Acórdão nº 456/06 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução18 de Julho de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 456/2006

Processo n.º 531/06

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do art. 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que decidiu não conhecer do recurso de constitucionalidade, interposto de acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.

2 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:

“1 – A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), pretendendo ver fiscalizada a constitucionalidade das seguintes normas:

«(…)

  1. artigo 127.º do Código de Processo Penal (se interpretado no sentido e com a dimensão normativa de que é possível permitir a valoração em julgamento de um reconhecimento de arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo artigo 147.º do CPP”);

    (…)

  2. Interpretação inconstitucional, feita pela instância (6.ª Vara Criminal), quer do artigo 127.º do CPP quer dos artigos 147.º e 335.º do CPP, ao indagar, na audiência as testemunhas como terão decorrido “anteriores reconhecimentos”, efectuados noutros locais e aos quais o Tribunal não assistiu. E sua valoração (dos referidos preceitos) inconstitucional.

    (…)

  3. Inconstitucionalidade material do artigo 355.º do CPP, por violação dos artigos 32.º, n.º 1 e 5, da Lei Fundamental, quando interpretado no sentido e com a dimensão normativa de que, para o efeito do disposto no art. 127.º do CPP, o acórdão condenatório pode proceder a valoração positiva de depoimento de testemunha que na audiência de julgamento não consegue reconhecer o arguido – e somente no segmento do depoimento em que a testemunha afirma que anteriormente teria reconhecido o arguido – fazendo retroverter a fase anterior à do julgamento a culpabilidade do arguido e retirando ao reconhecimento efectuado no julgamento todo o seu efeito útil, esvaziando-o inteiramente de sentido.

    (…)

  4. As normas dos artigos 412.º, n.º 3 e 4 do CPP mostram-se feridas de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Lei Fundamental, se interpretadas no sentido e com a dimensão normativa de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugna a decisão sobre matéria de facto, das menções contidas na alínea a) e, pela forma prevista no n.º 4, nas alíneas b) e c) daquele n.º 3, teria como efeito o não conhecimento da matéria de facto e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência – o que ocorreu, manifestamente no caso dos autos

    (…)

  5. O acórdão recorrido, ao considerar um reconhecimento feito em audiência como simples prova testemunhal, faz indevida ou inconstitucional valoração do artigo 127.º do CPP, interpretando-a no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido, realizado sem a observância de nenhuma das regras do artigo 147.º do CPP (…)».

    2 – Compulsados os autos, cumpre anotar com interesse para o caso decidendo:

    2.1 – O recorrente foi condenado pelo Tribunal Colectivo da 6.ª Vara Criminal de Lisboa, pela prática de 6 crimes de roubo, na pena única de 13 anos de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional, com interdição de entrada pelo período de 10 anos

    2.2 – Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 15 de Dezembro de 2005, negou provimento ao recurso, confirmando na íntegra a decisão recorrida.

    2.3 – Discordando desse entendimento, o arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, no qual sintetizou a sua argumentação dizendo:

    (…)

    1º O douto acórdão recorrido, proferido pelo TRL está afecto de nulidade. Na verdade, na sua fundamentação não conhece de todo o conteúdo do recurso interlocutório em tempo apresentado pelo recorrente (recurso interlocutório de fia. 3690). Não conhecendo, nomeadamente, de todas as quatro conclusões insertas na motivação desse mesmo recurso e – ora transcritas a fls. 3 e 4 da presente motivação. Não conhecendo, sequer minimamente, das aí arguidas inconstitucionalidades materiais no tocante à interpretação feita pela instância dos comandos dos arts. 127º e 147º do CPP.

    2º É por isso nulo o douto acórdão recorrido, nulidade que lhe advém do melhor disposto no art. 379º nº1 alínea c) do Código do Processo Penal.

    3º Nulidade esta que se requer seja declarado por este Alto Tribunal, com todas as consequências processuais a que alude o art. 122º do CPP.

    4º O douto e recorrido acórdão enferma da nulidade de excesso de pronúncia, por não haver conhecido (rejeitando por tal facto parcialmente) do recurso elaborado pelo recorrente, com o argumento de o recorrente não ter dado cumprimento ao disposto no art. 412º nº4 do CPP.

    5º Sendo a renovação de prova uma opção da própria defesa, não está o recorrente vinculado (nem obrigado) a requerer a renovação de prova, se entender que no caso concreto não será ela de requerer.

    6º Resulta “in casu” e a esse propósito, que não foi, como do recurso decorre, a prova produzida em audiência que se mostra inquinada, antes o foi a decisão da instância que não valorou corno devia essa mesma prova.

