Acórdão nº 172/03 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Março de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galvão
Data da Resolução28 de Março de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 172/2003

Proc. nº 379/00

  1. Secção

Relator: Cons. Gil Galvão

Acordam, na 3ª secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório

  1. A (ora recorrente) foi acusado pelo Exmº Promotor de Justiça de Justiça junto do 3º Tribunal Militar Territorial de Lisboa, pela prática de um crime de peculato, previsto e punível pelo artigo 193º, nº 1, al. a) do Código de Justiça Militar.

  2. Por acórdão de 2 de Março de 2000 decidiu o 3º Tribunal Militar Territorial de Lisboa:

    "1. Declarar que os factos imputados ao réu A, Sar/Chefe GNR nº ... não constituem crime essencialmente militar e, consequentemente, julgar o foro militar absolutamente incompetente em razão da matéria para deles conhecer e competente o foro comum.

  3. Subsidiariamente julgar inconstitucional a norma constante do art. 193º, nº 1 do CJM, se interpretada no sentido de que tal factualidade imputada ao réu constitui crime essencialmente militar, por violação do artigo 215 nº 1 da CRP/89.

  4. Julgar inconstitucional a norma constante da alínea a) do nº 1 do art. 193º CJM, por violação dos princípios constitucionais da igualdade (art. 13º) e da proporcionalidade (art. 18º, nº 2), comparativamente com a norma constante do art. 375º nº 1 CP.

    (...)".

  5. Deste acórdão foi interposto pelo Exmº Promotor de Justiça recurso obrigatório para o Supremo Tribunal Militar que, por acórdão de 4 de Maio de 2000, decidiu:

    "(...) conceder provimento ao recurso julgando-se competente o foro militar para conhecer dos factos dos autos e revogando-se o acórdão recorrido na parte em que declarou que o foro militar é absolutamente incompetente em razão da matéria para conhecer dos factos dos autos; que estes não constituem crime essencialmente militar; e que é inconstitucional a norma constante do art. 193º, n.º 1, do Código de Justiça Militar, se interpretado no sentido de que a factualidade imputada nos autos ao réu constitui crime essencialmente militar.

    Não se conhece, por carência de qualquer efeito prático, da (in)constitucionalidade do segmento normativo constante da alínea a) do n.º 1 do art. 193º Código de Justiça Militar.

    (...)".

  6. É desta decisão que vem interposto, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, o presente recurso, para apreciação da constitucionalidade da norma que se extrai do n.º 1 do artigo 193º do Código de Justiça Militar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 141/77, de 9 de Abril, enquanto qualifica o crime de peculato militar como crime essencialmente militar, por alegada violação do disposto no artigo 215º, n.º 1 da Constituição (na redacção decorrente da revisão de 1989).

  7. Já neste Tribunal foi o recorrente notificado para alegar, o que fez, tendo concluído da seguinte forma:

    "

    1. O elemento diferenciador entre o tipo de crime previsto no artigo 193º do CJM e o do artigo 375º do Código Penal é a qualidade de «integrado ou ao serviço das Forças Armadas», o qual no Código Penal corresponde a «funcionário»;

    2. O conceito de funcionário público para efeitos penais abrange o funcionário militar, pelo que se o R. não tivesse sido julgado em tribunal militar, tê-lo-ia sido nos tribunais comuns;

    3. Com a promulgação da CRP de 1976 passou a competir aos tribunais militares o julgamento dos crimes essencialmente militares, sendo que com o afastamento do foro pessoal, a qualidade de militar, por si só, deixou de ser motivo para a qualificação do facto como crime essencialmente militar;

    4. O Tribunal Constitucional na sua jurisprudência mais recente tem exigido a violação dum bem especificamente militar na qualificação de um crime como essencialmente militar;

    5. Por outro lado, com as alterações do artigo 213º da CRP, passou a competir aos tribunais militares o julgamento dos crimes estritamente militares;

    6. O conceito de crime essencialmente militar não pode deixar de ser entendido como sendo facto que ofende bens jurídicos que se encontram particularmente adstritos à prossecução das finalidades das forças armadas e que transcendam a tutela indirecta e mediata da disciplina destas;

    7. Da conjugação do artigo 197º da Lei Constitucional n.º 1/97 com o n.º 3 do artigo 211º da CRP, resulta que, presentemente aos tribunais militares compete o julgamento dos crimes essencialmente militares;

    8. No caso dos autos não é ofendido um interesse associado à função específica de defesa nacional, condição de livre desenvolvimento dos cidadãos portugueses e da preservação dos seus interesses individuais e colectivos;

    9. O facto de o arguido ter a qualidade de militar é irrelevante para qualificar o facto praticado como essencialmente militar e por maioria de razão como estritamente militar, afastado que está o foro pessoal dos militares e sendo que não foram postos em causa bens especificamente militares ligados à função militar específica de defesa da Pátria;

    10. O dinheiro tem natureza e função pecuniária, económica e fiduciária, e não é pelo facto de estar afecto à GNR ou às Forças Armadas que passa a ter natureza de essencialmente militar, tal como o afecto ao Ministério da Justiça, da Educação da Solidariedade, das Finanças, não têm natureza de essencialmente judiciário, académico, solidário ou financeiro.

    11. Não referindo o libelo mais do que o dinheiro pertencia ao «Estado, a quem causou prejuízo», não poderia deduzir-se que foram...

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