Acórdão nº 07B2533 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Outubro de 2007
Magistrado Responsável | FONSECA RAMOS |
Data da Resolução | 02 de Outubro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA-Construções, Ldª intentou, em 14.9.2001, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Amarante - 1º Juízo - acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra; BB e mulher CC Peticionando a condenação dos RR. no pagamento de 4.748.071$00, sendo 4.128.758$00 de capital e o restante de juros de mora vencidos contados desde 15.09.01, bem como os vincendos até efectivo e integral pagamento.
Por sua vez, no processo apenso - (Proc. 383-A/2001- acção sumária) - BB, tendo como interveniente principal sua mulher CC, intentou contra "AA-Construções, Ldª", acção sumária peticionando o pagamento da quantia de 2.678.172$00.
Alegou, em síntese a "AA: A Autora é uma sociedade comercial por quotas, cujo objecto social consiste na construção de edifícios e venda de imobiliário.
No exercício dessa actividade, a Autora obrigou-se em relação aos Réus a realizar para estes a obra de demolição de uma moradia pré-existente e reconstrução geral e ampliação da mesma moradia pré-existente.
Ficou acordado entre a Autora e os Réus que estes pagariam aquela a quantia de 14.000.000$00 pela realização da obra.
Durante a execução da obra os Réus exigiram à Autora a realização de alguns trabalhos a mais não previstos no projecto aprovado pela Câmara Municipal, os quais implicaram um custo para a A. da quantia de esc. 2.028.758$00.
Encontram-se os RR. em dívida no montante peticionado.
Conclui, pois, pela procedência da acção.
Contestaram os RR. impugnando os factos e invocando o cumprimento defeituoso do contrato.
Assim, tendo em atenção o pedido deduzido no apenso e a consequente compensação de créditos refere que são credores da A. e não devedores.
Replicou a Autora, pugnando como na petição inicial.
Na acção apensa: O Autor BB refere o acordo havido com a Ré AA Construções Ldª, mediante o pagamento de 14.000.000$00, pelo primeiro, a segunda obrigava-se a efectuar as obras de reparação e ampliação na propriedade daquele.
Após a entrega da obra o Autor constatou a existência de vários defeitos na mesma, sem que a Ré os corrigisse.
Para reparação dos aludidos defeitos haverá um dispêndio de 4.387.500$00.
Por conta do valor da empreitada foi entregue à Ré a quantia de 11.500.000$00.
O Autor forneceu ainda materiais que competiam à Ré no valor de 790.000$00.
Conclui, pois, pela procedência da acção.
Citada a Ré para contestar veio impugnar os factos alegados pelo Autor.
Conclui, pela improcedência da acção.
A final foi proferida sentença que:
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Julgou parcialmente procedente a acção principal e condenou os RR. BB e CC a pagarem à Autora AA- Construções, Ldª o montante de 2.397.750$00, actualmente €11.959,93 (onze mil novecentos e cinquenta e nove euros e noventa e três cêntimos), acrescido dos juros de mora comerciais contados desde a data de prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento.
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Julgou improcedente o remanescente do pedido da acção principal e absolveu os réus do mesmo.
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Condenou a Ré AA-Construções, Ldª a proceder à reparação dos defeitos descritos sob os nºs 24) a 31) e 41) a 47) da matéria de facto provada.
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Julgou improcedente o pedido efectuado no apenso A pelo Autor BB para condenação da R. AA no pagamento da quantia de esc. 2.678.172$00.
*** Inconformados, a "AA" e os BB recorreram para o Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de fls.489 a 506 verso, de 6.2.2007 - aclarado pelo de fls. 519; -- julgou parcialmente procedente a apelação da AA; - Julgou improcedente a apelação dos AA; -- Declarou nula a sentença recorrida na parte em que condenou a "AA" a reparar os defeitos da obra; -- Condenou aqueles BB CC pagarem à AA a quantia de € 13.735,94 (2.753.808$00) acrescida de juros de mora à taxa de juros comerciais desde 28.5.2000 até integral pagamento; -- Julgou improcedente a acção intentada pelo BB contra a "AA".
*** De novo inconformados recorreram os AA.
que, alegando, formularam as seguintes conclusões: 1) - Entendem os recorrentes que nem em termos de matéria de facto, nem em termos de matéria de direito, a decisão ora recorrida pode ser mantida, mas antes merece a revogação.
2) - Porque ficou provado que entre a Autora e os RR. foi acordado um contrato de empreitada em que aquela se obrigou a construir um prédio e a demolir a construção que no local já existia pelo preço de 14.000.000$00 (catorze mil contos).
