Acórdão nº 307/06 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução10 de Maio de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 307/06

Processo n.º 382/06

  1. Secção

Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

  1. A. reclama para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 76º da Lei 28/82 de 25 de Novembro (LTC), pedindo a revogação do despacho que, no Supremo Tribunal de Justiça, lhe não admitiu o recurso que pretendia interpor, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da citada Lei. Diz:

  2. O ora reclamante havia apresentado a petição de recurso para o Tribunal Constitucional, indicando as seguintes normas cujas inconstitucionalidades pretendia ver sindicada:

    arts. 399°, 400º 1 e) e f), 420° 1 e 4 e 185,1, todos do CPP.

  3. O Meritíssimo Senhor Conselheiro Relator apreciou, em primeiro lugar, este último artigo, o qual, manifestamente, extravasava do contexto processual em que foi indicado, por mero lapso, já que o que se tinha pretendido era invocar o art. 188°. Tem pois toda a razão, quando afirma que nenhuma das decisões aplicou norma sobre “Apreensão de coisas perecíveis, perigosa ou deterioráveis". Assim, resta ao ora reclamante, nesta parte, conformar-se com a decisão, e confessar o seu erro, que facilmente pode ser convolado de lapsus linguae em lapsus calami.

  4. Passou depois o mesmo Ilustre Magistrado à análise do art. 400° 1 e) e f), onde, salvo o sempre e muito devido respeito, agita o argumento do terror do 3° grau (de jurisdição), defendendo a sonegação ao conhecimento do Tribunal Constitucional da questão que se pretendia que fosse por este Alto Tribunal apreciada, por isso que "...à pergunta sobre se essa norma seria inconstitucional tem sido - e continua (...) a ser - negativa... ", citando a este propósito um aresto de que foi relator o Excelentíssimo Senhor Conselheiro Mário Torres.

    Contudo, este entendimento, vocacionado para, no limite, fundamentar a extinção do Tribunal Constitucional, já que em todos os processos de apreciação da constitucionalidade de interpretação e aplicação de normas se poderá agitar a terrífica bandeira do 3° grau (de jurisdição), não é sustentável em face do alegado e a alegar pelo ora reclamante, como se crê que irá ser reconhecido pela serena e isenta lucidez deste Alto Tribunal.

  5. No concernente aos meios "ínvios" a que mais uma vez, com uma insistência que não pode deixar de ser menorizante da mandatária do ora reclamante, o que muito se lamenta, até porque segundo um velho brocardo da praxe forense "nos Tribunais a delicadeza nunca é demais", a apreciação feita sobre a indicação do art. 420° 1 e 4, omite o entendimento que muito claramente defendida na Jurisprudência mais recente.

    Acresce que é ininteligível o "distinguo" aludido sobre o poder de selecção de causas por parte dos Tribunais superiores e o mero regime simplificado de decisão. Conceitualmente, valorando referências subjectivas, concebe-se. Na prática, é puramente temerário e aleatório.

    O que pode transparecer deste argumento é, no fundo, uma aparência de quase paternal protecção do STJ sobre o TC, que não quadra bem nem com os direitos do arguido, nem com a dignidade deste Alto Tribunal.

    O ora reclamante confessa que tem dificuldade em perceber que a declaração de manifesta improcedência do recurso, por razões de mérito, possa ser emitida, sem lhe ser dada a possibilidade de argumentar em sentido contrário. E que tal declaração é sempre uma decisão infundamentada e uma petição de princípio. É um precedente perigoso, até porque, quanto mais não seja, pode facilmente confundir-se com o retorno ao princípio da oportunidade que, crê-se que há muito tempo, cedeu perante o princípio da legalidade.

  6. Sobre a indicação do art. 399º, tanto quanto se julga ter entendido, o aliás douto despacho reclamado é pura e simplesmente omisso.

  7. Acresce que está comprovado nos presentes autos que ora reclamante suscitou durante o processo inconstitucionalidades, nos momentos aliás indicados no seu requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional.

  8. Quanto as restantes inconstitucionalidades invocadas pelo ora reclamante e identificadas no requerimento de arguição de nulidades, apenas foram invocadas nessa fase porque se prendem com decisão também só proferida nesse momento, pelo que o ora reclamante não podia invocá-las antes de ter sido proferida aquela decisão.

  9. Assim sendo o ora reclamante requer que Vossa Excelência se digne ordenar que o recurso interposto para este Alto Tribunal Constitucional seja admitido e apreciado.

    Sobre o mérito esta reclamação diz o representante do Ministério Público neste Tribunal:

    A presente reclamação carece obviamente de fundamento sério.

    Cumpre notar, desde logo, que o recorrente não cumpre minimamente o ónus de delimitar, em termos inteligíveis, qual a específica interpretação ou dimensão normativa dos preceitos legais “arrolados” como “inconstitucionais”, e que pretende controverter: não o faz manifestamente no requerimento de interposição de recurso e continua a não o fazer no âmbito da presente reclamação, desaproveitando, deste modo, a oportunidade de explicitar qual é, afinal, o objecto normativo do recurso que pretende interpor (bem sabendo que, na tramitação do processo de reclamação não cabe a prolação de “convite” para aperfeiçoar o dito requerimento). Tal estratégia processual priva, em rigor, o recurso de um verdadeiro objecto normativo, impedindo o Tribunal Constitucional de conhecer quais as questões sobre que deveria fazer incidir os seus poderes cognitivos.

    Acresce que se não mostra suscitada, durante o processo e em termos processualmente adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa (cfr. as conclusões do recurso para o STJ, transcritas a p. 17 dos autos), sendo manifesto que a interpretação redigida pelo STJ, do disposto nos art. 400º, n.º 1, alínea e) e f) e 420º (incluindo o n.º 4) do CPP não pode seguramente qualificar-se como constituindo “decisão surpresa”, que, pelo seu carácter “insólito” e “imprevisível”, dispensasse o recorrente do ónus de suscitação que sobre si recaía.

  10. Para uma melhor enunciação da questão que nos ocupa, é útil recordar que o reclamante reclamara do acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:

    A., recorrente nos autos em epígrafe, tendo sido notificado do alias douto acórdão que indeferiu a aclaração por si requerida, vem muito respeitosamente arguir nulidades e em consequência requerer a anulação do aliás douto acórdão final global, com base nos seguintes termos e fundamentos:

  11. Subjaz a tal aresto uma interpretação restritiva dos direitos do arguido, no que tange aos art. 400° n.º1 al. e) e 399° do Código de Processo Penal que se traduz na aplicação e interpretação inconstitucional destes preceitos legais, por manifesta colisão com o disposto no art. 32° n.º 1 da CRP e em consequência na violação do princípio constitucional das garantias de defesa.

  12. Acresce que, por muito douta que seja a decisão de rejeição de qualquer recurso, por manifesta improcedência, sem que seja concedido ao arguido o direito de demonstrar a tese contrária, cingindo aos limites iniciais do recurso, constitui também uma intolerável...

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