Acórdão nº 637/06 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Novembro de 2006

Data21 Novembro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 637/2006

Processo nº 787-A/2001.

  1. Secção.

Relator: Conselheiro Bravo Serra.

1. Após a prolação do Acórdão nº 299/2006, veio o impugnante Licº A. apresentar extensa «reclamação».

Perante tal «reclamação», o relator, em 4 de Setembro de 2006, exarou nos autos: –

“1. Notificado do Acórdão nº 299/2006, veio o Licº A. apresentar reclamação, em que disse: –

‘A – Tendo presente, o princípio constitucional da proibição da indefesa, a presente reclamação é admissível

  1. Decorre do artigo 203.ºda Constituição que também os Membros do Tribunal Constitucional devem julgar segundo a Constituição e a lei.

  2. O reclamante considera que o modo como foi tirado o douto acórdão n.º 299/2006 não respeita os limites decorrentes dos artigos 158.º, 660.º, n.º 2, 664.º e 668.º, n.º 1, alíneas b), e d), do Código de Processo Civil.

  3. O n.º 3 do artigo 668.º do Código de Processo Civil prevê:

    ‘As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do nº1... podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário…’

  4. O n.º 2 do artigo 2.º do Código de Processo Civil dispõe:

    ‘A todo o direito, excepto quando a lei determine o contrário, corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da acção’.

  5. O meio processual previsto no n.º 3 do artigo 668.º do Código de Processo Civil integra a garantia de acesso aos tribunais que, tendo presente o disposto no n.º 1 do artigo 18.º da Constituição e no n.º 2 do artigo 2.º do Código de Processo Civil, constitui uma irredutível posição jurídica subjectiva fundamental.

  6. A jurisprudência tem ensinado:

    ‘...o legislador terá sempre de respeitar a dimensão da garantia de acesso ao direito e aos tribunais que se traduz em assegurar às partes uma completa percepção do conteúdo das sentenças judiciais e em assegurar a possibilidade de reacção contra determinados, vícios da decisão. O legislador terá, pois, de consagrar na legislação processual mecanismos que viabilizem, de modo eficaz, a prossecução de tais finalidades’ (Acórdão n.º 485/00 do Tribunal Constitucional de 22 de Novembro de 2000, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 48.º vol., pp. 401, 407).

  7. Assim, à luz das exigências do princípio da legalidade processual que, no mínimo, impede que o poder dos julgadores se sobreponha aos critérios normativos, a presente reclamação é legalmente admissível.

    B – Razões de facto e de direito pelas quais o reclamante considera que o modo como foi tirado o douto acórdão n.º 299/2006 não respeita os limites decorrentes dos artigos 158.º, 660.º n.º2, 664.ºe 668.º n.º1, alíneas b), e d), do Código de Processo Civil.

    I – No entender do reclamante, o douto acórdão n.º 299/2006, na parte que tem por objecto a reclamação pela qual o arguido reagiu ao processado conducente ao douto acórdão n.º 125/2006 conhece de questões de que não podia tomar conhecimento e não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, havendo violação do artigo 668.º, n.º 1, alíneas b) e d), do Código de Processo Civil.

  8. No entender do reclamante, o douto acórdão n.º299/2006, na parte referente à reclamação pela qual o reclamante reagiu ao douto acórdão n.º 125/2006, revela excesso de pronúncia

    1. Para indeferir a reclamação pela qual o reclamante reagiu ao douto acórdão n.º 125/2006, o órgão jurisdicional invoca factos logicamente impossíveis.

    Com efeito, no douto acórdão n.º 299/2006, lê-se:

    ‘1.1. Quanto à ‘reclamação’ referente ao dito Acórdão nº 125/2006, disse, muito em síntese, que o seu proferimento consubstancia um acto que a lei não admite, violando o nº 3 do artº 3º do Código de Processo Civil, pois que decidiu questões de facto e de direito relativas à interpretação do nº 8 do artº 84º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, sobre as quais o ‘reclamante’ não teve oportunidade de se pronunciar, colocou este numa situação de indefesa para reagir utilmente quanto ao decidido no Acórdão nº 627/2005, não indicou as disposições legais de que se serviu para qualificar como incidente a pretensão formulada de prestação de caução, tributou esse ‘incidente’ quando não estava em causa um ‘‘recurso’ ou ‘reclamação’ na acepção dos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 84º da Lei nº 28/82’ e não respeitou as garantias de imparcialidade.

    [...]

  9. Começando pela ‘reclamação’ atinente ao Acórdão nº 125/2006, é por demais evidente que, não tendo qualquer suporte legal a pretensão deduzida pelo impugnante no sentido de lhe ser fixada caução em montante equitativo com vista a, mediante a sua prestação, ser ‘dispensado’ do pagamento das quantias em dívida, pagamento esse que, in casu, actuava como conditio, nos termos do nº 8 do artº 84º da Lei nº 28/82, da prolação de decisão quanto à reclamação que foi deduzida do Acórdão nº 377/2005, a suscitação de tal pretensão teria de ser perspectivada, como foi, como um incidente sem cabimento’ (carregados acrescentados).

