Acórdão nº 213/07 de Tribunal Constitucional, 23 de Março de 2007

Data23 Março 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 213/2007

Processo nº 1070/2006.

  1. Secção.

    Relator: Conselheiro Bravo Serra.

    1. Em 15 de Janeiro de 2007 o relator proferiu a seguinte decisão: –

    “1. Pelo 4º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa instaurou em 17 de Abril de 2000 (vindo a petição a ser enviada sob registo do correio ocorrido em 14 desse mesmo mês) o Licº A. contra o Banco de Portugal acção, seguindo a forma de processo ordinário e a que foi dado o valor de Esc. 68.265.000.000$00, solicitando que fosse declarado válido um contrato firmado entre ele, autor, e o réu, que fosse esse contrato qualificado como um contrato de prestação de serviços e, em função dessa qualificação, que fossem consideradas determinadas cláusulas desse contrato, que fosse definido que de entre as regalias que o réu concedia aos seus empregados figurassem certas regalias, que discriminou, que fossem declaradas nulas determinadas alterações introduzidas pelo réu no contrato sem consentimento do autor, e que fosse o mesmo réu condenado a pagar-lhe: –

    – determinados quantitativos, a apurar, a título de diferença de vencimentos, e participação nos lucros do réu;

    – prejuízos, no montante de Esc. 6.000.000$00, sofridos pela alteração introduzida pelo réu nas condições de um mútuo concedido para aquisição de habitação própria;

    – prejuízos, no montante de Esc. 10.000.000$00, que o autor sofreu por encargos fiscais que teve de suportar;

    – prejuízos, no montante de Esc. 2.265.000$00, sofridos pela antecipação da reforma;

    - o montante de todas as despesas médicas e medicamentosas que o autor despendeu ou venha a despender consigo ou com os seus familiares;

    – a retribuição, a título de reforma, que vier a ser fixada com a integração do chamado complemento remuneratório, diuturnidades, subsídios de Natal e de férias e de comparticipação anual nos lucros;

    – o fornecimento de material informático nas condições que vieram a ser recusadas;

    – o montante de Esc. 50.000.000$00 a título de indemnização por danos morais.

    Por despacho saneador proferido em 14 de Novembro de 2001 foi o Tribunal do Trabalho julgado incompetente em razão da matéria para conhecer do pedido, em consequência sendo o réu absolvido da instância, e isso porque foi entendido que o contrato invocado na petição era de qualificar como um contrato de trabalho.

    Nessa peça processual foi ainda referido que a decisão tomada quanto à excepção de incompetência prejudicava a apreciação de outras matérias, designadamente a da prescrição invocada pelo réu, aditando-se que, pesasse embora a prejudicialidade daquela apreciação, se afigurava que o direito invocado pelo autor estaria já prescrito, o que, também por aí, conduziria a que se considerasse procedente a excepção de prescrição.

    E, quanto a este ponto, mencionou-se no despacho saneador que ao caso não era aplicável o disposto no nº 3 do artº 327º do Código Civil, pois que a anterior acção intentada pelo autor no foro civil comum em 2 de Março de 1994 e na qual o Banco de Portugal – que, tal como nestes autos, figurava como réu – foi absolvido da instância, não tinha a virtualidade de interromper o prazo prescricional. E isto porque a absolvição levada a efeito nessa acção era de imputar ao autor, já que, tendo ele reputado o contrato pelo mesmo invocado como detendo «traços» de contrato de trabalho, deveria, desde logo, ter optado por intentado a acção perante os tribunais do trabalho.

    Do referido despacho agravaram autor e réu para o Tribunal da Relação de Lisboa.

    O segundo (o réu), pretendendo, por intermédio do recurso, que fosse o despacho saneador revogado na parte em que considerou o Tribunal do Trabalho incompetente em razão da matéria, já que, na óptica do réu, uma tal decisão teria violado o caso julgado formado pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça lavrado na acção intentada no foro civil comum e na qual se decidiu que o contrato em apreço era um contrato de trabalho. Solicitou, pois, o réu, nesse agravo, que viesse a ser determinado o prosseguimento dos autos, com apreciação do mérito da causa, nomeadamente da excepção de prescrição.

    O primeiro (o autor), intentando, pela via do agravo, que fosse o despacho agravado no tocante à decidida excepção de incompetência, objecto de revogação, sendo substituído por outro que determinasse o prosseguimento do processo.

    O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 26 de Junho de 2002, concedeu provimento a ambos os agravos, revogando o despacho recorrido e ordenando o prosseguimento do processo.

    Em 24 de Outubro de 2002 foram elaborados, no 4º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, despacho saneador – que, no que ora releva, julgou improcedente a excepção de prescrição invocada pelo réu –, especificação e questionário.

    Inconformado com o despacho saneador, na parte em que teve como improcedente a excepção de prescrição, recorreu o réu para o Tribunal da Relação de Lisboa.

