Acórdão nº 356/00 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Julho de 2000

Magistrado ResponsávelCons. Bravo Serra
Data da Resolução05 de Julho de 2000
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃo Nº 356/00

Procº nº 717/99.

  1. Secção.

    Relator:- BRAVO SERRA.

    I

    1. M..., S.A., interpôs junto da 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo recurso contencioso de anulação do acto praticado em 26 de Julho de 1996 pelo Ministro da Justiça e por intermédio do qual foi indeferido o recurso hierárquico que, pela recorrente, fora interposto do despacho proferido em 30 de Novembro de 1995 pelo Director-Geral dos Registos e Notariado, despacho este que não dera atendimento a uma reclamação que efectuara da cobrança de Esc. 9.009.600$00 devida a título de emolumentos pela efectivação de escritura pública visando a alteração do seu pacto social.

    Para o que ora releva, tendo os autos sido continuados com «vista» ao Representante do Ministério Público junto do Supremo Tribunal Administrativo, emitiu o mesmo «parecer» no sentido de, ponderando o disposto nos artigos 101º e 102º do Decreto-Lei nº 403/86, o recurso hierárquico do acto do Director-Geral dos Registos e Notariado interposto para o Ministro da Justiça se afigurar como um recurso de natureza meramente facultativa, assim se não podendo perspectivar o despacho impugnado como definidor da posição jurídica final da Administração, razão pela qual o recurso deveria ser rejeitado.

    Aquele Alto Tribunal, por acórdão de 18 de Novembro de 1998, julgou procedente a questão prévia suscitada pelo Ministério Público, assim rejeitando o recurso por ilegal interposição, nos termos do § 4º do artº 57º do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo e do artigo 25º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovada pelo Decreto-Lei nº 267/85 de 16 de Julho.

    Desse aresto recorreu a M..., S.A., para o pleno da Secção do aludido Supremo Tribunal, tendo, na alegação que então produziu, concluído do seguinte modo:-

    "1ª- A Recorrente sustenta que somente poderá existir uma diminuição ao direito de recorrer contenciosamente contra actos da autoridade, consagrado no art. 268º nº 4 da Constituição, na caso de ser restrição ou limite consagrado expressamente por lei, que veicule ou se justifique num valor constitucionalmente atendível e que não ultrapasse o necessário para salvaguardar a protecção destes valores (art. 212º nº 3, art. 268º nº 4 e arts. 17º e 18º da CRP).

  2. - Assim, as diminuições ou limitações do acesso à justiça administrativa e fiscal devem antes de mais ser claras e precisas: sendo devidamente formuladas pelo legislador por forma nítida e perceptível.

  3. - O legislador poderia, porventura, ter dito, de uma forma clara e inequívoca, que a reacção contra as ‘liquidações emolumentares’ proferidas pelos Conservadores era única e exclusivamente a ‘impugnação judicial’ prevista no art. 62º nº 1, al. a) do ETAF.

    Mas não o disse assim. Apenas estatuiu que aos Tribunais Tributários de 1ª Instância cabe conhecer dos ‘recursos de actos de liquidação das receitas tributárias estaduais’.

  4. - Esta norma atributiva de competência, por si só, não impede que de tais actos se possa recorrer na ordem hierárquica e que das decisões do Ministro da área administrativa caiba depois recurso contencioso para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos dos arts. 32º nº 2 c) do ETAF, conjugado com os arts. 92º nº 2, 100 nº 2 e 123º do Código de Processo Tributário.

  5. - Não é de modo nenhum clara a revogação total das normas específicas (arts. 69º do DL 519-F/79 e 139º do DR 55/80) dos diplomas sobre orgânica e competência dos serviços registrais e sobre ‘liquidações de contas emolumentares’ - na parte em que estatuem meios graciosos de impugnação.

    Pois que o ETAF trata de ‘competência’ do Tribunal, e não sobre outros pressupostos processuais, como a ‘imediata recorribilidade do acto’. Sobre este ponto valem as leis de processo contencioso, administrativo e/ou tributário.

  6. - E em qualquer dos sistemas instituídos por estas duas leis de processo contencioso o acto do Ministro agora sub judice é um acto recorrível.

  7. - Na primeira (lei do contencioso administrativo), porquanto teria de se partir então da definição de estar em causa um ‘acto administrativo respeitante a questão fiscal’ (art. 118º nº 2 do CPT), e como ‘acto administrativo’ de órgão situado numa hierarquia sujeito então ao recurso hierárquico prévio, dada não se tratar de competência ‘exclusiva’ ou ‘reservada’ ou ‘delegada’ a do Conservador.

  8. - Na segunda - lei do contencioso tributário -, porquanto aí expressamente se consagra a opção do particular-contribuinte em, dentro dos respectivos prazos, ou impugnar logo judicialmente a liquidação (art. 123º do CPT) ou desta reclamar e recorrer graciosamente, cabendo depois, das decisões negativas, o respectivo ‘recurso contencioso’ - salvo se houver sido deduzida já impugnação judicial sobre a questão de fundo (arts. 92º nº 2 e 100º nº 2 do CPT).

