Acórdão nº 414/01 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Outubro de 2001

Data03 Outubro 2001
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 414/01

Proc. nº 541/00

  1. Secção

Relator: Cons.º Luís Nunes de Almeida

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I – RELATÓRIO

1. J... impugnou contenciosamente, no Tribunal Central Administrativo, o despacho do Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada que indeferiu, mandando arquivar, o requerimento em que pedia a revisão da sua pensão de reforma em conformidade com a promoção a que entendia ter direito, nos termos do Decreto-Lei nº 134/97, de 31 de Maio.

Atribuiu ao despacho recorrido, entre outros, o vício de violação do artigo 1º do mencionado Decreto-Lei nº 134/97. E invocou expressamente o seguinte:

  1. Da aplicação do Decreto-Lei nº 134/97 resultou pois um tratamento desigual para os militares deficientes das Forças Armadas, pois uns foram promovidos e outros não.

  2. Por outro lado se não se seguir o raciocínio anteriormente exposto estaremos perante uma violação do princípio constitucional da igualdade.

    [...]

  3. O Recorrente obedece aos requisitos impostos pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 134/97, pois é militar do quadro permanente da classe de fuzileiros da Marinha, é deficiente das Forças Armadas, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 18º do Decreto-Lei nº 43/76, está na situação de reforma extraordinária com um grau de incapacidade geral de ganho superior a 30% e não optou pelo serviço activo.

  4. Os militares que na lista de antiguidades da sua arma se encontravam à sua esquerda quando promovidos a cabos são hoje sargentos mores.

  5. O Recorrente tem pois direito a ser promovido ao posto de sargento mor.

  6. Mas não o foi porque a Entidade Recorrida entende, mas mal, que o Recorrente é deficiente das Forças Armadas por ter sofrido em serviço de campanha acidente anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 43/76, e consequentemente só podem ser promovidos os que sofreram acidentes em serviço de campanha mais tarde que o Recorrente.

  7. O tratamento das pessoas é desigual.

    A entidade recorrida, na argumentação produzida nas suas contra-alegações, entendeu, além do mais, que o recorrente se não enquadrava em nenhuma das situações previstas nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 18º do Decreto-Lei nº 43/76, nos termos determinados pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 134/97, uma vez que fora «qualificado DFA na vigência do Dec.-Lei 43/76 e por seu efeito»; e, no tocante à eventual violação do princípio da igualdade, entendeu a entidade recorrida que esta não se verificou, uma vez que «o pedido foi igualmente indeferido a todos quantos se encontravam na situação idêntica à sua e com idênticos fundamentos, ou seja, todos os que não reuniam os requisitos necessários para que fosse aplicado o Dec.-Lei nº 134/97».

    2. Por acórdão de 28 de Outubro de 1999, o Tribunal Central Administrativo julgou procedente o invocado vício de violação do artigo 1º do Decreto-Lei nº 134/97, e consequentemente, julgando procedente o recurso, anulou o acto recorrido.

    Considerou o TCA, no que à suscitada violação do princípio da igualdade concerne, que «negar ao recorrente os direitos previstos no DL nº 134/97 pelas razões invocadas pela autoridade recorrida, seria atribuir-lhe tratamento desigual, relativamente àqueles que em situação idêntica vêm a gozar de tais direitos, apenas pela circunstância de a decisão de qualificação de D.F.A. ter sido proferida após a entrada em vigor do DL nº 43/76, de 20 de Janeiro, o que equivaleria a uma interpretação contrária ao princípio da igualdade consagrado no artº 13º da Constituição e à doutrina do Acórdão do Tribunal Constitucional que fundamentou o DL nº 134/97» (ou seja, o Acórdão nº 563/96, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 33º vol., págs. 47 e segs.).

    O TCA explanou assim o seu raciocínio:

    Também por razões fundadas no princípio da igualdade não poderá colher o argumento da entidade recorrida de que o recorrente a partir do momento em que foi considerado incapaz para o serviço deixou de poder usufruir do direito de opção, não sendo abrangido pela proibição do n° 7 da Port. n° 162/97, de 31 de Maio, pelo que nem o Acórdão n° 563/96 do Tribunal Constitucional, nem o DL n° 134/97, de 31 de Maio, vieram a afectar a situação do recorrente. Com efeito, o art° 1 ° do DL n° 134/97, ao definir o âmbito do diploma com referência àqueles "que não optaram pelo serviço activo" apenas exclui aqueles que optaram pelo serviço activo. Daí que, no seu âmbito, se devam considerar abrangidos (i) os que não optaram pelo serviço activo, porque essa foi a sua vontade (ii) e os que não optaram porque não estavam em condições de o fazer, nomeadamente por terem sido considerados incapazes para o serviço activo .

    Na verdade, o entendimento a este propósito defendido pela autoridade recorrida, a ser seguido, acabaria por permitir que aqueles que em resultado da sua deficiência foram os mais prejudicados - os considerados incapazes para o serviço activo - tivessem um tratamento mais desfavorável, sem que, para tanto, existisse um fundamento material justificativo, o que se consubstanciaria num interpretação desconforme com o art° 13° da Constituição.

