Acórdão nº 0274/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelPAIS BORGES
Data da Resolução11 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: ( Relatório ) I. O PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DA AMADORA recorre jurisdicionalmente para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença do TAF de Sintra (Juízo Liquidatário) de 27.06.2006 (fls. 224 e segs.), que concedeu provimento ao recurso contencioso interposto por A..., com os sinais dos autos, anulando, por procedência dos vícios de falta de fundamentação e de preterição de audiência dos interessados, o despacho do ora recorrente, de 13.03.2002, pelo qual foi concedido à recorrente contenciosa o prazo de 22 dias úteis para proceder ao encerramento da oficina de reparação automóvel, sob pena de encerramento e demolição coercivos da construção, com despejo sumário dos seus ocupantes.

Na sua alegação formula as seguintes conclusões: A. A douta sentença recorrida, salvo o devido respeito, enferma de erro de julgamento, designadamente no que respeita à matéria de facto e à subsunção desta ao direito, bem como às conclusões que daí retirou e em que se baseou.

B. O Bairro Novo, onde se situa a construção cujo despejo e demolição foram ordenados pelo acto recorrido, ocupa a faixa de terreno a libertar para a construção do Nó de Benfica e respectiva ligação à Radial da Pontinha, cuja construção é da responsabilidade da Câmara Municipal de Lisboa.

C. Embora a construção da via esteja a cargo da Câmara Municipal de Lisboa, a área em que se situa a construção em apreço está localizada dentro dos limites geográficos do Município da Amadora, sendo urgente proceder à demolição de todas as construções ali existentes, pelas razões de interesse público indicadas.

D. A construção do referido Nó de Benfica e respectiva ligação à Radial da Pontinha está inserida no grupo de obras, que vêm sendo executadas por ambos os Municípios, com o objectivo de melhorar as acessibilidades na zona em que está a ser construída a via de ligação entre a Avenida Marechal Teixeira Rebelo e a Estrada Militar, permitindo um melhor escoamento do trânsito da 2.ª Circular e da Avenida Lusíada.

E. Actualmente, apenas a manutenção de algumas barracas no local está a impedir a construção da referida via, pelo que é plenamente justificada a dispensa da audiência prévia dos interessados, nos termos do art. 103.°, n.º 1, al. a), do Código do Procedimento Administrativo.

F. Embora a notificação do acto impugnado se refira às operações de construção do IC-16, tal não passou de um pequeno lapso, motivado pela dificuldade que os serviços têm na identificação correcta de todas aquelas vias, atenta a sua proximidade.

G. Não se pode deixar de considerar justificada a urgência na demolição da construção em causa, bem como das demais ali existentes, tendo em conta os compromissos assumidos pelo Município da Amadora com o Município de Lisboa, que já cumpriu a sua parte no acordo, e que, neste momento, apenas se aguarda que o terreno se encontre livre e desocupado, para dar início às obras.

H. Importa ainda mencionar que, ainda que a audiência dos interessados constitua uma formalidade essencial no procedimento administrativo, na situação em análise a audiência da Recorrente em nada poderia influenciar a decisão que afinal veio a ser proferida.

I. O direito de audiência prévia só é absolutamente indispensável, para além das situações de urgência, como é o caso, nas situações em que a intervenção do interessado possa ter alguma influência na tomada de decisão, o que manifestamente não sucedia na situação em apreço.

J. No caso vertente, a Recorrente não dispunha de quaisquer elementos, que lhe permitissem influenciar a decisão tomada pela entidade recorrida.

K. Trata-se de uma construção ilegal, na qual está a ser exercida uma actividade não licenciada com violação do disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 62 do decreto-lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, constituindo a Câmara Municipal na obrigação de ordenar o despejo sumário dos seus ocupantes e de proceder à sua demolição.

L. E, pelas razões de interesse público enunciadas supra, é imperioso que a Câmara proceda à execução desse acto o mais rapidamente possível.

M. O acto impugnado encontra-se, de facto, correctamente fundamentado, uma vez que indica expressamente que se baseia na falta de licença de utilização da construção em causa.

N. A urgência, que determinou a dispensa da audiência prévia, também se encontra devidamente fundamentada com base na necessidade de promover as obras referidas, embora por lapso se tenha indicado que se trata das obras do IC-16, quando, na verdade, estão em causa as obras do Nó de Benfica.

O. Ainda que a Recorrente tivesse tido oportunidade de se pronunciar em sede de audiência dos interessados, em nada poderia ter alterado ou influenciado a decisão final, uma vez que a Administração está vinculada ao cumprimento da lei, a qual nestas situações determina a demolição.

P. Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida deu prevalência a uma questão menor de carácter meramente formal, que não se deve sobrepor à questão substancial de fundo.

Q. Face ao exposto, é evidente que a douta decisão recorrida deve ser anulada e substituída por outra que considere que o acto impugnado está devidamente fundamentado, e que aprecie como correcta a dispensa da audiência prévia, quer por se encontrarem reunidos os pressupostos para tal, quer pela inutilidade que se verificaria pela realização da mesma.

Nestes termos e nos melhores de direito ..., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, com a consequente revogação do douto acórdão recorrido, com o que se fará JUSTIÇA II. Não foram apresentadas contra-alegações, e a Exma Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal emitiu o seguinte parecer: "Vem o recurso interposto da sentença que anulou o acto contenciosamente impugnado, com fundamento nos vícios de falta de fundamentação e de preterição da audiência prévia de interessados.

Muito embora se entenda que o acto se encontra devidamente fundamentado, pois, contrariamente ao entendimento da sentença, indica de forma clara os motivos da decisão - aí se referindo serem ilegais a construção, bem como a actividade nela exercida - parece-nos que a anulação se deverá manter, por violação do princípio da audiência.

Não se encontram nele minimamente esclarecidos os motivos por que estamos perante uma decisão urgente, ficando-se sem saber qual a razão por que aí se afirma que "a situação factual descrita está a afectar as operações de construção do IC 16". Aliás, como posteriormente a própria entidade recorrente veio a reconhecer e mantém na sua alegação, as obras não respeitam à construção do IC 16 e sim ao Nó de Benfica, sendo que segundo declaração do Presidente do IEP, prestada em data muito posterior à da prolação do acto recorrido, em 2002.12.16, tais obras integravam um projecto em relação ao qual ainda nem sequer fora, então, aberto concurso - cfr alínea I da matéria de facto da sentença.

Há, assim, que concluir pela inverificação da urgência da decisão e pelo dever de audiência da interessada nos termos do art° 100º do CPA.

Acresce que neste caso não havia razão para aplicação do princípio do aproveitamento do acto, conforme também decidiu a sentença recorrida.

Como tem vindo a ser afirmado pela jurisprudência deste STA, o exercício de poderes vinculados não justifica, por si, a preterição da formalidade...

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