Acórdão nº 192/04 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução23 de Março de 2004
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 192/2004

Proc. n.º 581/02

  1. Secção

Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

A ? O relatório

1 - A., com os demais sinais dos autos, recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (doravante, LTC), do acórdão do Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, acórdão este que indeferiu a reclamação para a conferência do despacho do relator que julgou extinta a instância do recurso contencioso que interpusera contra um despacho do Provedor de Justiça que lhe havia aplicado a pena de aposentação compulsiva, pretendendo a apreciação da inconstitucionalidade da norma do artigo 287º, alínea e), do Código de Processo Civil, por violação de: «princípio de separação de poderes, princípio geral de um Estado de direito democrático - art. 2º da CRP - que impõe que o recurso contencioso tenha de seguir para decisão tendo em vista a formulação de um juízo sobre a conduta da Administração ao praticar o acto administrativo; garantia de anulação dos actos administrativos ilegais, prevista no art. 268º, n.º 4, da CRP, conjugado com o disposto no art. 18º, n.º 2, do mesmo diploma; direito a ser indemnizado por actos ilegais da Administração - art. 22º da CRP, conjugado com o art. 18º, n.º 2, do mesmo Diploma; princípios gerais de um Estado de Direito democrático - art. 2º da CRP - , da economia de meios processuais e da celeridade processual».

2 - O recorrente interpôs na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo recurso contencioso de anulação do despacho do Provedor de Justiça, de 24 de Março de 1995, que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva. Por acórdão da 3ª Subsecção daquela 1ª Secção daquele Supremo Tribunal, foi concedido provimento ao recurso contencioso e anulado o acto recorrido. Desta decisão recorreu o Provedor de Justiça para o Pleno da mesma 1ª Secção. Na pendência deste recurso jurisdicional, transitou, entretanto, em julgado, após recurso interposto pelo ora recorrente para o Tribunal Constitucional que lhe negou provimento, o acórdão do Pleno da 1ª Secção do mesmo Tribunal, proferido no recurso 31660, que decidiu negar provimento ao recurso interposto do acórdão da Subsecção que, por seu lado, negara provimento a outro recurso contencioso interposto pelo mesmo recorrente A. do despacho do Provedor da Justiça, de 17 de Novembro de 1992, que lhe aplicara a pena disciplinar da demissão da função pública. Face àquela decisão do referido Pleno proferida no recurso 31660, o relator do Pleno, neste outro processo, julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, de harmonia com o art. 287º, alínea e), do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao contencioso administrativo.

3 - A decisão recorrida abonou-se na fundamentação que de seguida se transcreve:

Estamos perante um processo onde se discute a legalidade da aplicação da pena de aposentação compulsiva ao ora reclamante, num momento em que, por decisão judicial transitada em julgado foi mantida na ordem jurídica a pena de demissão, aplicada por acto prévio da mesma entidade ao mesmo funcionário.

Quer lhe fosse ou não favorável a decisão a proferir no presente recurso, a sua situação de demitido da função pública, por despacho do Provedor de Justiça, de 17-11-92 a que se reporta o aludido acórdão do Pleno de 9-11-99, rec. 31.660, já não sofreria alteração, por força dessa eventual decisão, conforme se apontou no despacho reclamado.

Ora, ao contrário do defendido pelo reclamante, o recurso contencioso visa a pronúncia sobre a legalidade do acto, mas a utilidade da lide pressupõe que essa pronúncia tenha efeito útil, dentro dos possíveis efeitos específicos do recurso contencioso (ac. de 10.2.98, rec. 33.183, apêndice ao DR de 4 de Maio de 2001, pág. 275 e segs.).

Como também se decidiu no acórdão deste Pleno de 19-6-01, rec. 34.237:

"I - Se o recurso contencioso de anulação já não pode prosseguir os seus efeitos típicos, primários, há-de a respectiva instância ser declarada extinta por inutilidade superveniente da lide.

II ? Tão-pouco releva, nessas circunstâncias, a possibilidade de amanhã em execução de sentença ser atribuída indemnização pela inexecução do julgado anulatório, por causa legítima, nos termos do art° 10° do Dec.-Lei n° 256-A/77, de 17.6".

E no Sumário do acórdão do Pleno de 29.6.00, rec. 30.899, pode ler-se:

"1) - Há inutilidade da lide do recurso contencioso que tem como objecto uma pena disciplinar de demissão se o recorrente também foi demitido em processo penal.

2) - Não se justifica o prosseguimento do recurso contencioso no interesse em discutir a legalidade do acto tido por lesivo, para efeitos da acção de indemnização".

É esta orientação jurisprudencial do Pleno da 1ª Secção, inteiramente aplicável ao caso dos autos, que aqui se reitera.

E, não tem a mínima razão o reclamante quando alega que, ao tomar em consideração o trânsito em julgado do acórdão do Pleno de 9.11.99, extraindo desse facto os correspondentes efeitos neste processo, o despacho reclamado "está a praticar um acto de execução de uma sentença pelo Tribunal, entrando no estrito campo da actividade administrativa".

Na verdade, o Tribunal limitou-se a extrair as conclusões que, face ao acima referido, se impunha retirar quanto à utilidade do prosseguimento da presente lide processual, tendo, além do mais, em conta que, nos termos do artº 205º, n.º 2, da C.R.P "as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidade públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades".

Não se vê, pois, ao invés do sustentado, pelo reclamante como possa ter havido qualquer violação do artº 2º da C.R.P., segundo o qual "A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa".

2.2.2- Por último, é evidente que não houve qualquer interpretação do artº 59º, nº 1, da LPTA, contrária à Constituição, designadamente ao citado artº 2º da CRP, pois, ao contrário do sustentado pelo reclamante, este foi ouvido, mediante carta registada enviada ao seu advogado, em 23-5-01 (na altura, o único mandatário por si constituído no processo), sobre a questão suscitada no despacho da Relatora de fls. 628 quanto à presumível declaração de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (v. fls. 628 v.).

4 - Refutando o decidido em matéria de constitucionalidade pelo acórdão recorrido, assim concluiu o recorrente as suas alegações de recurso neste Tribunal Constitucional:

A) A norma do artº 287º, alínea e), do Código de Processo Civil, só ou articulada com a do artº 1º da Lei de...

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