    O princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, proíbe ao legislador a adopção de medidas materialmente infundadas, ou seja, de medidas sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objectiva e racional - cfr., entre muitos outros, o Ac. do T.C. n° 188/90, publicado no D.R., 28 Série, de 12 de Setembro de 1990. Ora, o fundamento apresentado pela entidade recorrida para excluir da previsão do artº 1° do DL n° 134/97, de 31/5, os militares incapazes para o serviço activo - a impossibilidade de estes terem podido optar pelo serviço activo - não constitui um fundamento racional e plausível para tratar de forma desigual estes militares relativamente àqueles que não optaram pelo serviço activo, por ter sido essa a sua vontade. Na interpretação da entidade recorrida, os militares dos quadros permanentes deficientes das Forças Armadas, nos termos das alíneas b) e c) do n° 1 do artigo 18° do DL n° 43/76, de 20 de Janeiro, na situação de reforma extraordinária com um grau de incapacidade geral de ganho igual ou superior a 30%, e que não optaram pelo serviço activo, porque não estavam em condições de o fazer, nomeadamente por terem sido considerados incapazes para o serviço activo,- não seriam promovidos, não tendo, por consequência, direito à pensão de reforma correspondente; situação inversa se passaria, caso não tivessem optado pelo serviço activo, por ter sido essa a sua vontade, passando, pelo facto de serem promovidos, a ter direito à pensão de reforma correspondente ao respectivo posto. Trata-se, na verdade, de uma interpretação que, a adoptar-se, redundaria num tratamento mais desfavorável aos militares que em resultado da sua deficiência foram os mais prejudicados - os considerados "incapazes para o serviço activo" -, o que certamente não foi o objectivo do legislador, até porque não existe qualquer justificação materialmente fundada para que estes militares, contrariamente aos que não optaram pelo serviço activo, não sejam promovidos e tenham direito à pensão de reforma correspondente ao posto respectivo ( artº 1° e 2° do DL 134/94, de 31.5).

    3. Inconformada, o CHEFE DO ESTADO-MAIOR DA ARMADA interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, entendendo que o recorrente não fora alvo de tratamento desigual pois que «recebeu o mesmo tratamento que todos os outros DFA’s em idêntica situação», e concluindo ainda que «se desigualdade se verifica em relação aos DFA’s que puderam optar pelo serviço activo, ela resulta directamente da lei, imperativo que a Administração não pode deixar de acatar».

    Por sua vez, o ora recorrente, J..., nas respectivas contra-alegações perante o STA, defendeu a manutenção da sentença recorrida, pois a sua não promoção constituiria uma ofensa ao artigo 13º da Constituição.

    4. Por acórdão de 18 de Maio de 2000, o Supremo Tribunal Administrativo concedeu provimento ao recurso e revogou o acórdão recorrido.

    Considerou esse Supremo Tribunal, nomeadamente:

    [...] tendo o recorrido sido qualificado D.F.A. ao abrigo do DL. n.º 43/76, de 20 de Janeiro, como o Acórdão recorrido expressamente reconhece, não era abrangido pela previsão da alínea a), do n.º 7, da Portaria n.º 162/76, e daí não beneficiar da declaração de inconstitucionalidade decorrente do Acórdão n.º 563/96, nem ser contemplado pela disciplina do DL. n.º 134/97, de 31 de Maio. A questão da opção pelo serviço activo, apenas releva para a interpretação do art. 1.º do DL. n.º 134/97, de 31 de Maio, na medida em que, tem como destinatários os DFA. a quem a inconstitucionalizada norma da portaria n.º 162/76 negava o direito a essa opção - os considerados DFA nos termos da legislação em vigor anteriormente ao DL. n.º 43/76. Uma vez expurgada a aludida norma da ordem jurídica, aquela questão deixou de existir para qualquer DFA, pois a todos foi dada a possibilidade de opção pelo ingresso no serviço activo, nos termos do DL. n.º 43/76 - v.d. Ac. do T.C. n.º 563/96. [...]

    É certo que a diversidade das situações - dos DFA como tal considerados antes da vigência do DL. n.º 43/76 e dos que só posteriormente obtiveram tal qualificação - justifica que tal preceito legal só aqueles contemple, sem que isso implique violação do princípio constitucional da igualdade (v.d. parecer de fls. 165 dos autos). [...]

    Quando muito, esse entendimento poderia levar a que se considerasse ter o acto contenciosamente sindicado feito aplicação de uma norma contrária à nossa Lei Fundamental, mas já não legitima a conclusão, em que se baseou o Acórdão recorrido de que aquele acto haja violado essa mesma norma - v.d. G. Canotilho, in Direito Constitucional, Almedina, 1993, pág. 587 e segs.

    5. Inconformado, o recorrente veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da LTC, para apreciação da questão da inconstitucionalidade da norma constante...

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