Acórdão nº 234/00 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Abril de 2000

Magistrado ResponsávelCons. Guilherme da Fonseca
Data da Resolução05 de Abril de 2000
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 234/00

Processo nº 179/99

  1. Secção

    Relator: Cons. Guilherme da Fonseca

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

    1. C. L. e S. Sv., com os sinais identificadores dos autos, vieram, "ao abrigo do disposto nos arts 69º, 70º (al. b) nº 1 e nº 2), 72º (al. b), nº 1), 75º, 75º-A e 78º (nº 4) da Lei nº 28/82, interpor recurso para o Tribunal Constitucional", da decisão do Tribunal da Relação do Porto (1ª Secção), de 20 de Janeiro de 1999, que desatendeu as pretensões dos recorrentes, arguidos "nos autos vindos do 1º juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – autuados como querela e registados sob o nº 301/97 – que o Ministério Público lhes move" e confirmou os vários despachos por eles impugnados naqueles autos, incluindo o despacho de pronúncia.

    2. No requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade invocam os recorrentes que o "recurso é interposto ao abrigo da al. b) do nº 1 do artigo 70º da referida Lei, pretendendo-se que o Tribunal aprecie a inconstitucionalidade das seguintes normas:

      a)...do artigo 664º do C. P. Penal de 1929 na interpretação específica adoptada no douto aresto proferido, sendo que, consideram-se violados os princípios constitucionais consagrados no nº 2 do artigo 32º e artigo 13º da Constituição, referindo-se que os recorrentes suscitaram a questão da inconstitucionalidade no requerimento de arguição de nulidade apresentado em 11.05.98.

      b)...do nº 1, nº 3 e al. b) do nº 4, todos conjugados, do artº 205º do C. Penal na interpretação determinada seguida no douto acórdão proferido, sendo que, consideram-se violados os princípios constitucionais dos nºs 1 e 2 do artigo 32º e artigos 13º e 18º da Constituição, esclarecendo-se que os recorrentes suscitaram a questão da inconstitucionalidade nas alegações de recurso apresentadas em 26.01.98.

      c)...da al. b) do nº 1 do artº 668º, do nº 3 do artº 666º e artº 158º do C. P. Civil (aplicáveis ex-vi artº 1º C.P.P. 29) na interpretação específica adoptada no douto aresto proferido, sendo que, considera-se violado o princípio constitucional consagrado no nº 1 do artº 208º da Constituição, referindo-se que os recorrentes suscitaram a questão da inconstitucionalidade nas alegações de recurso apresentadas em 26.01.98.

      d)...da 2ª parte do artº 328º e 1ª parte do artº 327º do C. P. Penal 1929 na interpretação específica seguida no douto acórdão proferido, sendo que, considera-se violado o princípio constitucional consagrado no nº 1 do artigo 32º da Constituição, esclarecendo-se que os recorrentes suscitaram a questão da inconstitucionalidade nas alegações de recurso apresentadas em 26.01.98.

      e)...do artº 335º (parte final) e 354º (corpo - 1ª parte) do C. P. Penal 1929 e nº 1 do artº 156º C.P. Civil (aplicável ex vi artº 1º CPP) , na interpretação específica seguida no douto acórdão proferido, sendo que, consideram-se violados os princípios constitucionais consagrados no nº 1 do artigo 208º, no nº 2 do artigo 205º e nº 1 do artigo 32º da Constituição, esclarecendo-se que os recorrentes suscitaram a questão de inconstitucionalidade nas alegações de recurso apresentadas em 08.10.97.

      f)...do artº 12º (corpo) do Dec. Lei nº 35007, do artº 3º do Dec. Lei nº 605/75 e artº 337º (corpo - 2º parágrafo) do C. P. Penal 1929, na interpretação determinada adoptada no douto aresto proferido, sendo que, consideram-se violados os princípios constitucionais dos nºs 1, 4, e 5, do artigo 32º da Constituição, esclarecendo-se que os recorrentes suscitaram a questão da inconstitucionalidade nas alegações de recurso apresentadas em 20.02.98".

    3. Nas suas alegações apresentaram os recorrentes a seguinte SÍNTESE CONCLUSIVA:

      "Atento o que exposto ficou, pode, resumidamente, concluir-se o seguinte:

      I...

  2. O Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Viana de Castelo e o Ministério Público junto do Tribunal da Relação do Porto devem ter-se pela mesma e única entidade, pelo que, tendo o Mº Público no tribunal de 1ª Instância respondido devidamente aos recursos dos arguidos, não é admissível que o Mº Público no Tribunal Superior apresente nova resposta a coberto do artº 664º do C. P. Penal 1929.

  3. Os princípios constitucionais da igualdade perante a lei e das garantias de processo criminal, impedem que o Ministério Público se pronuncie uma segunda vez sobre as mesmas questões carreando para o processo mais e novos argumentos no sentido de fazer vingar a sua tese – cfr. artigos 13º e 23º da Lei Fundamental.

  4. No caso específico tratado no processo ‘assegurar todas as garantias de defesa’ significa impossibilitar que o Ministério Público junto do Tribunal Superior, em longa intervenção, repise os argumentos antes expostos e acrescente ainda outros, depreciando numa fase crucial do processo as razões dos arguidos – cfr. citado artº 664º e artigo 13º.

    II...

