Acórdão nº 71/07 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Fevereiro de 2007

Data02 Fevereiro 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 71/2007

Processo n.º 1112/06

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.A., S.A. intentou em 11 de Maio de 2006 acção especial ao abrigo do Decreto-Lei n.º 268/98, de 1 de Setembro, contra B. e C., ambos residentes na Marinha Grande, pedindo a sua condenação no pagamento de € 2.442,92, invocando incumprimento por parte destes do contrato de mútuo celebrado entre eles e aquela instituição bancária. Onze dias depois, em 22 de Maio de 2006, a demandante veio apresentar “em complemento ao já referido na petição inicial”, uma peça em que disse:

    A., S.A., nos autos à margem referenciados, e em complemento do já referido na petição inicial vem ainda deixar expresso que a Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril, na parte e na medida em que altera a redacção do artigo 110.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, é inconstitucional, e consequentemente, a referida alínea a) do n.º 1 do dito artigo 110.º, com a mencionada redacção, é inconstitucional – logo inaplicável pelos Tribunais “ex vi” o disposto no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa – na interpretação que permita a aplicação do disposto no referido artigo 110.º, n.º 1, alínea a), a contratos celebrados anteriormente à publicação da referida Lei em que as partes tenham optado, nos termos do artigo 100.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, do Código de Processo Civil, por um foro convencional no que respeita à competência dos Tribunais em razão do território, por violação dos princípios da adequação, da exigibilidade e da proporcionalidade, e da não retroactividade consignado nos artigos 18.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa e, também ainda, por violação dos princípios da segurança jurídica e da confiança corolários ambos do Estado de Direito Democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, donde o Tribunal de Lisboa ser o competente para conhecer da presente acção

    .

    Esta peça processual foi objecto do seguinte despacho, proferido em 6 de Julho de 2006:

    O requerimento apresentado é manifestamente anómalo e estranho ao andamento normal do processo.

    Na verdade inexiste previsto no Código de Processo Civil a figura do “requerimento complementar”, sendo certo que o aduzido no sobredito requerimento não faz sentido no estado actual do processo, constituindo uma antecipação da decisão a proferir e normas a aplicar, contendo matéria de eventual recurso para o Tribunal Constitucional, órgão competente para apreciar a questão suscitada.

    Pelo exposto, determina-se o desentranhamento do requerimento de fls. 18 e sua devolução ao apresentante.

    Apresentou então a demandante requerimento em que dizia:

    A., SA, nos autos de acção com processo especial que, por este Juízo, intentou contra B. e marido tendo sido notificado do despacho de V.Exa. de fls. 23, que ordenou o desentranhamento do requerimento de fls. 18, despacho que, nos termos da lei, não admite recurso, vem consignar nos autos – para efeitos de oportuno recurso para o Tribunal Constitucional, atento o decidido pelo mesmo no acórdão 191/9[1], de 8 de Maio de 1991, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, volume 19.º, págs. 283 – que a questão da inconstitucionalidade referida no dito requerimento foi levantada “durante o processo” em momento em que o Tribunal se podia pronunciar validamente sobre a mesma.

    Por sentença do 8.º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Cível de Lisboa, datada de 20 de Julho de 2006, foi julgada verificada a excepção de incompetência territorial e, consequentemente, declarado aquele tribunal incompetente para a acção e competente o Tribunal Judicial da Marinha Grande. Pode ler-se naquela decisão:

    A., SA, intentou a presente acção especial ao abrigo do DL n.º 268/98, de 1.9, contra B. e C., ambos residentes na Marinha Grande, pedindo que sejam solidariamente condenados a pagar-lhe a quantia global de € 2.442,92, invocando contrato de mútuo não cumprido por aqueles.

    A presente acção foi intentada em 11.5.2006.

    Os réus são pessoas singulares.

    *

    É de considerar que:

    Em 1.5.2006 entrou em vigor a Lei n.º 14/2006, de 26.4, a qual procedeu à alteração dos artigos 74.º e 110.º do C.P.C., nos seguintes termos:

    - Art.º 74.º, n.º 1: “A acção destinada a exigir o cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento é proposta no tribunal do domicilio do réu, podendo o credor optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o réu seja pessoa colectiva ou quando, situando-se o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana”;

    - Art.º 110.º, n.º 1, al. a): “Nas causas a que se referem o artigo 73.º, a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do art.º 74.º”.

    E, segundo o art.º 6.º da Lei n.º 14/2006, publicada no D.R., I-A, n.º 81, de 26.4.2006, pág. 2909, esta aplica-se às acções e aos requerimentos de injunção instaurados ou apresentados depois da sua entrada em vigor.

    Ora, considerando a causa de pedir da presente acção: cumprimento de contrato, e atendendo ao local da residência dos réus: Marinha Grande, a interposição da presente acção no Tribunal “a quo” surge injustificada, porquanto de acordo com a lei processual civil em vigor à data da apresentação da acção este Tribunal já não era competente, em razão do território, para conhecer e decidir o pleito em causa.

    Não obstante, veio o autor argumentar que o Tribunal competente por as partes o terem elegido, tendo essa escolha sido “feita nos termos e ao abrigo do disposto no art.º 100.º, n.º 1, com referência ao disposto também no art.º 110.º, ambos do Código de Processo Civil, nas redacções dos ditos preceitos anteriores às que lhe foram dadas pela Lei n.º 14/2006, de 26.4, pelo que a escolha é válida e legal atento o disposto nos artigos 5.º e 12.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil”.

    De acordo com o art.º 12.º do Código Civil no domínio da aplicação no tempo das leis processuais a lei só dispõe para o futuro, não tendo pois eficácia retroactiva. Assim sendo, e porque a Lei n.º 14/2006 não contém nenhuma disposição transitória, impõe-se concluir que a mesma se aplica imediatamente às acções que sejam instauradas posteriormente à sua entrada em vigor.

    Deste modo, tendo a presente acção sido instaurada em 11.5.2006 e não tendo a Lei n.º 14/2006 feito qualquer distinção entre os casos em que tenha existido determinação de competência convencional ou não, no âmbito da lei processual anteriormente vigente, impõe-se concluir que carece de fundamento o alegado pelo autor.

    Efectivamente, da análise da Lei n.º 14/2006, por consideração dos seus elementos literal e teleológico, bem como da suaoccasio legis, resulta que deixaram de ter validade as convenções anteriores nas quais se tenham afastado as regras da competência territorial, nos casos a que se refere o n.º 1 do artigo 74.º do CPC, ou...

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