que se decidira com base na inaplicabilidade ao caso do art. 1095º do Código Civil, devendo ter-se por válida a cláusula de denúncia estipulada pelas partes, não violadora do preceito do art. 1055º, nºs. 1, alínea b), e 2 do Código Civil, "com apoio em doutrina autorizada e jurisprudência deste Supremo, que se citou (cfr. de fls. 704 a 706). Fundamento de direito em que repousa o decidido";

- O reclamante veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão que negara provimento à revista, mas esse recurso não foi admitido por despacho do Conselheiro relator, com fundamento de que as normas cuja inconstitucionalidade havia sido suscitada pela recorrente não haviam sido aplicadas pelo acórdão recorrido;

- É ilegal o despacho reclamado na medida em que o Supremo Tribunal de Justiça efectivamente aplicou as normas do Código Civil, apesar de se escudar na tese de que as não tinha aplicado, isto para evitar conhecer das questões de inconstitucionalidade suscitadas pela recorrente, face ao acórdão da Relação: "a doutrina (que, por definição, é interpretativa porque resulta precisamente da interpretação da lei) em que se reforça o Supremo para vir confirmar a decisão da Relação e que aquele Tribunal afirma ser...

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