Acórdão nº 44/99 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Janeiro de 1999
Magistrado Responsável | Cons. Luís Nunes de Almeida |
Data da Resolução | 19 de Janeiro de 1999 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 44/99
Proc. nº 682/97
-
Secção
Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. M... e mulher C... foram condenados, por decisão de 25 de Março de 1996, do 8º Juízo Cível da Comarca do Porto, a afectarem exclusivamente a "armazém-comércio" a fracção designada pelas letras "CA" do prédio sito na Rua da Alegria, nºs 962/972 e Rua Amélia de Sousa, nº 140, da freguesia do Bonfim, concelho do Porto, abstendo-se de a utilizarem na actividade de confecção de vestuário de cabedal como vinham fazendo.
Inconformados, recorreram dessa decisão para o Tribunal da Relação do Porto.
Nas suas alegações, suscitaram, desde logo, a questão da inconstitucionalidade da norma constante da alínea c) do nº 2 do artigo 1422º do Código Civil, nos termos seguintes:
5 - Sendo o direito à propriedade privada um direito de natureza análoga aos direitos previstos no Título II da C.R.P., aplica-se-lhe igualmente o regime dos direitos liberdades e garantias.
6 - Ora, mesmo admitindo que o disposto naquele preceito do Código Civil, constitui uma restrição expressamente prevista na Constituição, a mesma deve limitar-se ao necessário para salva-guardar outros direitos ou interesses constitu-cionalmente protegidos.
7 - Tratando-se de um prédio em regime de propriedade horizontal, e destinando-se as fracções autónomas dos Recorridos a habitação, é óbvio que tal disposição do Código Civil se destinará a garantir, no caso concreto, o direito à habitação.
[...]
14 - Ora, só terá sentido uma qualquer restrição ao direito de propriedade privada, nomeadamente ao seu componente liberdade de uso e função, que vise salvaguardar um outro direito constitucionalmente previsto.
15 - Todavia, da factualidade descrita constata-se que a restrição não atende nem em abstracto nem em concreto a essa salvaguarda, ou seja, tal restrição é absoluta, quer vise, quer não, proteger direitos ou interesses de terceiros.
16 - Nessa medida é inconstitucional a disposição do artigo 1422º, nº 2, alínea c) do Código Civil.
2. Por acórdão de 2 de Outubro de 1997, a Relação do Porto julgou improcedente a apelação e confirmou a decisão recorrida.
Quanto à questão de inconstitucionalidade suscitada, entendeu-se nesse aresto:
(...) o direito de propriedade privada é consagrado no plano constitucional como direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias do cidadão e como direito institucional de propriedade.
Não se trata, porém, de um direito absoluto, pois ele é garantido nos termos da Constituição, permitindo-se assim que o legislador modele o seu conteúdo e limites (v. art. 168º, nº 1, als. b) e j) da CRP).
(...)
O conteúdo do direito de propriedade, conforme decorre do disposto no art. 1305º do C. Civil, consiste no poder que o proprietário tem de gozar de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem.
Mas este poder comporta limites.
Na verdade, na própria descrição do conteúdo feita no art. 1305º referida, na segunda parte, refere-se expressamente que esse poder apenas existe dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas.
(...)
No caso da restrição imposta pela al. c) do nº 2 do art. 1422º do CC, ela radica, prevalentemente, em razões de interesses de ordem pública respeitantes à organização da propriedade, embora vise também a protecção de interesses particulares dos restantes condóminos
(...)
O fim da fracção tem a ver especialmente com o projecto aprovado pela entidade pública, em conformidade com o disposto nos art.s 3º, 6º, 8º e 165º do RGEU e não depende do arbítrio do instituidor da propriedade horizontal.
Na verdade, as condições de segurança, higiene, de compartimentação e áreas mínimas, etc., variam de forma significativa consoante o destino previsto para as diversas fracções de um prédio.
(...)
Sendo assim, assente o destino a que uma fracção de um prédio em propriedade horizontal está adstrito, não faz parte do conteúdo essencial do direito de propriedade de qualquer condómino dar-lhe outro destino.
O estabelecimento da limitação referida na al. c) do nº 2 do art. 1422º do CC não pode, pois, diminuir aquele conteúdo essencial.
E não contraria, também, o princípio da proporcionalidade estabelecido na última parte do nº 2 do art. 18º da CRP.
Este princípio, no âmbito...
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...[1] Cfr. fls. 290. [2] Cfr. n.º 2 dos factos provados. [3] Cfr. n.º 1 dos factos provados. [4] Ac. TC n.º 44/99, de 19/01/1999, DR de 05/08/1999, citado por Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 2.ª edição, pág. [5] Abílio Neto, Manual da Propriedade Horizontal, 3.ª edição, págs. 81 e 82. [6......
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