Acórdão nº 223/04 de Tribunal Constitucional (Port, 31 de Março de 2004

Data31 Março 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 223/2004

Proc. n.º 202/04

  1. Secção

Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:

A ? O relatório

1 - A. reclama para a conferência, nos termos do n.º 3 do art.º 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator ao abrigo do n.º 1 do mesmo preceito, em que se decidiu não conhecer do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade da norma ?do art.º 312º, n.º 4, do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de que a sua aplicação não é obrigatória, impondo-se dessa forma que o Recorrente fosse patrocinado, em sede de audiência de discussão e de julgamento, por advogado diverso do mandatário que escolheu e constituiu nos autos?.

2 - A decisão reclamada tem o seguinte teor:

1 - A., com os sinais dos autos, recorre para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de Janeiro de 2004, que lhe indeferiu a arguição de nulidade do acórdão condenatório proferido pelo mesmo Supremo Tribunal, em 12 de Novembro de 2003, pretendendo que se aprecie «a inconstitucionalidade do art. 312º, n.º 4, do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de que a sua aplicação não é obrigatória, impondo-se dessa forma que o Recorrente fosse patrocinado, em sede de audiência de discussão de audiência de julgamento, por advogado diverso do mandatário que escolheu e constituiu nos autos, o que se traduz na violação do artigo 32º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP)».

2 - Considera, porém, o relator ser caso de não conhecimento do objecto do recurso, pelo que, ao abrigo do disposto no art.78º-A, n.º 1 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), se profere decisão.

3 - Senão vejamos. Estabelecem os arts. 280º, n.º1, al. b), da CRP e 70º, n.º1, al. b), da LTC que cabe recurso para o Tribunal Constitucional de decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Segundo a jurisprudência constante e uniforme deste Tribunal, constituem pressupostos específicos do recurso interposto ao abrigo destes preceitos que a norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie tenha constituído a ratio decidendi da decisão ou o fundamento normativo do seu próprio conteúdo, nisso se traduzindo a aplicação em concreto da norma, e que a questão de inconstitucionalidade tenha sido suscitada em tempo e por modo funcionalmente adequado para que o tribunal recorrido pudesse conhecer dela. A exigência daquele requisito encontra a sua razão de ser na própria natureza da função jurisdicional (aqui constitucional), dado que lhe cumpre apenas conhecer e decidir de controvérsias concretas e não de situações apenas académicas: se a norma cuja validade constitucional se questiona não serviu de fundamento à decisão, nunca a pronúncia sobre a sua eventual inconstitucionalidade poderia ter quaisquer reflexos jurídicos sobre a decisão, permanecendo-lhe estranha. Já relativamente ao ónus de suscitação, a questão tem que vem com o sistema de fiscalização concreta de constitucionalidade das normas que a nossa Lei Fundamental adoptou, de controlo difuso por via do recurso.

Como nota Cardoso da Costa (A jurisdição constitucional em Portugal, in Estudos em homenagem ao Professor Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, I, 1984, pp. 210 e ss.), «quanto ao controlo concreto ? ao controlo incidental da constitucionalidade (?), no decurso de um processo judicial, de uma norma nele aplicável ? não cabe o mesmo, em primeira linha, ao Tribunal Constitucional, mas ao tribunal do processo. Na verdade, não obstante a instituição de uma jurisdição constitucional autónoma, manteve-se na Constituição de 1976, mesmo depois de revista, o princípio, vindo das Constituições anteriores (?), segundo o qual todos os tribunais podem e devem, não só verificar a conformidade constitucional das normas aplicáveis aos feitos em juízo, como recusar a aplicação das que considerarem inconstitucionais (?). Este allgemeinen richterlichen Prüfungs - und Verwerfungsrecht encontra-se consagrado expressamente (?), e com o reconhecimento dele a Constituição vigente permanece fiel ao princípio, tradicional e característico do direito constitucional português, do ?acesso? directo dos tribunais à Constituição (?). Quando, porém, se trate de recurso de decisão de aplicação de uma norma (?) é ainda necessário que a questão da inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, em consequência do que o juiz tomou posição sobre ela (?). Compreende-se, na verdade, que a invocação da inconstitucionalidade unicamente ex post factum (depois de proferida a decisão) não seja suficiente para abrir o recurso para o Tribunal Constitucional (sob pena, além do mais, de se converter num mero expediente processual dilatório)».

Torna-se, pois, necessário que a questão de inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo. A suscitação durante o processo tem sido entendida, de forma reiterada pelo Tribunal, como sendo a efectuada em momento funcionalmente adequado, ou seja, em que o tribunal recorrido pudesse dela conhecer por não estar esgotado o seu poder jurisdicional. É evidente a razão de ser deste entendimento: o que se visa é que o tribunal recorrido seja colocado perante a questão da validade da norma que convoca como fundamento da decisão recorrida e que o Tribunal...

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