Acórdão nº 633/06 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Novembro de 2006
Magistrado Responsável | Cons. Fernanda Palma |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2006 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 633/2006
Processo nº 579/98
Plenário
Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam em Plenário no Tribunal Constitucional
I
O pedido
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O objecto do pedido
O Provedor de Justiça requer, ao abrigo do artigo 281º, nº 2, alínea a), da Constituição, a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma constante do artigo 27º do Decreto-Lei nº 268/92, de 28 de Novembro, que estabelece o regime de exploração das apostas mútuas hípicas.
A norma em causa tem o seguinte teor:
A publicidade das apostas mútuas hípicas beneficia do regime de excepção previsto no nº 2 do artigo 21º do Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro.
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Fundamentos do pedido
Fundamentando o seu pedido, o Provedor de Justiça alegou, designadamente, o seguinte:
O Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro, aprovou o Código da Publicidade, consagrando o regime da actividade publicitária.
O referido diploma enuncia as restrições ao objecto da publicidade, entre as quais se conta a restrição à publicidade de jogos de fortuna e azar, com excepção dos jogos promovidos pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
O Decreto-Lei nº 268/92, de 28 de Novembro, estabelece o regime jurídico das apostas mútuas hípicas, sendo, por força do artigo 27º, concedido à publicidade destas regime de excepção idêntico ao dos jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, afastando-se, deste modo, a aplicação do regime geral restritivo da publicidade de jogos de fortuna ou azar.
Subsistem, assim, em paralelo, dois regimes diferenciados de publicidade de jogos de fortuna e azar: o regime geral, restritivo, que impõe que tais jogos não possam surgir como objecto essencial da mensagem publicitária, e o posterior regime, específico das apostas mútuas hípicas, que isenta a publicitação daquele jogo de fortuna e azar das restrições quanto ao objecto publicitado.
A Constituição associa, no artigo 60º, nºs 1 e 2, os direitos do consumidor à actividade publicitária, facto que pode justificar, por parte do legislador, restrições ao objecto publicitado, tais como a restrição ou proibição à publicidade de bebidas alcoólicas, tabaco, medicamentos e jogos de fortuna e azar.
Aliás, o preâmbulo do Código da Publicidade sublinha a importância dessa actividade como motor do mercado, mas não sem prever a definição de regras mínimas, cuja inexistência permitiria, na prática, desvirtuar o próprio e intrínseco mérito da actividade publicitária, o que, numa perspectiva de direito do consumidor, se deverá entender como a necessidade de acautelar um eventual papel negativo da publicidade, através da informação que veicula, na formação da vontade do consumidor.
No caso do regime de restrições ao objecto de publicidade dos jogos de fortuna e azar, consagrado pelo artigo 21º do Código da Publicidade, o intuito do legislador foi limitar o estímulo à sua prática gerado pela divulgação publicitária, considerando os danos económicos e sociais decorrentes da prática compulsiva e reiterada dos jogos de fortuna e azar, e cercear as tentativas irreflectidas de ganhos rápidos através de apostas consideráveis em tais jogos.
As apostas mútuas hípicas constituem um jogo de fortuna e azar, conforme resulta do regime do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 10/95, de 19 de Janeiro, e o seu regime é semelhante ao regime geral dos jogos de fortuna e azar, nomeadamente quanto à concessão de exploração, inspecção e fiscalização do Estado e às obrigações de investimento.
O preâmbulo do Decreto-Lei nº 268/92 enuncia as razões que presidiram à criação do regime de exploração das apostas mútuas hípicas, designadamente, os efeitos benéficos para a economia em geral que resultam das corridas de cavalos em termos de fomento de exportações, de emprego e de melhoria de oferta turística, considerando ser a sua organização economicamente inviável sem o apoio financeiro proporcionado pela exploração da aposta mútua.
Assim, o objectivo da norma do artigo 27º do Decreto-Lei nº 268/92 parece ser o de fomentar uma ampla divulgação das apostas mútuas hípicas através da publicidade, com o objectivo de incentivar o consumidor a apostar nas corridas hípicas, de forma a aumentar as receitas do jogo, que reverterão, em parte, a favor da realização dos objectivos mencionados.
Porém, as razões económicas, de incremento do emprego e do turismo, não podem constituir fundamento material bastante para a diferenciação legal entre o regime publicitário das apostas mútuas hípicas e o dos restantes jogos de fortuna e azar, porquanto tais vantagens decorrem igualmente da exploração destes últimos, nomeadamente dos jogos praticados em casinos, nos termos do artigo 3º, nº 1, do Decreto-Lei nº 422/89.
Tão-pouco o fomento da criação de cavalos, a promoção do desporto equestre e de outras finalidades de interesse social poderão configurar tal justificação, uma vez que todas as entidades que exploram jogos de fortuna e azar estão vinculadas ao cumprimento de obrigações de diversa natureza, como contrapartida da atribuição do direito de exploração do jogo, o que sempre se traduz em benefícios para a comunidade.
Assim sendo, não se vislumbram razões materiais que possam, de forma objectiva e razoável, sustentar um tratamento legal da publicidade das apostas mútuas hípicas diverso e mais favorável do que aquele que é concedido aos restantes jogos de fortuna e azar, já que também não procedem aqui as razões de interesse público que justificam o regime mais benévolo concedido aos jogos promovidos pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Conclui o Provedor de Justiça no sentido de a norma constante do artigo 27º do Decreto-Lei nº 268/92 ser inconstitucional, por desconformidade com o disposto no artigo 13º, nº 1, da Constituição.
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A resposta do órgão autor da norma
Notificado do pedido, veio o Primeiro-Ministro responder, alegando, em suma, o seguinte:
As restrições legais ao objecto da publicidade não são impostas pela Constituição (que directamente apenas proíbe a publicidade oculta, indirecta ou dolosa), mas sim por ela justificadas em defesa de direitos constitucionalmente relevantes como são os direitos do consumidor, havendo aqui uma margem de liberdade para o legislador ordinário.
O legislador ordinário utilizou essa margem de liberdade na proibição de jogos de fortuna ou azar, afastando assim a regra geral que é a da possibilidade de publicidade, mas voltou a essa regra geral em dois casos: os jogos promovidos pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e as apostas mútuas hípicas.
A questão situa-se, pois, no plano dos limites da liberdade do legislador ordinário na regulamentação da publicidade, não por efeito de qualquer...
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Acórdão nº 421/08-1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Junho de 2008
...de Fundamentação Ética e Histórico-Jurídica", Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, 1982, págs. 30-31 e 36) citado pelo acórdão do TC nº 633/06. [3] - Acórdão da Relação do Porto de 25-09-2002, no proc. 0210716, relator Clemente [4] - No que secundamos, com ligeira diferença terminológica, ......
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