Acórdão nº 283/06 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Maio de 2006

Data03 Maio 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 283/2006

Processo n.º 158/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de Setembro de 2004, foi negado provimento ao recurso de revista interposto por A. do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14 de Janeiro de 2003, que, negando provimento à apelação do demandante, confirmara a decisão do 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, que por sua vez havia julgado improcedente a acção com processo especial para inquérito, prevista no artigo 76.º do Código das Sociedades Comerciais (intentada por aquele contra B., S.A.), com fundamento na procedência da excepção peremptória do decurso do prazo para pedir inquérito judicial, invocada pela demandada na sua contestação.

    Pode ler-se no referido aresto do Supremo Tribunal de Justiça:

    (...)

    II – Fundamentação

    A) de facto:

    A matéria de facto a tomar em consideração é a admitida pelo acórdão recorrido de fls. 190 a 195, e que agora se explicita:

    1) O requerente é sócio da requerida, tendo 4950 acções ao portador, no valor de 1000$00, cada;

    2) A requerida disse-se, em 91/12/31, detentora de 60% do capital da C., L.dª, de 91,25% do capital da D. S.A., de 98,76% do capital da E. S.A., de 55,74% do capital de F., L.dª, de 57,14% do capital da G., L.dª, de 90% da H. SRL, de 50% do capital da I. LTEE, e, de 47% do capital da J. LTEE;

    3) A requerida não apresentou demonstrações financeiras consolidadas e o relatório consolidado de gestão, relativos a 1991;

    4) A requerida apresentou contas do exercício de 1991, que foram aprovadas, por unanimidade, na Assembleia Geral de 92/03/27, onde foi referida, pelos administradores, a não apresentação do referido em 3), o qual seria apresentado, com a maior brevidade possível;

    5) O requerente reclamou da não apresentação do referido em 3), por cartas enviadas à requerida, em 25/03, 06/08, 28/08 e 92/10/19;

    6) A requerida enviou respostas ao requerente em 30/03 e 92/04/17, aceitando a falta do referido em 3);

    7) O requerente distribuiu a presente acção, a pedir, por virtude do referido em 3), o inquérito judicial, previsto no art.º 67.º, n.º 1, do CSC, em 99/07/02;

    8) Citada, devidamente, a requerida veio excepcionar a prescrição, e, impugnar.

    B) de direito:

    1. Como se sabe, o âmbito objectivo dos recursos é definido pelas conclusões dos recorrentes (artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, do C. P. Civil), importando, assim, delimitar, quais as questões colocadas nas conclusões da revista do recorrente A..

    Em face delas, urge apreciar as seguintes questões:

    a) Se o acórdão recorrido é nulo, por falta de fundamentação de facto (artigo 668.º, n.º 1, al. b), do C. P. Civil) ou ainda, por omissão de pronúncia ou excesso de pronúncia (artigo 668.º, n.º 1, al. d), 1.ª e 2.ª partes, do C. P. Civil);

    b) Se, face aos factos assentes, o acórdão recorrido é de manter.

    2. Vejamos, pois, começando por apreciar e decidir a questão referida em a):

    O acórdão recorrido apreciou e decidiu a excepção de prescrição, invocada pela requerida na contestação, e, para decidir como decidiu, fundamentou-se nos factos que discriminou no próprio acórdão e que acima se enumeraram em II-A, sob os n.ºs 1 a 8.

    Essa matéria factual foi considerada suficiente para a decisão de mérito sobre tal excepção peremptória, e, assim sendo, como é, não ocorre a nulidade do acórdão, prevista no artigo 668.º, n.º 1, al. b), do C. P. Civil, por remissão do artigo 716.º, n.º 1, do mesmo diploma.

    Com efeito, é jurisprudência assente que só a falta absoluta da motivação, e não a sua insuficiência ou mediocridade ou mesmo laconismo, tem a virtualidade de desencadear a sanção grave da nulidade, prevista no artigo 668.º, n.º 1, al. b), do C. P. Civil (cfr. Ac. S.T.J. de 03/07/73, B.M.J., 229, pág. 155, e Prof. A. Reis, C. P. Civil anotado, Vol. V, pág. 140).

    Os factos elencados são os necessários e suficientes para a decisão, ou, pelo menos, foram como tal considerados, e, assim sendo, não ocorre a invocada nulidade.

    3. Alega ainda o recorrente que o acórdão recorrido é nulo, por ter deixado de se pronunciar sobre questões devidas e se ter pronunciado sobre questões indevidas.

    É claro que o tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e ocupar-se ainda das questões de conhecimento oficioso, mas exceptuam-se sempre aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (artigo 660.º, n.º 2, do C. P. Civil, por remissão do artigo 713.º, n.º 2, do mesmo diploma).

    Ora, o acórdão recorrido apreciou e decidiu todas as questões colocadas pelo apelante, que tinham relevância para a decisão de mérito sobre a excepção peremptória da prescrição invocada pela requerida na contestação, sendo que as outras ficaram prejudicadas e não tinham de ser conhecidas.