    Em 6 de Julho de 2004, o Juiz do 4º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa proferiu sentença por via da qual a acção foi julgada parcialmente procedente. Nessa sentença foi: –

    – declarado válido o contrato de trabalho celebrado entre o autor o réu;

    – o réu condenado a reconhecer que faziam parte daquele contrato determinadas cláusulas;

    – declarado que em Maio de 1974 autor e réu acordaram em que o montante recebido inicialmente pelo autor também era devido a título de subsídios de férias, Natal e Páscoa, que o réu suportaria o pagamento dos impostos profissional e complementar do autor e das contribuições para o Fundo de Desemprego que fossem devidos em função das remunerações auferidas por este último, e que o mesmo tinha direito, ao fim de três anos de serviço, a um mútuo a longo prazo até ao quantitativa de Esc. 1.000.000$00, com juro de 1,5% ao ano, para aquisição de habitação própria nas condições de qualquer empregado do réu;

    – declarada nula a reclassificação do autor, operada em 1977, como assistente técnico III;

    – condenado o réu a pagar ao autor, a título de indemnização por danos morais, a quantia de € 8.500, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

    Do assim decidido apelaram autor e réu para o Tribunal da Relação de Lisboa.

    Este Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 18 de Janeiro de 2006 – que conheceu da apelação interposta pelo réu do despacho saneador – revogou esse mesmo despacho, julgando procedente a excepção de prescrição, em consequência absolvendo o réu da instância e considerando prejudicado o conhecimentos das demais questões suscitadas nos outros recursos.

    Irresignado, pediu o autor revista para o Supremo Tribunal de Justiça.

    Na alegação adrede apresentada, foi escrito, no que agora interessa, em dados passos: –

    ‘(…)

    E, para além do comportamento processual do Réu – perdoe-se a franqueza – também surpreende que todas as decisões dos processos se conjuguem para impedir a tutela jurisdicional efectiva dos direitos de que o Autor se arroga.

    Especificamente, surpreende, não é demais repeti-lo, no que tange ao Acórdão recorrido, a interpretação que faz dos n.ºs 2 e 3 do artigo 327º do Código Civil no sentido de, no caso dos autos, a absolvição da instância por incompetência em razão da matéria do tribunal cível, mesmo que decretada após o pedido de apreciação prévia da questão substantiva da qualificação do contrato, possa entender-se como motivo processual imputável a negligência do titular do direito, pois que, com essa interpretação, tais normas violam o direito constitucional, do Recorrente, de acesso aos tribunais, previsto no artigo 20º da Constituição, bem como os princípios da proporcionalidade e da tutela da confiança, mais o disposto no n.º 2 do artº 202º do mesmo diploma. Além de violar o artigo 9º do Código Civil.

    (…)

    CONCLUSÕES

    (…)

  2. A absolvição da instância na 1ª Acção não pode ser imputável, por motivo processual, ao ora Recorrente, enquanto titular dos direitos em causa, porque a absolvição decorreu, não de razões de processo, mas de razões substantivas que tinham a ver com a qualificação do contrato, e pela lei que vigorava eram os tribunais civis da comarca de Lisboa os competentes para procederem à sua qualificação, conforme decorre do citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2000.

  3. Assim sendo, pelo que está expresso na primeira parte do n.º 2 do artigo 288º do Código de Processo Civil, a concessão do prazo de 30 dias da sua parte final não repele, mas pelo contrário adiciona o regime dos números 2 e 3 do artigo 327º do Código Civil, pelo que, nesta perspectiva e de acordo com o artigo 9º do Código Civil, a prescrição dos direitos do Autor nunca se pode considerar completada antes de findarem dois meses após o trânsito em julgado da absolvição da instância.

  4. E dois meses a contar do trânsito em julgado da absolvição da instância que, como dissemos, ocorre em 16 de Março de 2000, permitiriam que a acção pudesse ter sido intentada até 16 de Maio de 2000.

  5. Decidindo como decidiu, o Venerando Tribunal a quo não teve em consideração ou interpretou mal as disposições legais que têm vindo a ser referidas; e, com as interpretações que fez delas, mencionadamente, as dos n.ºs 2 e 3 do artigo 327º do Código Civil, inviabilizou a garantia constitucional do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva do ora Recorrente, bem como os princípios da proporcionalidade e da tutela da confiança de todos os cidadãos na resolução jurisdicional dos seus litígios (CRP artºs 20, n.ºs 1,4 e 5; e 202, n.º 2).

    (…)’

    O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 15 de Novembro de 2006, negou a revista.

    Para assim concluir, aquele Alto Tribunal, após decidir que o autor não beneficiava, na presente acção, da eficácia interruptiva da prescrição da citação do réu ocorrida na acção que fora intentada nos tribunais cíveis comuns, visto não ter observado o prazo previsto no nº 2 do artº 289º do Código de Processo Civil, impostou a questão de saber se o dito autor beneficiaria do prazo de dois meses, para se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT