Acórdão nº 172/01 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Abril de 2001

Magistrado ResponsávelCons. Messias Bento
Data da Resolução18 de Abril de 2001
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃ0 Nº 172/01

Processo n.º 642/2000

Conselheiro Messias Bento

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório:

    1. O MINISTÉRIO PÚBLICO interpõe o presente recurso do acórdão da Relação do Porto, de 26 de Junho de 2000, tendo esclarecido, neste Tribunal, em resposta ao convite feito, que o mesmo é interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da constitucionalidade da norma constante do artigo 14º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, interpretada "em termos de os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se converterem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo", que aquele aresto terá aplicado implicitamente, apesar de essa norma, em tal interpretação, ter já sido julgada inconstitucional pelo acórdão n.º 683/99, de 21 de Dezembro de 1999, vindo, depois, a ser declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, pelo acórdão n.º 368/2000. E, prosseguindo no esclarecimento, acrescentou que, «subsidiariamente – e apenas para o caso de se dissentir da invocada aplicação implícita da norma já anteriormente julgada inconstitucional – funda-se também o presente recurso na alínea a) do n.º 1 daquele artigo 70º (como decorre do requerimento de interposição) já que o Tribunal a quo – ao determinar a reintegração da autora – recusou implicitamente aplicar ao caso as normas constantes dos artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e dos artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, enquanto prescrevem a taxatividade das formas de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública e o carácter estritamente taxativo, residual e excepcional dos contratos de trabalho a prazo, celebrados com o Estado e outras pessoas colectivas públicas – e, consequentemente, estruturalmente inconvertíveis em relação laboral definitiva, nomeadamente por via da aplicação do regime geral da nulidade contida no artigo 42º, n.º 1, alínea e), do Decreto-Lei n.º 64-A/89 e decorrente da omissão de indicação do motivo justificativo da contratação a termo – como decorrência do princípio do acesso à função pública mediante concurso – que considerou colidente com "os princípios da boa fé, da igualdade e de segurança no emprego, estes últimos com tutela constitucional (artigos 13º e 53º da Constituição)"».

      O PROCURADOR-GERAL ADJUNTO em exercício de funções neste Tribunal concluiu assim a sua alegação:

    2. A decisão recorrida, ao considerar válida e eficaz a celebração de um contrato de trabalho com a Administração Pública fora do âmbito dos pressupostos previstos no artigo 14º do Decreto-Lei n.º 427/89 – convertendo-o em relação laboral permanente, como mera decorrência da omissão do motivo justificativo da celebração do contrato a prazo – não se conforma com o sentido e alcance do juízo (e subsequente declaração de inconstitucionalidade) da norma daquele artigo 14º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, constante do acórdão n.º 683/99 (e declarada inconstitucional pelo acórdão 368/2000), afrontando a ratio decidendi em que assentaram tais decisões do Plenário deste Tribunal Constitucional.

    3. Quando assim se não entenda – por se considerar que a situação dos autos não coincide, do ponto de vista jurídico, estritamente com a dirimida por aquele aresto – verifica-se – numa outra perspectiva de análise da decisão recorrida – que a mesma recusou implicitamente aplicar as normas constantes dos Decretos-Leis nºs 184/89 e 427/89, especificadas no requerimento de interposição do recurso, que – de forma expressa, clara e inquestionável, prescrevem que:

      - vigora um princípio de estrita taxatividade das formas de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública:

      - apenas é consentida a celebração de contratos a termo certo, com carácter excepcional, transitório e residual;

      - está postergada a constituição de relações laborais de duração indefinida, quer por originária estipulação das partes, quer como consequência de uma irregularidade "congénita" de contratação, quer como decorrência de uma renovação ou prorrogação ilegal de contratos originariamente celebrados a termo certo;

      - tais regras têm carácter imperativo, obstando à válida celebração e eficácia de outros contratos de trabalho, que não os legalmente tipificados.

    4. Tal recusa implícita de aplicação fundou-se, por outro lado, num juízo de inconstitucionalidade – a alegada colisão com o estipulado nos artigos 13º e 53º da Constituição da República Portuguesa – do regime legal que implica a imperativa proibição de celebração (ou renovação) de contratos que não sejam a termo certo, dentro dos parâmetros previstos no artigo 18º do Decreto-Lei n.º 427/89.

    5. Tal "bloco normativo" não padece, porém, da invocada inconstitucionalidade, já que o regime nele consignado é plenamente compatível com o princípio constitucional da igualdade e visa, em última análise, efectivar o princípio constitucional da regra do concurso como forma de acesso à função pública.

    6. Termos em que deverá proceder o presente recurso, determinando-se a consequente reforma da decisão recorrida.

      A recorrida P... não alegou.

    7. Cumpre decidir.

  2. Fundamentos:

    1. O objecto do recurso:

      O que, antes de mais nada, importa determinar é objecto do recurso. Ou seja: há que saber se, no julgamento do caso, o aresto recorrido aplicou, implicitamente embora, a norma constante do artigo 14º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, interpretada "em termos de os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se converterem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo" – norma que este Tribunal já anteriormente tinha julgado inconstitucional, no acórdão n.º 683/99, de 21 de Dezembro de 1999, vindo, depois, a declará-la inconstitucional, com força obrigatória geral, pelo acórdão n.º 368/2000; ou se, nesse julgamento, tal aresto fez aplicação – não daquele artigo 14º, n.º 3 –, mas de outras normas legais, para tanto recusando aplicação, embora tão-só implicitamente, mas por razões de constitucionalidade, às "normas constantes dos artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e dos artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, enquanto prescrevem a taxatividade das formas de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública e o carácter estritamente taxativo, residual e excepcional dos contratos de trabalho a prazo, celebrados com o Estado e outras pessoas colectivas públicas – e, consequentemente, estruturalmente inconvertíveis em relação laboral definitiva, nomeadamente por via da aplicação do regime geral da nulidade contida no artigo 42º, n.º 1, alínea e), do Decreto-Lei n.º 64-A/89 e decorrente da omissão de indicação do motivo justificativo da contratação a termo – como decorrência do princípio do acesso à função pública mediante concurso".

      É o que vai ver-se.

      Tendo em conta a matéria de facto que as instâncias deram como provada, para o que aqui importa, o caso dos autos pode sintetizar-se como segue:

      (a). A RECORRIDA celebrou, em 6 de Setembro de 1994, um contrato com a DIRECÇÃO-GERAL DE VIAÇÃO, a que foi dado o nome de contrato de avença, por força do qual – e mediante a retribuição mensal de 200.000$00 – lhe foram cometidas: as funções de consultadoria e formulação de pareceres em processos de contraordenação no âmbito do Código da Estrada; a intervenção em recursos para os tribunais de pequena instância criminal e de comarca; e a instrução e preparação de projectos de decisões do Governador Civil e do Director-Geral de Viação.

      (b). Esse contrato, que foi celebrado ao abrigo do disposto no artigo 17º do Decreto-Lei n.º 41/84, de 3 de Fevereiro (alterado pelo Decreto-Lei n.º 330/85, de 12 de Agosto), tinha a duração de três meses; era renovável por idênticos períodos; obrigava a recorrida a deslocar-se diariamente ao departamento da Delegação Distrital do Porto daquela Direcção-Geral (sito na Avenida Fontes Pereira de Melo da cidade do Porto); e obrigava-a, bem assim, a manter-se aí disponível durante o período de tempo acordado (de 2ª a 6ª feira, num período de cerca de seis horas...

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