    Na verdade, tendo a sentença recorrida da 1.ª instância julgado procedente a excepção peremptória da prescrição e tendo o acórdão recorrido concluído que tal sentença era de manter, face aos factos assentes e ao direito aplicável, todas as outras questões invocadas pelo recorrente estavam prejudicadas no seu conhecimento.

    4. Nas suas conclusões 5.ª e 6.ª vem agora e só agora perante este Supremo Tribunal invocar o recorrente a nulidade da falta de citação dos administradores da B., para efeito do disposto no artigo 67.º, n.º 2, do C.S.C., a qual está prevista no artigo 194.º, al. a), do C. P. Civil e é de conhecimento oficioso ex vi do artigo 202.º do mesmo diploma, sendo que a sentença e o acórdão não podiam ser proferidos sem tal audição.

    O recorrente propôs a acção com processo especial ao abrigo do artigo 67.º do C.S.C. contra a B., S.A. e requereu expressamente que a requerida fosse notificada para que os seus administradores se pronunciassem nos termos e para o efeito do disposto no n.º 2 do mencionado diploma.

    Porém, no Tribunal da 1.ª Instância ordenou-se que a citação da requerida fosse feita nos termos do artigo 1479.º do C. P. Civil, o que foi feito, tendo a requerida apresentado a sua contestação, invocando a excepção peremptória da prescrição e impugnando o inquérito judicial requerido.

    Não tendo o requerente pedido a citação dos administradores da B., mas apenas a notificação da requerida, não ocorre qualquer falta da citação daquelas, mas, a nosso ver, erro na forma de processo, uma vez que desde o início se deveria ter seguido a tramitação prevista no artigo 67.º, n.º 2, do C.S.C. e não a prevista no artigo 1479.º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil, por determinação expressa do n.º 3 deste mesmo preceito.

    Ora, de tal erro na forma do processo não resultou diminuição de garantias para os administradores da requerida, uma vez que esta contestou a acção, o que aproveita aos mesmos.

    De qualquer modo, de tal nulidade teria de conhecer-se até ao despacho saneador, como resulta do disposto nos artigos 202.º e 206.º, n.º 2, do C. P. Civil, o que não foi feito, e, assim sendo, tem de se considerar sanada.

    Acresce que se o recorrente quisesse aproveitar-se dessa nulidade deveria não lhe ter dado causa, como deu, sendo que, como resulta dos autos, ao ser notificado da contestação, ficou ciente dessa mesma contestação e da não audição dos administradores da requerida.

    Em face do exposto, no que se refere a esta questão, também o recorrente carece de razão.

    5. Apreciemos agora a questão, supra discriminada em b):

    Tal questão foi apreciada e decidida no acórdão de fls. 192 a 195, ora em recurso, pelo que, mostrando-se o mesmo a tal respeito bem fundamentado e subscrevendo nós tal decisão e fundamentação, para ali remetemos, conforme permite e aconselha o preceituado nos artigos 726.º e 713.º, n.º 5, do C. P. Civil, reiterando não ocorrer no dito acórdão a violação de qualquer dos preceitos constitucionais invocados nas conclusões 9.ª e 10.ª do recurso.

    (...)

    AUTONUM 2.Notificado deste acórdão, o recorrente veio arguir a sua nulidade, nos seguintes termos:

    1. A arguida nulidade é cominada por normas constantes do art.º 668.°, n.º 1, em articulação com as constantes dos art.ºs 660.°, n.º 2, 201.°, n.ºs 1 e 2, e 158.°, n.º 1, do CPC, interpretados em conformidade com normas e princípios da Constituição da República (CRP, doravante).

    A fundamentação das decisões judiciais mediante normas inconstitucionais, consubstancia nulidade da al. b) do n.º 1 do art.º 668.° do CPC.

    Por isso se impõe, antes de mais, identificar as normas e princípios constitucionais afectados pelas normas efectivamente aplicadas no sobredito acórdão, geradores da nulidade arguida.

    1.1. Normas constitucionais violadas pelas normas aplicadas no supra referido acórdão

    1.1.1. Consigna-se no art.º 202.°, n.º 2, da CRP, que, na administração da justiça, incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, e reprimir a violação da legalidade democrática.

    A incumbência constitucional de reprimir a violação da legalidade democrática impõe que os tribunais, eles próprios, cumpram a garantia constitucional da legalidade processual.

    1.1.2. Consigna-se no art.º 203.° da CRP que os tribunais apenas estão sujeitos à lei. Esta vinculação dos tribunais à lei encontra-se concretizada no art.º 4.° da Lei n.º 3/99, de 13.1 (Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), e no art.º 4.° da Lei n.º 21/85, de 30.7 (Estatuto dos Magistrados Judiciais), segundo os quais os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei.

    No sentido de que o princípio da legalidade processual tem assento constitucional, já se pronunciou o Tribunal Constitucional, designadamente no seu Acórdão n.º 934/96, DR II S de 10.12.96. Com a devida vénia, dele se transcreve o trecho seguinte: Na medida em que resulta da Constituição que os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei, liga-se tal independência a valores de imparcialidade e objectividade que só as normas jurídicas...

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