Acórdão nº 167/99 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Março de 1999

Data10 Março 1999
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 167/99

Processo n.º 35/99

Conselheiro Messias Bento

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório:

    1. O MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO interpõe o presente recurso, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 4 de Novembro de 1998, para apreciação da constitucionalidade da norma constante do n.º 5 do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, na redacção introduzida pela Lei n.º 46/96, de 3 de Setembro - norma a que aquele aresto recusou aplicação, com fundamento em que ela viola o n.º 2 do artigo 20º da Constituição.

      Aquele acórdão foi proferido no recurso de agravo, interposto pela empresa T..., do despacho judicial, proferido na acção ordinária contra si proposta pelo BANCO E..., SA, pendente no Tribunal Cível de Lisboa.

      Nesse despacho, o Juiz concedeu apoio judiciário à agravante, na modalidade de dispensa de pagamento de preparos e custas, mas, fundando-se no disposto no mencionado artigo 7º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, na redacção introduzida pela Lei n.º 46/96, de 3 de Setembro, indeferiu o pedido por ela feito de nomeação de patrono.

      Neste Tribunal, alegou o PROCURADOR-GERAL ADJUNTO aqui em funções, que formulou as seguintes conclusões:

      1. Não constitui restrição excessiva ou desproporcionada relativamente ao direito de acesso à justiça, na modalidade da protecção jurídica, a que se traduz em limitar - quanto às sociedades, aos comerciantes em nome individual nas causas ligadas ao exercício do seu comércio e aos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada - o referido direito (de que gozem integralmente as pessoas singulares e colectivas sem fins lucrativos), de modo a não permitir que empresas que prosseguem uma actividade económica com fins lucrativos ponham a cargo da generalidade dos contribuintes o pagamento de custos que, embora ligados à administração da justiça, são inerentes ao normal "giro comercial" dos requerentes e cujo montante se não mostra manifestamente desproporcionado relativamente à dimensão económica da empresa.

      2. Na verdade, tal limitação ou restrição traduz mera decorrência das finalidades constitucionalmente atribuídas ao sistema fiscal e do princípio da igualdade na repartição de encargos públicos, bem como da regra de que devem ser prioritariamente os beneficiários de uma actividade económica, exercida com fins lucrativos, a fornecer os meios financeiros indispensáveis ao prosseguimento de tal actividade.

      3. Termos em que deverá ser julgado procedente o presente recurso.

      A empresa recorrida formulou as seguintes conclusões:

      1. Não obstante o brilho e erudição da douta alegação do Ministério Público – elogio sincero que se deixa reiterado – a verdade é que lhe não assiste razão, tal como não assiste razão aos doutos Acórdãos referidos.

      2. Por muito que custe admitir, a verdade é que não é possível em abstracto suprimir as condições de exercício de um direito fundamental, como é o de acesso aos Tribunais, fundando o juízo abstracto do legislador em considerações de normalidade, de comerciante médio, de despesas de custas e de honorários como custos de produção, do montante módico dos honorários dos advogados, a quem está vedado o sistema de quota litis, etc.

      3. Toda a argumentação carreada só contribui, na opinião da recorrida, para fortalecer o juízo de inconstitucionalidade do douto acórdão da Relação (onde, aliás, há opinião maioritária, que permite à recorrida juntar vários acórdãos que lhe dão razão), quanto à solução do legislador de 1996 de matar o mal pela raiz.

      4. A solução encontrada pode valer no Reino Unido ou ser aconselhada por uma prática exigente na Escandinávia, mas não resiste face ao "rochedo constitucional" que resulta dos artºs 13º, 18º, nºs 2 e 3, e 20º, nºs 1 e 2, CRP.

      5. Esse Alto Tribunal terá certamente ocasião de, confirmando a decisão recorrida, censurar a solução legislativa de restrição de um direito fundamental através da supressão da mesma quanto a uma classe de pessoas que é suposta ter à força do sucesso, por estar vocacionada ex lege para o lucro ... ainda quando tenha prejuízos que a tornem insolvente (antes de declarada a falência...).

      Termos em que se conclui pela improcedência do recurso.

    2. Cumpre decidir.

  2. Fundamentos:

    1. A norma sub iudicio:

      Com o objectivo de que "o ‘direito aos direitos’ ganhasse forma e efectiva viabilidade" (cf. o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro), o legislador editou o regime de acesso ao direito e aos tribunais. Pretendeu ele "promover que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos" (cf. o artigo 1º, n.º 1). E, para concretizar esses objectivos - precisou no n.º 2 do mesmo artigo 1º -, assegurou que se desenvolverão "acções e mecanismos sistematizados de informação jurídica e de protecção jurídica".

      A protecção jurídica - dispõe o artigo 6º - "reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário". Este último (o apoio judiciário) "compreende a dispensa, total ou parcial, de preparos e do pagamento de custas, ou o seu diferimento", e, bem assim, a dispensa de "pagamento dos serviços do advogado ou solicitador" (cf. o artigo 15º, n.º 1) - ou seja: o direito a patrocínio oficioso.

      Apenas às "pessoas singulares que demonstrem não dispor de meios económicos bastantes para suportar os honorários dos profissionais forenses, devidos por efeito da prestação dos seus serviços, e para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial" se reconheceu o direito a protecção jurídica completa - é dizer: o direito a consulta jurídica e a apoio judiciário (cf. artigo 7º, n.º 1). Às pessoas colectivas e...

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