    Constituindo a prestação de caução uma garantia de pagamento ou início de pagamento, não se vê como é que se poderá logicamente afirmar que, com um pedido de admissão a constituir caução o reclamante pretendia ser dispensado do pagamento ‘das quantias em dívida’.

    Tendo em conta o contexto em que o pedido no sentido de ser admitido a prestar caução e o texto do requerimento tributado, conclui-se que a pretensão do reclamante tendia a salvaguardar a possibilidade de uma reacção útil ao modo como foi administrada a justiça através do douto acórdão n.º 627/2005.

    Sendo assim, há que reconhecer que o órgão jurisdicional, para julgar descabido o pedido apresentado, não se cingiu aos factos alegados pelas partes nem aos que resultam da discussão e instrução da causa, violando o disposto no artigo 664.º do Código de Processo Civil.

    1. Além disso, confrontando o ponto 1.1 do douto acórdão n.º 299/2006 com [ ] as passagens do ponto 2, conclui-se que o órgão jurisdicional ocupou-se de questões que não foram suscitadas pela reclamação pela qual a parte reagiu ao processado conducente ao douto acórdão n.º 125/2006.

    No entender do reclamante, tendo em conta as exigências decorrentes do princípio da imparcialidade, o conhecimento oficioso das questões indicadas nessas passagens, no âmbito do douto acórdão n.º 299/2006, não pode ser legitimado pela última parte do n.º 2 do artigo 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

    Nestas condições, o órgão jurisdicional não se deteve dentro dos limites de conhecimento legalmente previstos.

  10. O douto acórdão n.º 299/2006 não indica os fundamentos de facto e de direito que permitam um controlo geral e externo da fundamentação factual, lógica e jurídica da decisão de indeferimento da reclamação que veiculou a reacção ao processado conducente ao douto acórdão n.º 125/2006.

    1. No douto acórdão n.º 299/2006, lê-se:

      ‘Pelo que tange aos demais vícios assacados a tal aresto, não descortina o Tribunal, de todo em todo, que eles se verifiquem.

      Estava, então, em causa, a dedução de uma pretensão que, como se disse, por carecer de base legal, nunca seria passível de atendimento, tendo-se motivado suficientemente as razões conducentes ao juízo decisório que se tomou.

      Foi esse o objecto da decisão.

      E, não se afigurando padecer ela de quaisquer vícios, não será por via de uma ‘reclamação’ que à ‘parte’ é facultada uma reacção que tem por único objectivo obter uma modificação do decidido que, repete-se, foi devidamente justificado’ (carregados acrescentados).

    2. A função, atribuída à fundamentação das decisões judiciais, de viabilizar um controlo geral e externo da fundamentação factual lógica e jurídica de uma decisão judicial não se cumpre apenas com a utilização de expressões do género ‘é por demais evidente...’

    3. Lendo o ponto 1.1 e 2 do douto acórdão n.º 299/2006, conclui-se que, nele, não se encontram passagens em que sejam especificados os factos de que se serviu o órgão jurisdicional para indeferir a reclamação que veiculou a reacção ao processado conducente ao douto acórdão n.º 125/2006.

    4. O texto do douto acórdão n.º 299/2006, não permite identificar as disposições legislativas ou constitucionais que legitimam a conclusão de que a pretensão formulada pelo reclamante não tem ‘qualquer suporte legal’.

    5. Da declaração de que ‘não se afigurando padecer ela de quaisquer vícios, não será por via de uma ‘reclamação’ que à ‘parte’ é facultada uma reacção que tem por único objectivo obter uma modificação do decidido que, repete-se, foi devidamente justificado’ demonstra que o órgão jurisdicional impôs ao reclamante o sacrifício total das garantias de defesa inerentes ao direito ao processo equitativo a todos reconhecido [no] n.º 4 do artigo 20.º da Constituição escudando-se no n.º 8 do artigo 84.º da Lei n.º 28/82.

    6. Porém, o órgão jurisdicional não indicou nem as regras de interpretação aplicadas nem as razões constitucionalmente relevantes que legitimaram tal sacrifício.

    7. No entender do reclamante, a indicação das regras de interpretação de que se serviu o órgão jurisdicional e das razões constitucionalmente relevantes ocorridas para sacrificar as garantias de defesa é indispensável para assegurar a legitimação da decisão, já que o próprio n.º 8 do artigo 84.º, da Lei do Tribunal Constitucional que remete para o artigo 720.º do Código de Processo Civil prevê a possibilidade de modificação das decisões proferidas pelo órgão jurisdicional que imputa a uma das partes uma demora abusiva.

    8. No douto acórdão n.º 299/2006, lê-se ainda:

      ‘...pagamento esse que, in casu, actuava como conditio, nos termos do nº8 do artº 84° da Lei nº 28/82, da prolação de decisão quanto à reclamação que foi deduzida do Acórdão nº377/2005, a suscitação de tal pretensão teria de ser perspectivada, como foi, como um incidente sem cabimento.

      E, justamente por isso, o indeferimento do solicitado neste particular (solicitação levada a efeito em autos de traslado extraídos de um processo de reclamação a...

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