Acórdão nº 281/04 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Abril de 2004

Data21 Abril 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 281/2004

Processo n.º 759/03

  1. Secção

Relator: Cons. Mário Torres

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

  1. Relatório

    A., requereu, no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, por apenso a processo de intimação para a passagem de certidão deduzido contra o Presidente do Conselho de Administração do Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas (IFADAP), a ?execução do julgado? nesse processo, ?nos termos e para os efeitos dos artigos 84.º, n.º 2, e 95.º da LPTA [Lei de Processo nos Tribunais Administrativos ? Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho] e 5.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho?, aduzindo não estar integralmente cumprida a sentença de intimação proferida, em 23 de Maio de 2003, nesse processo e pedindo que o Juiz a quo ?desenvolva os mecanismos de responsabilidade civil, criminal e disciplinar que se impõe face ao disposto no artigo 84.º, n.º 2, da LPTA e artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, embora a requerente reserve o seu direito de ser ressarcida pelos prejuízos advenientes pelo incumprimento da sentença de V. Ex.a em momento posterior? e ainda que ?a autoridade requerida, e ora executada, se[ja] obrigada a prestar os documentos que tem em sua posse e que se inserem no pedido deduzido ? em especial aqueles referidos nos pontos i) a xvii) acima, ou, caso esta se recuse a fazê-lo ou não o faça integralmente, no prazo que lhe seja fixado para esse efeito, seja declarada por V. Ex.a a inexistência de causa legítima de inexecução, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, aplicado ex vi artigo 95.º da LPTA e prossigam-se os termos ulteriores do processo de execução de julgado?.

    Por decisão de 15 de Julho de 2003, o juiz do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa indeferiu liminarmente esse pedido de execução, por erro na forma de processo, por entender que dos artigos 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 256-A/77 e 96.º, n.º 1, da LPTA, resulta que o meio processual executivo em causa apenas pode ser utilizado quando se verifique a falta de execução por parte da Administração de sentença que anule acto administrativo (ou seja, refere-se apenas às sentenças proferidas em recurso contencioso de anulação), não fazendo sentido o uso desse processo executivo em relação ao processo de intimação, uma vez que a própria decisão de intimação contém uma ordem à Administração para efectuar o comportamento requerido, bem como o respectivo prazo, e, assim, a eventual decisão que no processo executivo viesse a deferir o pedido nada acrescentaria à sentença de intimação. Em caso de incumprimento da intimação, a autoridade requerida fica sujeita a responsabilidade civil, disciplinar e criminal, conforme disposto no artigo 84.º, n.º 2, da LPTA.

    Contra esta sentença interpôs a requerente recurso para o Tribunal Central Administrativo, sustentando nas respectivas alegações, além do mais, que a interpretação e aplicação dos artigos 95.º da LPTA e 5.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 256-A/77 violaria a garantia de tutela jurisdicional efectiva, corolário dos princípios de acesso ao direito e do Estado de direito democrático (artigos 268.º, n.º 4, 20.º, n.º 1, e 2.º da Constituição da República Portuguesa ? CRP).

    Por acórdão de 2 de Outubro de 2003, o Tribunal Central Administrativo negou provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação:

    ?O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença proferida em 15 de Julho de 2003, pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, pela qual se decidiu indeferir o requerimento de execução de julgado deduzido por apenso ao processo de intimação n.° 155/02 daquele Tribunal, por se haver entendido que: «...o presente meio processual não podia ser usado pela requerente, ocorrendo erro na forma de processo previsto no artigo 199.° do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1.º da LPTA, o que obsta ao prosseguimento do processo (artigo 57.°, § 4.º, do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo ? RSTA)», pelo que se indeferiu liminarmente o pedido de execução.

    Para tanto, considerou a sentença recorrida que em processo de intimação «nem sequer faz sentido o uso do processo executivo, uma vez que a própria decisão de intimação contém uma ordem à Administração para efectuar o comportamento requerido, bem como o respectivo prazo».

    A recorrente alega que, por um lado, não fundou o seu pedido nos preceitos analisados pela sentença (artigos 96.°, n.º 1, da LPTA e 5.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho), mas sim no artigo 95.° da LPTA (que remete para a aplicação a todos os meios do contencioso administrativo dos termos do artigo 5.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 256-A/77) e artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77; por outro lado, contrariamente à interpretação literal da decisão recorrida, o artigo 5.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 256-A/77 não restringe a sua aplicação a juízos anulatórios, pois que o mesmo refere a sua aplicação em acções de condenação da Administração por responsabilidade.

    Vejamos.

    O artigo 95.° da LPTA prevê que à execução das decisões dos tribunais administrativos pelas autoridades competentes «...é aplicável o disposto nos artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho, salvo o preceituado no artigo seguinte».

