Acórdão nº 289/99 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Maio de 1999

Data12 Maio 1999
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 289/99

Procº nº 391/98.

  1. Secção.

Relator:- BRAVO SERRA.

I

1. R... e M... intentaram contra A... acção, que veio a seguir seus termos como acção ordinária e pelo Tribunal de Círculo do Funchal, solicitando que fosse decretada a resolução de um contrato de arrendamento celebrado entre umas e outro, o qual tinha por objecto o rés-do-chão com entrada pelo n.º 4 da Avenida do Infante, na cidade do Funchal, contrato esse que se destinava à instalação de um estabelecimento de comércio próprio dos supermercados e fabrico de licores, aguardentes, salsicharia e confeitaria.

Invocaram as autoras, como fundamento do pedido, por entre o mais, que o réu cedeu, sem consentimento delas e sem alguma vez lhes ter comunicado tal facto, a exploração do referido estabelecimento à sociedade A..., Ldª.

Por saneador/sentença de 14 de Maio 1996 foi a acção julgada improcedente e, em consequência, absolvido o réu do pedido.

Não se conformando com assim decidido apelaram as autoras para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 11 de Março de 1977, negou provimento ao recurso.

Desse aresto recorreram de revista as mesmas autoras para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo, na alegação que produziram, concluído:-

"I) – Na disciplina jurídica do contrato de cessão de exploração ou locação de estabelecimento comercial devem observar--se as regras da teoria da combinação e da teoria da aplicação analógica, ou recorrer-se à interpretação extensiva.

II) – Por isso, o locador ou senhorio, como titular dos direitos de uso e fruição da res locata, tem o direito de exigir que o gozo do local arrendado não seja transferido, pro tempore e onerosamente, do locatário para outrem, sem autorização da sua parte, conforme resulta do disposto nos artigos 424º., nº. 1, 1022º,, 1023.º, 1038º., alínea f), e 1035º. do Código Civil.

III) – Assim, decidindo pela improcedência desta acção, por falta de autorização das senhorias para locação do estabelecimento comercial em causa, as instâncias violaram o artigo 1038º., alínea f), do Código Civil e o artigo 64º., n.º. 1, alínea f), do R.A.U.

IV) – De qualquer modo a cessão de exploração ou locação de estabelecimento comercial, a que se referem o artigo 1682º.-A, nº. 1, alínea b), do Código Civil, o artigo 111º., n.º. 1 do R.A.U. e o artigo 89º., alínea k), do Código do Notariado, está sujeita a comunicação, ao locador ou senhorio, nos termos do artigo 1038º., alínea g), do Código em primeiro lugar citado.

V) - Logo, provado, conforme está, que a cessão titulada pela escritura de fls. 10 e segs. não foi comunicada às senhorias, as instâncias, se não tivessem violado as disposições legais acima referidas, teriam violado então o artigo 1038º., alínea g), do Código Civil e ainda o artigo 64º., nº. 1, alínea f), do R.A.U.

VI) - Com efeito, neste caso, a falta de comunicação, nos termos da alínea g) do artigo 1038º. do Código Civil, constitui fundamento para resolução do contrato de arrendamento titulado pela escritura de fls. 6 e segs., de harmonia com a alínea f) do n.º. 1 do artigo 64º. do R.A.U.

VII) – De resto, com a interpretação das instâncias, o artigo 1038º., alíneas f) e g), do Código Civil e o artigo 64º., nº. 1, alínea f), do R.A.U. estariam ferido de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 62º., n.º. 1, da Constituição, atento o disposto no artigo 1305º. do referido Código."

2. Por acórdão de 19 de Março de 1998, o Supremo Tribunal de Justiça negou a revista e, respeitantemente à questão de inconstitucionalidade, discreteou assim:-

"................................................................................................................................................................

Têm as recorrentes, por inconstitucional, por violação do nº. 1 do art.º 62º. da Constituição da República Portuguesa, a interpretação dada pelas instâncias, aos artigos 1038º. alíneas f) e g) do Código Civil e 64º., nº. 1, alínea f), do Regulamento do Arrendamento Urbano.

Dispõe o referido preceito constitucional:

..................................................................................................................................................................................................

Não dizem as recorrentes como é que, ao julgar-se improcedente esta acção de despejo, se atingiu o seu direito de propriedade ou o da sua transmissão em vida ou por morte ou da fruição dos seus bens ou de não serem privadas deles.

No exercício desse direito de propriedade, as ora autoras celebraram um contrato de arrendamento com o ora réu.

Referiu-se, acima, que o seu direito de senhorias não foi, em nada, afectado pela cessão, não desse arrendamento mas do estabelecimento comercial, que foi instalado pelo ora réu no arrendado.

Uma e outra das partes vêm cumprindo as obrigações que assumiram.

Ao não se aplicar à cessão de estabelecimento comercial regras próprias do contrato de arrendamento não se está a violar o dito preceito constitucional. Trata-se de contratos diferentes, regulados por normas, como é natural, diferentes.

................................................................................................................................................................................................"

É deste acórdão que, pelas autoras da acção, vem interposto o presente recurso para Tribunal Constitucional, sendo que, de harmonia com o requerimento apresentado pelas mesmas na sequência do convite que, para tal efeito, lhes foi endereçado pelo ora relator, de concluir é que pretendem ver apreciada a (in)constitucionalidade, por ofensa do n.º 1 do artigo 62º da Lei Fundamental, das normas constantes das alíneas f) e g) do artº 1038º do Código Civil, quando interpretadas no sentido de o nelas prescrito não ser aplicável aos casos de locação de estabelecimento comercial.

Determinada a feitura de alegações, concluíram as recorrentes as por si efectuadas com as seguintes conclusões:-

"I) A Constituição garante a todos o direito à propriedade privada e à sua transmissão, em vida ou por morte (art. 62º., nº. 1).

II) Ora, o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas (Cód. Civ., art. 1305º.).

III) Pois bem, decidindo que não há lugar à comunicação, ao senhorio, da cedência do gozo da res locata , pro tempore e a título oneroso, juntamente com a exploração do estabelecimento comercial ou industrial nela instalado, o acórdão recorrido interpretou a norma do artigo 62º., nº. 1, da Constituição em termos que a invalida ou vicia de inconstitucionalidade material.

IV) Efectivamente, com tal interpretação, em desacordo com a norma do artigo 1038º., alínea g), do Código Civil, e com a norma do artigo 64º., nº. 1, alínea f), do R.A.U., o preceito do artigo...

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