Acórdão nº 280/06 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Fernanda Palma
Data da Resolução02 de Maio de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 280/2006

Processo n° 1009/2005

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram como recorrente A. e como recorrida o Banco B., SA, é submetido à apreciação do Tribunal Constitucional a norma do artigo 863° do Código Civil, interpretada no sentido de “sendo a mesma entidade jurídica a tutelar o contrato de trabalho e a reforma (...), o trabalhador ainda assim pode renunciar, na pendência da relação laboral, a créditos salariais no momento em que negoceia as condições da sua reforma”.

    Junto do Tribunal Constitucional o recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:

    I) O Recorrente entende que a interpretação do Supremo Tribunal de Justiça, proferida no Acórdão, ora recorrido, sobre a aplicação da figura da remissão abdicativa, no decurso da relação laboral do Recorrente, é inconstitucional. Com a celebração do acordo de cessação do contrato de trabalho, foi estipulado uma compensação pecuniária que, como se provou, se destinou apenas a compensar a perda de rendimentos advenientes da passagem à reforma.

    II) Ainda assim, o Tribunal entendeu que os créditos reclamados na presente acção judicial se encontravam remitidos pela quitação incluída no acordo. Contudo, há que ter em atenção que o Recorrente desconhecia a existência dos créditos ora reclamados, e que não pôde alterar qualquer cláusula do acordo, além de que se encontrava numa relação laboral profundamente degradada, e sabia que era a sua entidade patronal quem lhe iria fixar o valor da sua reforma.

    III) Assim, no caso dos autos, considera-se inconstitucional a aplicação do art.° 863° do Código Civil no decurso da relação laboral, porquanto o Recorrente assinou o referido “acordo” no decurso da sua relação laboral, ou seja, em 28 de Setembro de 2001, para produzir efeitos em 1 de Novembro de 2001 (factos assentes B)), violando, assim, o art. 59°, n° 1 a) da CRP.

    IV) Conforme Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 2 1/09/2004, supra transcrito.

    V) Por isso, o Recorrente entende que será sempre, inconstitucional, por violação dos art.°s 59º, nº 3, e nºs 1 e 4 do art.° 63° da Constituição, a interpretação que determina que sendo a mesma entidade jurídica a tutelar o contrato de trabalho e a reforma (discricionária quanto ao momento e montante), o trabalhador ainda assim pode renunciar, na pendência da relação laboral, a créditos salariais no momento em que negoceia as condições da sua reforma, sendo obviamente nulo e de nenhum efeito o acordo em contrário.

    VI) Ora, a questão fundamental aqui é saber se a cláusula de quitação contida no “Acordo” abrangia os créditos reclamados na presente acção.

    VII) Após alguma divergência entre o Tribunal de 1ª Instância e o Tribunal da Relação de Lisboa quanto à forma de cessação do contrato de trabalho do ora Recorrente – por caducidade ou por revogação – o Supremo Tribunal de Justiça veio dar razão ao Recorrente, no sentido de considerar que, através do “acordo”, o contrato de trabalho cessou por caducidade.

    VIII) Contudo, mantém a interpretação que o art.° 8° da LCCT é aplicável ao caso dos autos, integrando, assim, a figura da remissão abdicativa.

    IX) Ora, cumpre-nos desde já discordar desta interpretação.

    X) Na realidade, a invalidez reconhecida ao Recorrente resulta do ACTV!

    XI) A reforma dos bancários é a que resulta do ACTV!!!

    XII) As condições e o quantum da reforma é questão diversa!!!!

    XIII) E foi isto que foi objecto do “Acordo” de cessação do contrato.

    XIV) Por isso parece pacífico que o contrato de trabalho terminou por caducidade!!!

    XV) Aliás, como muito bem é referido no parecer do Prof. Doutor Pedro Romano Martinez, supra transcrito.

    XVI) Por outro lado, encontra-se provado o seguinte nos presentes autos:

    “SS) Numa reunião da Administração da ré com a Comissão de Quadros e Técnicos Reformados que teve lugar em Maio de 2002, o Presidente do Conselho de Administração da ré, Sr. Dr. C. referiu que os montantes constantes dos Acordos semelhantes ao especificado nas Alínea B) e C) foram para compensar a perda de rendimentos que adviria com a passagem à reforma antes dos 65 anos”.

    XVII) Ou seja, está provado que os valores atribuídos a título de compensação destinavam-se exclusivamente a compensar a perda de rendimentos adveniente da passagem à reforma antes dos 65 anos. Como se pode, então, afirmar, que nesse valor está também incluído o valor de recalculo da isenção de horário de trabalho?

    XVIII) Tanto mais que o Recorrente desconhecia a existência do referido crédito, pelo que é impossível dar quitação de algo que desconhece existir, quanto mais não seja, por motivos de boa fé.

    XIX) Ora, é mais que óbvio que a compensação não inclui o valor peticionado na presente acção, pelo que não pode ser, em caso algum, procedente a remissão abdicativa alegada pela Recorrida.

    XX) Como bem se pronunciou o Senhor Professor Doutor Monteiro Fernandes (página 8 do referido parecer).

    XXI) Pelo que, não é aceitável a construção elaborada no Acórdão, que considerou estarmos perante uma verdadeira remissão abdicativa.

    XXII) Caso contrário, o art. 8º n.° 4 da LCCT seria absolutamente inconstitucional, por violação do art. 59º, n.° 3 da Constituição.

    XXIII) Pois se o trabalhador não tem liberdade para reclamar créditos, porque continua ao serviço da entidade empregadora e estamos perante uma desigualdade entre as partes, onde está a tutela do salário, prevista no art° 59º, 3 da Constituição?

    XXIV) Por outro lado, no caso dos autos, estamos perante uma relação jurídica “sui generis” que não pode ser ignorada e que determina a prevalência de uma das partes sobre a outra.

    XXV) É a mesma entidade jurídica que tutela a relação laboral e que...

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