    Não tendo sido deduzida ainda nenhuma ‘impugnação judicial’, a via de tutela judicial da pretensão mantém-se intocada, dentro dos prazos dos respectivos recursos.

    1. - O acto sub judice nem sequer poderia ser considerado um ‘acto meramente confirmativo’ de outro anterior, porquanto os sujeitos não são os mesmos (Conservador e Ministro da Justiça), e a fundamentação é muito diferente nos dois casos.

    2. - O douto Acórdão recorrido,, ao rejeitar o recurso por ‘manifesta ilegalidade’ da sua interposição (art. 57 § 4º do RSTA) violou assim a lei (arts. 92º nº 2 e 100º nº 2 do CPT).

    3. - E ao entender que o art. 62º nº 1 alínea a) do ETAF, sem mais, obriga a um recurso imediato da ‘liquidação emolumentar’ para o Tribunal Tributário de 1ª instância, como meio único e exclusivo de se atacar tal conta emolumentar, apesar do disposto nos arts. 69º do DL 519-F/79 e 139º do DR 55/80, e sobretudo nos arts. 118º e 92º nº 2 e 100º nº 2 do Código de Processo Tributário, e sob pena da preclusão total da garantia de acesso à jurisdição administrativa e fiscal, -- ofende a Constituição, nos seus arts. 18º e 268º nº 4.

    Ou seja, essa interpretação da regra do art. 62º nº 1 a) - que daí extrai aliás o que não está lá expressamente dito e de forma inequívoca - não é conforme com a Constituição, nomeadamente com o verdadeiro princípio ‘pro actione’ postulado no art. 268º nº 4 e reforçado pela aplicação a esta garantia do regime consagrado no art. 18º da Lei Fundamental.

    ........................................................................................................................................................................................................................................................................................"

    2. Tendo o Pleno da 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 29 de Setembro de 1999, negado provimento ao recurso, dele veio a impugnante a recorrer, estribada na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, para o Tribunal Constitucional, com vista à apreciação da (in)constitucionalidade "das normas do art. 57 § 4º do RSTA (Dec. Lei 41.234, de 20.8.87) e do art. 62º, nº 1, al. a), do Dec.Lei 129/84 de 27/4, na interpretação que o Tribunal a quo aplicou para resolver a situação sub judice, segundo a qual, da liquidação emolumentar cabe única e exclusivamente recurso imediato para o Tribunal Tributário de 1ª Instância, ficando, em consequência, absolutamente precludida a hipótese de serem sindicados actos administrativos dos superiores hierárquicos, Director-Geral e Ministro, que indeferiram recursos hierárquicos tempestivamente deduzidos pelo particular".

    Igualmente a recorrente, pretendeu ver apreciada a inconstitucionalidade "da interpretação conjugada das normas dos arts. 92º, nº 2, 118º, nº 2 e 123º do Código de Processo Tributário, segundo a qual a opção expressamente concedida em tais disposições ao particular/contribuinte - para ou impugnar a liquidação ou dela reclamar e recorrer graciosamente e sempre depois com a garantia da via contenciosa sobre respostas negativas que obtiver -, não se aplica ao caso das liquidações de receitas efectuadas pela Administração não Fiscal, ou seja, a interpretação segundo a qual, não é contenciosamente recorrível o acto que decidiu o recurso hierárquico interposto de actos de ‘liquidação de receitas fiscais’ de que se não deduziu nenhuma impugnação jurisdicional quando tais actos, embora tributários, tenham sido praticados por Administração não Fiscal".

    Por despacho de 6 de Janeiro de 2000, foi o objecto do recurso circunscrito à norma vertida na alínea a) do nº 1 do artº 62º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais aprovado pelo Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, em consequência se determinando que as alegações a produzir somente incidissem sobre tal normativo.

    Na verdade, disse-se, no que ora interessa, nesse despacho:-

    ".................................................................................................................................................................................................

    A ora recorrente, como assinala na parte final do requerimento de interposição de recurso, sustenta que a "questão da inconstitucionalidade foi suscitada ... nos autos, por diversas vezes, nomeadamente nas 1ª, 2ª, 3ª, 8ª, 10ª e 11ª conclusões das alegações de recurso por si apresentado para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário"

    Como facilmente deflui da transcrição acima efectuada, e sendo certo que no «teor» da alegação produzida para o Pleno da 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo se não descortina qualquer menção de onde se extraia, directa ou indirectamente, expressa ou implicitamente, a arguição do vício de enfermidade por contrariedade com a Lei Fundamental reportadamente às normas ínsitas no § 4º do artº 57º do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo e nos artigos 92º, nº 2, 118º, nº 2 e 123º, estes do...

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