Acórdão nº 502/05 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Outubro de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Vitor Gomes
Data da Resolução04 de Outubro de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 502/05

Processo n.º 579/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1, do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC) do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Junho de 2005, que confirmou os despachos do Conselheiro relator do processo nesse Supremo Tribunal, proferidos em 16 e 28 de Março de 2005, mediante os quais foi decidido que o recorrente fosse colocado em situação de prisão preventiva à ordem do processo de que foi extraído o presente traslado (P.º n.º 4273/00.0TDPRT – Vara Mista de Coimbra, em recurso no Supremo Tribunal de Justiça sob o n.º 751/05-3).

Já neste Tribunal, o relator restringiu, sem prejuízo de ulteriores afinamentos, o objecto do recurso a uma das questões identificadas pelo recorrente, a saber a inconstitucionalidade das normas ínsitas nos 202.º, 254.º, 257.º e 141.º, n.º 4 do CPP, com a interpretação de que pode ser imposta a prisão preventiva quando o arguido se encontra condenado a pena de prisão por decisão ainda sem trânsito em julgado, sem que previamente o arguido seja sujeito a interrogatório judicial pelo tribunal competente, interrogatório onde se respeitem as regras previstas no artigo 141.º, n.º 4 do CPP e, após tal interrogatório, a detenção, desde o início, classificada de prisão preventiva, seja fundadamente validada.

O recorrente apresentou alegações sustentando que a Constituição impõe que, ainda que seja um juiz a ordenar a detenção, desde que tal ocorra antes de transitar em julgado a decisão condenatória, o arguido deve ser apresentado, no prazo de 48 horas, ao juiz competente, que lhe deve comunicar as causas da detenção, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa, concluindo que devem ser julgadas inconstitucionais as normas ínsitas nos artigos 202.º, 254.º, 257.º e 141.º, n.º 4, todas do CPP, quando interpretadas e aplicadas nos termos com que o foram na decisão recorrida, isto é, no sentido de que o Supremo Tribunal de Justiça pode aplicar a medida coactiva da prisão preventiva, em casos de detenção fora de flagrante delito, após a culpa formada, sem interrogatório judicial prévio, que obedeça ao formalismo do aludido artigo 141.º, n.º 4 do CPP, mas com interrogatório serôdio de finalidade específica deprecado a tribunal incompetente, sem que tenha havido validação posterior, ponderando a verificação dos requisitos daquele primeiro normativo, por violação dos artigos 28.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1 da CRP.

O Ministério Público, alertando para que sobre questão semelhante, em processo em que figura como recorrente o mesmo arguido, recaiu recentemente o acórdão n.º 547/05, proferido pelo Tribunal em 4 de Agosto de 2005, sustenta que o recurso não deve proceder, concluindo que a decisão que determinou a colocação do arguido na situação de prisão preventiva à ordem de um processo já com sentença condenatória proferida, ainda que não transitada, não procedeu a qualquer interpretação normativa e susceptível de violar normas ou princípios constitucionais, ao não acolher o entendimento de ter que ser cumprido o dispositivo do n.º 4 do artigo 141.º do Código de Processo Penal e de haver que validar posteriormente tal medida coactiva.

  1. Resulta dos autos, com interesse para melhor compreensão da questão de constitucionalidade que importa resolver, o seguinte:

    1. O recorrente fora condenado na pena de 10 anos e 6 meses de prisão, e 45 dias de multa à taxa diária de 250$00, no P.º 946/98.4 TBBRG da Vara Mista de Braga, pena que se encontrava a cumprir, por último, no Estabelecimento Prisional de Paços de Ferreira;

    2. Foi novamente condenado como autor de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punido pelos artigos 21.º, n.º1, e 24.°, alínea h), do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, no processo n° 4273/00.0TDPRT, da 1ª Vara de Competência Mista de Coimbra, na pena de 10 anos de prisão, por factos cometidos durante o cumprimento da pena anteriormente referida;

    3. Dessa decisão foi interposto recurso para a Relação de Coimbra, que por acórdão de 29-9-2004, confirmou a condenação imposta;

    4. O recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça;

    5. Em 16 de Março de 2005, na pendência desse recurso, considerando que em 26 de Março de 2005 se imporia a colocação do recorrente em liberdade condicional porque nessa data atingiria os 5/6 da pena que cumpria [a referida em a)], o Relator do processo no Supremo Tribunal proferiu despacho do seguinte teor:

      “O arguido foi condenado como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, sendo considerado reincidente.