    7º Assim, o recorrido acórdão, ao ordenar, como de facto ordenou, “a rejeição parcial do recurso” – o que consta de fls. 58 – parágrafo 3º do aresto ora em crise, cometeu a nulidade de excesso de pronúncia, conhecendo para além do que devia, nulidade essa cominada na alínea c) do nº1 do art. 379º do CPP.

    8º Ao não tomar conhecimento de questões desenvolvidas pelo recorrente nas conclusões nº 1 e 2 da motivação – as quais remetem para fls.2, 3, 4, 5, 6 e 7 desse mesmo recurso – limitando-se a afirmar que: “Inexistem tais questões, nada mais cumprindo acrescentar”, como consta de fls. 58 do recorrido acórdão, foi no mesmo cometida a nulidade de omissão de pronúncia prevista na já mencionada alínea c) do nº 1 do art. 379º do CPP, a qual deve ser declarada com os efeitos constantes do art. 122º do CPP.

    9º As normas dos arts. 412º nº 3 e 4 do CPP mostram-se feridas de inconstitucionalidade material, por violação do art. 32º nº 1 da Lei Fundamental, se interpretadas no sentido e com a dimensão de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugna a decisão sobre matéria de facto, das menções contidas na alínea a) e, pela forma prevista no nº 4, nas alíneas b) e c) daquele nº 3, tem como efeito o não conhecimento da matéria de facto e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência.

    10º Na verdade, como resulta do recorrido acórdão, o TRL nem sequer convidou o recorrente a completar a sua motivação nos apontados elementos, cuja falta ora se censura no impugnado acórdão.

    11º O acórdão recorrido ao considerar um reconhecimento feito em audiência, como simples prova testemunhal, faz indevida ou inconstitucional valoração do art. 127º do CPP, interpretando-a no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido, realizado sem a observância de nenhuma das regras do art. 147º do CPP.

    12º Pelo que tal preceito – o a 147º do CPP – se interpretado no sentido em que o interpretou o douto acórdão recorrido, encontra-se ferido de inconstitucionalidade material, por violação, entre outros, do art. 32º nº 1 da Constituição da República.

    13º Assim já tendo decidido o Tribunal Constitucional em seu aresto proferido em 28 de Março de 2001 (Acórdão 137/200 1).

    14º A medida acessória de expulsão mantida no acórdão recorrido é ilegal e viola a letra e o espírito do art. 101º nº 2 e nº 4 alínea b) do DL 244/98 de 8 de Agosto (actualizado), preceitos estes violados no douto acórdão recorrido. De resto, afim de fundamentar melhor a decisão de expulsão do arguido, o recorrido acórdão acrescentou o nº 2 do referido art. 101º do citado DL (quando o acórdão da instância a ele se não referia, ver folhas 49 “in fine” o que logo se vê pelo simples cotejo de uma e outra das impugnadas decisões).

    15º Ao invés de manter a duvidosa expulsão, uma vez que não foi investigada, nem mesmo “ex officio” os requisitos do citado art. 2º do art. 101º do DL 244/98 de 8 de Agosto quanto à vida pessoal e familiar do recorrente), deveria o douto acórdão recorrido ter lançado mão do disposto no a 340º do CPP e, por aplicação subsidiária do art. 4º do CPP, da faculdade concedida pelos arts. 729º nº 3 e 730º nº 1 do CPC.

    (…)

    .

    2.4 – Por acórdão de 27 de Abril de 2006, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu revogar a pena acessória de expulsão do território nacional, confirmando, no mais, a decisão recorrida.

    Tal juízo louvou-se na consideração dos seguintes fundamentos:

    «(…)

    2.2.

    Nulidade do acórdão recorrido

    Nas conclusões 1ª a 4ª e 19ª da sua motivação, sustenta o arguido A., a nulidade do acórdão recorrido, que se desenvolve em três momentos.

    Não teria conhecido de todo o conteúdo do recurso interlocutório de (fls. 3690) apresentado pelo recorrente, nomeadamente, de todas as 4 conclusões, não conhecendo, sequer minimamente, das aí arguidas inconstitucionalidades materiais da interpretação feita pela instância dos arts. 127º e 147º do CPP (conclusões 1ª a 3ª).

    Enfermaria ainda de excesso de pronúncia, por não haver conhecido (rejeitando por tal facto parcialmente) do recurso elaborado pelo recorrente, com o argumento de o recorrente não ter dado cumprimento ao disposto no art. 412º nº 4 do CPP (conclusão 4ª)

    E de omissão de pronúncia, por não se ter pronunciado sobre a constitucionalidade do art. 101º nºs 2 e 4 do DL 244/98 de 8 de Agosto (actualizado), se interpretado no sentido de que pode...

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