Acórdão nº 0363/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução03 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A..., S.A., impugnou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria uma liquidação de imposto sobre os produtos petrolíferos.

Aquele Tribunal julgou procedente a impugnação.

Inconformada, a Fazenda Pública interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões:

  1. A sentença ora recorrida julgou procedente a impugnação e determinou a anulação do acto de liquidação em Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) e respectivos juros compensatórios, praticado por esta Direcção Regional, por considerar que não há fundamento legal para a liquidação impugnada, pelo que a mesma será ilegal, por violação do disposto no ponto 7.º da Portaria n.º 234/97, de 04 de Abril.

  2. Sentença com a qual não se conforma a Fazenda Pública, por entender que deve ser feita a interpretação correctiva e teleológica do ponto 7.º da Portaria nº 234/97, de 04 de Abril.

  3. Assim, a exclusiva questão de direito a submeter à apreciação deste alto tribunal é a de saber se in casu se verifica a ilegalidade da liquidação em ISP, conforme decidido na douta sentença de que ora se recorre.

  4. Para o gasóleo utilizado em equipamentos afectos a actividades para as quais se encontra legalmente prevista a isenção de ISP, encontra-se prevista a aplicação de uma taxa de imposto reduzida, nos termos do artigo 74.º do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (CIEC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 566/99, de 22/12.

  5. Trata-se de um produto com benefício fiscal (redução de taxa), na acepção do n.º 2, do artigo 2.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, e cujo abastecimento se encontra sujeito às condições fixadas na lei.

  6. Efectivamente trata-se de um produto de venda condicionada, sendo o respectivo abastecimento, vinculado à utilização de um cartão microcircuito, condição esta que abrange tanto os vendedores (ponto 7.º da Portaria n.º 234/97, de 04/04) quer os consumidores finais (n.º 5, do artigo 74°, do CIEC).

  7. A impugnante dedica-se ao comércio por grosso de combustíveis, não se tratando, portanto, de um adquirente de gasóleo colorido e marcado na acepção do n.º 5, do artigo 74°, do CIEC, encontrando-se antes abrangido pelo disposto no ponto 7, da Portaria n.º 234/97, de 04/04, enquanto vendedor.

  8. As restrições à venda do referido combustível remontam aos primórdios do sistema, primeiro com o D.L. n.º 15/97, de 17/01, e posteriormente com a Portaria n.º 234/97, de 04/04, diploma que contém a disciplina aplicável ao funcionamento da rede de venda ao público do gasóleo colorido e marcado.

  9. Nos termos do artigo 11.º da LGT, na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis. Ora, a interpretação correctiva é admissível na ordem jurídica nacional, conforme decidido no Acórdão do STA de 23/01/2003, recurso n.º 03P3223.

  10. Assim, embora o legislador não tenha de facto sido rigoroso quanto à terminologia utilizada, a verdade é que o ponto 7.º da Portaria n.º 234/97. de 04/04. deve ser interpretado correctiva e teleologicamente.

    atento que se trata de um produto com benefício fiscal (redução de taxa), que é objecto de coloração e marcação, só podendo ser utilizado pelos equipamentos taxativamente fixados por lei (artigo 74.º n.º 3, do CIEC), devendo, ainda, quer a venda quer a aquisição do gasóleo ser sujeita a registo em terminal informático mediante a utilização de cartão microcircuito para o efeito atribuído aos respectivos beneficiários (após estarem reunidos os pressupostos legais à fruição do benefício fiscal em causa).

  11. Com efeito, resultando do artigo 8.º deste diploma que, o controlo das quantidades vendidas pelos postos de abastecimento é da competência da DGAIEC, tendo por base a informação constante dos sistemas informáticos e, assentando o sistema de controlo instituído, na informação constante daqueles sistemas através da utilização obrigatória do cartão de microcircuito para registo das transacções efectuadas, a mera interpretação literal, segundo a qual o legislador queria efectivamente referir-se aos registos contabilísticos redundaria num absurdo, esvaziando de qualquer sentido e de eficácia o sistema de controlo instituído. O que estará em causa no referido sistema de controlo é a análise dos registos das transacções de gasóleo colorido e marcado através do cartão de microcircuito instituído (movimentos registados no PÔS), não sendo o mero registo (contabilístico) das vendas condição suficiente ao cumprimento do estatuído no ponto 7.º, da Portaria n.º 234/97, de 4/4.

    Nestes termos e nos demais de direito e com o douto suprimento de V. Exas, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, revogando-se a, aliás, douta sentença recorrida, assim se confirmando integralmente o acto de liquidação objecto da Impugnação judicial, por legal, com o que se fará a costumada Justiça! Não foram apresentadas contra-alegações.

    O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: A meu ver, procedem os fundamentos do recurso.

    Na verdade, o teor do ponto 7. da Portaria n.º 234/79, de 4 de Abril. Só se harmoniza com a regulamentação global (cfr. o art. 9.º do C Civil) da venda e aquisição de gasóleo colorido e marcado se for lido deste modo: «... em relação às quantidades que venderem e que não figurem documentadas, através dos números dos cartões com microcircuitos dos adquirentes, no movimento contabilístico do posto».

    E não se trata de interpretação correctiva: decorre naturalmente, parece-me do texto e do espírito da norma, à luz do contexto da regulamentação global; interpretação correctiva revogatória fê-la, parece-me, para Meritíssimo Juiz «a quo» na sentença recorrida, ao excluir o requisito «cartão com microcircuito».

    Termos em que sou de parecer que o recurso da Fazenda Pública merece provimento.

    As partes foram notificadas deste douto parecer e nada vieram dizer.

    Por despacho do Relator, as partes foram convidadas a pronunciarem-se sobre a questão da eventual inconstitucionalidade do n.º 7 da Portaria n.º 234/97, de 4 de Abril, à face do preceituado nos arts. 106.º, n.º 2, e 168.º, n.º 1, alínea i), da CRP, na redacção vigente em Abril de 1997 [103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, nas redacções posteriores].

    As partes pronunciaram-se sobre esta questão, a Impugnante defendendo a inconstitucionalidade e a Fazenda Pública afirmando a compatibilidade constitucional daquela norma, designadamente, em suma, por ela ter cobertura no art. 3.º, n.º 1, alínea e), do C.I.E.C., a nível de incidência subjectiva, e nos arts. 4.º, n.º 1, 70.º e 74.º do mesmo Código, no que concerne à incidência objectiva.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    2 - Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:

    1. A impugnante foi alvo de uma inspecção levada a cabo pela Divisão de Serviços Antifraude - Divisão Operacional do Sul, que culminou com a elaboração do relatório de fls. 11 a 17 do processo de cobrança apenso, que se dá por integralmente reproduzido, donde se destaca o seguinte: «XI inspecção efectuada à A..., S.A., incidiu sobre os óleos minerais (...) Quanto ao conteúdo da resposta da A..., S.A., à nossa notificação, no exercício de resposta há a referir: 1. Clientes Revendedores Há a salientar que no decurso dos actos inspectivos, foi solicitado à A..., através do nosso fax n.º 279 de 30-04-2003, listagem dos clientes revendedores de gasóleo agrícola. Na resposta a esse fax, enviada a 23-05-2003, não constam alguns dos revendedores agora referidos.

    Relativamente aos clientes - ... lda. (NIF 504 786 164) -...

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