      O arguido mesmo em prisão preventiva, digo no EP de Coimbra, em cumprimento de pena efectiva, dedicou-se ao tráfico de estupefacientes, não oferecendo garantia de que, em liberdade, se absteria de o fazer.

      Aliás a pena de cumpre no EP respeita ao tráfico de estupefacientes, além do mais.

      Por isso se justifica, pelo justo receio de continuação da actividade criminosa, nos termos dos artºs. 204.º b) e 202.º n.º 1, a), do CPP, que aguarde o julgamento em prisão preventiva, à ordem dos presentes autos, interessando a sua colocação à ordem deste processo.

      Notifique-se. Comunique ao EPR e ao TEP/Porto – fls. 584 e 586.”

    6. Em 24 de Março de 2005, o Recorrente reagiu a esse despacho, pedindo a sua imediata libertação a partir das 6h30 do dia 28 de Março, por então se completarem 48 horas sobre o início da sua detenção à ordem do processo sem que tivesse sido sujeito a interrogatório judicial prévio (fls. 40);

    7. Por despacho de 24 de Março de 2005, durante as férias judiciais da Páscoa, o Senhor Conselheiro de turno no Supremo Tribunal de Justiça proferiu o seguinte despacho:

      “Solicite ao Tribunal de Marco de Canavezes – por ser o que, no próximo Sábado, se encontra de turno – que proceda à audição do arguido A. sobre as circunstâncias que entenda opor à necessidade da decretada medida de coacção de prisão preventiva. (envie, por fax, cópia do acórdão da Relação de Coimbra, do despacho de fls. 1593 e do requerimento que antecede).”

    8. Em 26 de Março de 2005, o recorrente foi interrogado pelo juiz de turno no Tribunal Judicial de Marco de Canavezes, nos termos solicitados pelo Supremo Tribunal de Justiça, lavrando-se auto nos termos que constam de fls. 59-65 do presente translado;

    9. Em 28 de Março de 2005, o Ex.mo Conselheiro de turno no Supremo Tribunal de Justiça proferiu o seguinte despacho:

      “A fls. 1575, a Direcção Geral dos Serviços Prisionais informou que o arguido atingiria no dia 26.3.2005, o cumprimento dos 5/6 da pena em que se encontrava condenado no âmbito do processo 946/98.4 TBBRG da Vara Mista de Braga, cuja libertação era obrigatória (cfr. Art. 61 n.º 5 do CP) – fls. 1575 e solicitava informação sobre se interessava a prisão aos presentes autos.

      Também o T.E.P. do Porto, solicitou idêntica informação (fls. 1576).

      O Exmo. Conselheiro Relator, ouvido o MP, lavrou despacho onde refere (transcrição):

      …o arguido no E.P. de Coimbra, em cumprimento de pena efectiva, dedicou-se ao tráfico de estupefacientes, não oferecendo garantia de que, em liberdade, se absteria de o fazer.

      Aliás, a pena que cumpre no EP respeita ao tráfego de estupefacientes além do mais.

      Por isso se justifica, pelo justo receio de continuação criminosa, nos termos do art. 204 alínea b) e 202.º n.º 1 alínea a) do CPP, que aguarde o julgamento em prisão preventiva, à ordem dos presentes autos, interessando a sua colocação à ordem deste processo.

      Notifique-se. Comunique ao EPR e ao TEP/Porto – fls. 1584 e 1586

      (fls. 1593 verso)

      E em 17.03.2005 foi expedida carta registada ao mandatário do requerente notificando-o do conteúdo do despacho de fls. 1593 verso, remetendo-lhe cópia.

      Na mesma data foram expedidos ofícios via fax ao E.P. de Paços de Ferreira (fls. 1595) e ao TEP do Porto (fls. 1597).

      O TEP do Porto – 2º Juízo informou este STJ, por ofício de 18.3.2005 (fls. 1599), que “…nesta data, foi solicitado ao proc...

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