  5. O nº 3 do artº 205º do C. Penal reporta-se e é directamente aplicável quer ao nº 1, quer à al. b) do nº 4 do mesmo artigo, pelo que no caso concreto do processo terá que considerar-se relevante a inexistência ou a desistência de queixa por parte dos supostos ofendidos.

  6. Ao interpretar a mesma norma jurídica – citado artigo 205º C. P. – não é possível discriminar os visados, pois que tal equivaleria a relevar uma restrição desnecessária para a salvaguarda de qualquer direito ou interesse constitucionalmente protegido, dando ainda importância a um dispositivo que não reveste carácter geral e abstracto – cfr. citada al. b) e artigo 18º Constituição.

  7. Os arguidos reclamam o direito de serem tratados em situação de igualdade com outros visados pela prática do mesmo tipo de crime, abstraindo-se de diferenciações baseadas em elementos económicos – cfr. artº 13º Constituição e também com interesse o Ac. STJ de 24.09.98 in Acs. STJ III 1998 pág. 170.

    III...

  8. Para decidir questões tão importantes suscitadas pelos arguidos como são o problema da ilegitimidade do Mº Público e a extinção do procedimento criminal, o tribunal não pode limitar-se comodamente e sem mais a declarar que adere na integra às razões do Mº Público, desconsiderando qualquer fundamentação – cfr. artºs 668º (al. b), 666º (nº 3) e 158º C.P. Civil e artigo 205º da Constituição.

  9. O tribunal deve especificar as razões por que decide em determinado sentido, discorrendo sobre as mesmas e extraindo as correspondentes ilações, por forma a que os interessados compreendam exactamente o teor de tal decisão, fiquem devidamente habilitados para querendo a impugnar e se convençam da imparcialidade e objectividade do Juiz – cfr. Normativos indicados na concl. 7ª e Doutor Gomes Canotilho in ‘Direito e Justiça’ citados nas alegações.

  10. O Tribunal da Relação no caso específico dos autos não pode suprimir a falta total de fundamentação do Tribunal de 1ª Instância, pois que tal significa proferir uma decisão totalmente nova cujos fundamentos os arguidos só então ficam a conhecer e que não podem discutir por lhes estar nessa ocasião vedado interpor recurso ordinário – cfr. artºs 20º (nº 1) e 32º (nº 1) da Constituição.

    IV...

  11. Não é admissível a intervenção desregrada do Mº Público no processo após uma intervenção decisiva dos arguidos e tão-só para destruir previamente todos os argumentos por eles aduzidos em sua defesa - cfr. artºs 328º (2ª parte) e 327º (1ª parte) C. P. Penal 29 e artigo 32º nº 1 da Constituição.

  12. As garantias (todas) de defesa dos arguidos consubstanciam-se intervenha também em impedir que o Mº Público no processo em momentos que não lhe estão destinados, por forma a assegurar a isenção e objectividade na realização de todos os actos de instrução por eles requeridos - cfr. normativos citados na conclusão 10ª.

    V...

  13. No final da instrução contraditória o tribunal está obrigado a analisar todas as provas produzidas e todos os actos de instrução realizados, discorrendo sobre tudo e extraindo as ilações adequadas, parecendo inconcebível que sem mais se limite a reproduzir textualmente a querela deduzida - cfr. artºs 335º (parte final), 354º (corpo - 1ª parte) C.P.P. 29, artºs 156º e 158º CPC e artigos 208º (nº 1) e 205º (nº 2) Constituição.

  14. Na administração da justiça exige-se que o tribunal fundamente as suas decisões mencionando as razões concretas por que julga em certo sentido, não podendo pois alhear-se de elucidar os motivos determinantes da sua convicção, aderindo pura e simplesmente à posição escrita de uma das partes do processo - cfr. normativos citados sob a concl. 12ª.

  15. Na situação específica do processo não pode relevar o facto de o Tribunal da Relação ter decidido suprir a total falta de fundamentação do despacho da 1ª Instância, já que só então são revelados aos arguidos os fundamentos da decisão, que nessa ocasião eles não podem mais discutir por lhes estar vedado o recurso ordinário - cfr. artºs 20º (nº 1) e 32º (nº 1) da Constituição.

    VI...

  16. A volumosa actividade processual documentada de fls. 2 a fls. 475 levada a cabo ao longo de quase 15 meses, pela grandeza e amplitude das investigações e actos realizados, representa manifestamente instrução preparatória, que o Mº Público pela parcialidade e subjectividade atinente a parte que realmente é, por sua própria iniciativa e autonomamente, não podia levar a cabo - cfr. artº 12º (corpo) Dec. Lei nº 35007.

  17. O conjunto de provas assim recolhidas até fls. 475 verificou-se de acordo com um objectivo só previamente definido pelo Mº Público em vista de basear a acusação aos arguidos, sem a mínima intervenção ou fiscalização do Juiz, afectando irremediavelmente as garantias de defesa dos recorrentes - cfr. artº citado e artigo 32º (nº 1., 4. e 5.) da Lei Fundamental.

  18. O Mº Público não podia assenhorear-se ao longo de quase 15 meses da fase de instrução preparatória, onde deve ponderar a objectividade e isenção que só o Juiz personifica, sendo certo que ao Mº Público só era consentido realizar diligências simples e breves e, mesmo assim, desde que se considerassem importantes para a descoberta da verdade material ou pudessem concorrer...

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