Acórdão nº 448/06 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Mário Torres
Data da Resolução12 de Julho de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 448/2006

Processo n.º 600/06 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Mário Torres

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

1. A. e outros vêm reclamar para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 76.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o despacho de 21 de Abril de 2006 do Juiz do 2.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, que, com fundamento em falta de esgotamento dos recursos ordinários, não admitiu recurso por eles interposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, contra despacho que indeferiu arguição de nulidade de despacho que ordenara a repetição de todos os actos de julgamento.

Segundo o despacho ora reclamado, o preceituado no n.º 2 do artigo 654.º do Código de Processo Civil (CPC) – do seguinte teor: “Se durante a discussão e julgamento falecer ou se impossibilitar permanentemente algum dos juízes, repetir-se-ão os actos já praticados; sendo temporária a impossibilidade, interromper-se-á a audiência pelo tempo indispensável, a não ser que as circunstâncias aconselhem, de preferência, a repetição dos actos já praticados, o que será decidido sem recurso, mas em despacho fundamentado, pelo juiz que deva presidir à continuação da audiência ou à nova audiência” – apenas declara irrecorrível o despacho que ordena a repetição de actos do julgamento, mas já não o despacho que decida arguição de nulidade desse despacho, sendo este segundo despacho recorrível nos termos gerais (artigos 678.º e 679.º do CPC). Assim, é inadmissível recurso directo para o Tribunal Constitucional do despacho de indeferimento de arguição de nulidade, por dele caber recurso ordinário, cujo prazo de interposição ainda não havia decorrido.

A reclamação apresentada tem o seguinte teor:

“I – ANTECEDENTES DO DESPACHO DE NÃO ADMISSÃO DO RECURSO.

1. Os presentes autos constituem uma acção cujo objecto nuclear é a impugnação de despedimento colectivo dos ex-trabalhadores da B.. e pedido de integração na sua casa mãe, a C., SA, com base na transferência de estabelecimento.

2. A acção é um processo urgente – nos termos dos dispositivos legais processuais aplicáveis do Código de Processo do Trabalho – embora não pareça, decorridos que são 13 anos e 2 meses desde a sua distribuição no Tribunal de Trabalho, iniciada em 1993.

3. Na acção, iniciou-se a audiência de julgamento em 21 de Junho de 1999, tendo sido ouvidos, em variadíssimas sessões:

(i) Depoimento de parte da C.;

(ii) Depoimento de parte dos legais representantes da Comissão Liquidatária da B.;

(iii) 27 testemunhas – algumas comuns aos diversos autores na acção.

4. As diversas sessões de julgamento em que foi produzida esta prova, foram integralmente gravadas, encontrando-se as respectivas cassetes juntas aos autos.

5. Ao longo destes anos todos em que o processo urgente tem decorrido, passaram pelo Juízo do Tribunal de Trabalho diversos Juízes.

6. Por despacho de fls. 3374 verso – produzido em 13 de Fevereiro de 2006 –, a Senhora Juiz actualmente titular do 2.º Juízo, 1.ª Secção, do Tribunal por onde correm os autos, [decidiu], com invocação expressa do artigo 654.º, n.ºs 2 e 3, do CPC, aplicável em processo de trabalho subsidiariamente, que as sessões de audiência de julgamento em que foi ouvida toda a prova acima apontada são anuladas e que todos os actos de julgamento já realizados devem ser repetidos.

7. Este despacho foi notificado às partes em 15 de Fevereiro de 2006 – data do registo postal – portanto, considerando-se estas notificadas no dia 20 de Fevereiro de 2006 – pois o terceiro dia após o do registo foi a um sábado.

8. Nesse despacho, a Senhora Juiz invoca, basicamente – e não obstante a circunstância de que o julgamento está integralmente gravado – como razões para tal decisão o tempo decorrido, o facto de a Senhora Juiz que iniciou o julgamento já não se lembrar de prova tão longínqua e de a mesma ter sido transferida.

9. Deste despacho, os ora reclamantes arguíram a nulidade da repetição do julgamento, com os fundamentos que constam do requerimento de fls. 3828.

10. Com efeito, o artigo 654.º, n.º 2, determina expressamente que do despacho que decida a repetição dos actos já praticados em julgamento, não cabe recurso.

11. Tal circunstância não obsta, no entanto, a que as partes façam valer os seus direitos e posição processual pela via de arguição de nulidade, se acaso – como acontece – tal decisão puder configurar uma nulidade processual.

12. No essencial, as razões porque os ora reclamantes entendem ter havido aí uma nulidade processual tem a ver com o sentido e alcance do artigo 654.º do CPC e da aplicação que do mesmo foi feita, em que sobressai o seguinte:

(i) A fattispecie da norma que admite a repetição do julgamento não comporta situações em que a prova produzida tenha a extensão que mostra a dos presentes autos – depoimentos de parte e 27 testemunhas inquiridas;

(ii) A prova encontra-se toda gravada;

(iii) O preceito impõe que uma decisão de repetição de todos os actos de julgamento assente numa ponderação em que o bom senso jurídico e interesses processuais das partes devam ser garantidos e salvaguardados no quadro dos princípios que regem a lei de processo, maxime o direito à prova, o direito à justiça e à celeridade processual, em obediência à tutela jurisdicional efectiva – tudo, direitos com actual consagração constitucional e vertidos na lei de processo – artigos 20.º da CRP e 2.º do CPC.

(iv) Daí que, de acordo com a jurisprudência e a doutrina que ao assunto já dedicaram algumas palavras sábias, apenas se tem admitido a repetição de actos de julgamento que, pela sua pequena importância, v. g. ter sido ouvida apenas uma ou duas testemunhas, não justifiquem a chamada do Juiz que iniciou o julgamento, para assegurar o princípio da plenitude da assistência dos juízes.

13. A juntar a estes argumentos de índole jurídico-processual, um outro sobreleva e que torna incompreensível a enormidade jurídica...

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