    Defende a recorrente que este preceito se aplica a todo o contencioso administrativo, ou seja, também em acções de condenação, e não apenas ao contencioso administrativo de mera anulação.

    Não há dúvida de que o artigo 5.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 256-A/77 se refere também à «acção», ao dizer «A execução de sentença proferida em contencioso administrativo (...) pode ser requerida pelo interessado, tratando-se de acção, ao competente órgão da pessoa colectiva nela demandada».

    No entanto, a acção aqui referida não é toda e qualquer acção das previstas nos artigos 71.º e 73.° da LPTA, mas tão-só a acção para reconhecimento de direito ou interesse legítimo (artigo 69.° da LPTA), única cuja tramitação segue os termos dos recursos de actos administrativos (dos órgãos da administração local ? cf. artigo 70.°, n.° 1, da LPTA), enquanto as previstas nos artigos 71.º e 73.° da LPTA se regem pelo artigo 72.° da LPTA, ou seja, seguem os termos do processo civil de declaração.

    Quanto a estas acções não só não é aplicável o disposto nos artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77, como se discute até, na doutrina e jurisprudência, se a execução de decisão condenatória deve ser intentada nos tribunais administrativos de círculo, se nos tribunais judiciais (cf. artigo 74.° da LPTA) ? veja-se sobre as posições da doutrina e da jurisprudência as anotações ao artigo 74.° referido, in Contencioso Administrativo, de Santos Botelho, 3.ª edição, págs. 442 a 445.

    Mas, mesmo que se entenda que a execução das decisões condenatórias proferidas nestas acções é da competência dos tribunais administrativos de círculo, o meio processual previsto nos artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77 e 95.° da LPTA não lhes é aplicável, mas sim o regime processual contido nos artigos 805.° e seguintes do CPC ? cf. neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 18 de Novembro de 1999, recurso n.º 29 521-A.

    É, assim, de entender que o artigo 95.° da LPTA e os artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77 apenas se aplicam aos julgados em sede de contencioso administrativo e não já a outras acções ou meios processuais previstos na LPTA, como resulta da própria letra da lei ? cfr. artigos 96.°, n.° 1, da LPTA (para o qual remete o artigo 95.°) e 5.°, n.° 1, 10.° e 11.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77.

    Aliás, tal como bem decidiu a sentença recorrida, «em relação ao processo de intimação nem sequer faz sentido o uso do processo executivo».

    Efectivamente, assim é.

    De facto, a própria decisão aí proferida ordena já à Administração que faculte a consulta de documentos ou processos ou que passe as certidões requeridas, estabelecendo o prazo em que tal deve ser cumprido.

    Não se vê, portanto, qual a utilidade de uma eventual execução de sentença, a qual nada acrescentaria ao já decidido.

    Poderíamos mesmo fazer uma analogia entre a tramitação da intimação e a execução de sentença, sendo que a tramitação prevista nos artigos 82.°, n.ºs 1 e 2, e 83.°, n.° 1, da LPTA corresponderia ao previsto nos artigos 5.°, 6.°, 8.° e 9.°, n.° 1, 1.ª parte, todos do Decreto-Lei n.° 256-A/77 (aqui averiguar-se-ia da existência ou não de causa legítima de inexecução, ali verificar-se-ia se a consulta ou certidões requeridas respeitariam a matérias secretas ou confidenciais que eximissem a Administração de as facultar), quanto ao artigo 84.°, n.° 1, da LPTA corresponderia ao previsto nos n.ºs 1, parte final, e 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77.

    Aliás, curiosamente a própria recorrente admite no artigo 48.° da sua alegação [e conclusão K)] que, uma vez que a sentença já contém um prazo para cumprimento, «o artigo 5.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, é redundante e, por isso, ao se tratar de fase sem utilidade, pode ser ultrapassada, entrando-se imediatamente na fase judicial de execução...».

    Ora, o artigo 95.° da LPTA, que a recorrente invoca, não permite que se aplique apenas parte do regime dos artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77 (excepto quanto ao regulado no artigo 96.°), não fazendo qualquer sentido pretender que se fixe novo prazo para a Administração cumprir o julgado e/ou arguir o não cumprimento de acordo com o previsto no artigo 84.°, n.° 2, da LPTA.

    Em nosso entender, ordenada na sentença que aprecia pedido de intimação o cumprimento do requerido no prazo aí fixado, o não cumprimento tem como consequência imediata o previsto no n.° 2 do artigo 84.° da LPTA, por ser esta a tramitação especial estabelecida por lei.

    É que, a ser aplicável ao processo de intimação o disposto nos artigos 5.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 256-A/77, não se...

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