3) - Mais ficou acordado que os RR. tinham o direito de comprar materiais para a obra, que fornecidos à Autora o seu valor seria deduzido no preço acima referido.
4) - Provou-se ainda que os RR. solicitaram à Autora obras, para além das constantes do contrato acordado, na qual a Autora gastou 1.048.800$00 que os RR. se obrigaram a pagar-lhe.
5) - Também se provou que os RR., por conta do preço da empreitada liquidaram à Autora, em dinheiro, a quantia de 11.500.000$00 (onze mil e quinhentos contos).
6) - Bem como lhe entregaram materiais para a realização da obra no valor de 1.146.058$00, de harmonia com o que com ela haviam acordado, o qual teria de ser deduzido no montante da empreitada.
7) - Tal valor dado como provado, foi-o após as partes não terem acordado no seu valor, atribuindo o Autor a tais materiais o valor de 400.000$00 e os RR. o valor de 790.000$00.
8) - O Tribunal da Relação em violação do disposto no artigo 712° do Código de Processo Civil, reduziu o valor de tais materiais de 1.146.058$00 para 790.000$00.
9) - Alterando a matéria de facto fixada em primeira instância, dando-a como não escrita, não se tratando de uma questão de direito, nem referidas a factos que só possam ser provados por documentos, ou que sejam plenamente provados, quer por documentos quer por acordo ou confissão das partes.
10) - A violação das normas processuais acima referidas (art. 712° e 646°, nº4 ambos do Código de Processo Civil) é altamente lesiva dos interesses dos ora recorrentes, pelo que têm eles legitimidade para a impugnarem.
Não se trata nos autos senão de determinar o montante da dívida caso a empreitada tivesse sido devidamente realizada.
Para o que é fundamental a averiguação do montante pago pelos RR. quer em dinheiro quer em materiais fornecidos.
11) - Para além disso é facto insofismável e incontroverso que a Autora não cumpriu a prestação a que se obrigara para com os RR., pois a empreitada sofre de defeitos, cuja culpa da sua existência só à Autora é imputável.
12) - Pois, em termos de matéria de facto julgada provada, se apurou que a obra efectuada pela Autora sofria de defeitos graves, necessitando de reparações para repor a obra nas condições projectadas; nomeadamente: - levantamento do soalho e rodapé em pinho em todo o interior da casa e aplicação de novo soalho em pinho tratado, bem como rodapé; - levantamento do soalho e substituição da telha e telhões em todos os cantos; - levantamento do chão das varandas, passeios e escadas, peitoris em volta das janelas e portas exteriores, substituindo o granito de Vila Real por granito de Mondim; - reparação das paredes e tectos no piso inferior e retocar a pintura geral; - eliminação de humidade no rés-do-chão, reparação de paredes e tectos, estes com fissuras, retocagem e pintura geral; - em todas as paredes exteriores tapamento de fendas preparação das mesmas incluindo pintura geral com tinta isoladora; - tais reparações foram orçadas em 3.750.000$00; (por manifesto lapso, agora corrigido, foi indicado o valor de 3.750$00).
- o sifão da casa de banho não ficou devidamente aparafusado, libertando mau cheiro; - as pedras que forram as janelas e as portas têm 10 cms de largura, quando deveriam ter 12 cms; - a porta de entrada principal, feita em madeira não convenientemente seca, inchou e deixou de abrir tendo por isso, uma vez, havido a necessidade de ser arrombada, para se conseguir entrar; - algumas ripas de suporte de soalho, por mal colocadas, determinam que algumas tábuas se partam, quando o peso sobre estas recai nas extremidades; - a correcção de tais defeitos custará quantia de montante não apurado.
13)- Perante tais desmandos na prestação a que se obrigara a Autora na realização da obra, e perante a recusa expressa e tácita do reconhecimento dos defeitos e da sua reparação, mesmo depois de estes terem sido judicialmente reconhecidos, ficaram os RR. desonerados de cumprir a sua prestação por força do disposto no artigo 428°, nº1, do Código Civil.
14) - A recusa dos RR. legitima-se não só em termos da legislação vigente, mas da jurisprudência pacífica existente, relativa ao contrato de empreitada.
15) - Tal se apura da leitura do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Fevereiro de 2003, (Colectânea - vol. I, pág. 103) e Acórdão da Relação de Coimbra de 24 de Setembro de 2003 (Colectânea, vol. IV, pág. 17), que meramente a título exemplificativo se referem.
16) - Assim quer em termos de legislação quer em termos de jurisprudência se justifica o pedido formulado pelos RR., na acção sumária apensa à acção principal.
17) - Pois têm os RR. direito a exigir da Autora a título de repetição do indevido e de enriquecimento sem causa (art. 476° a 479º do Código Civil), o que pagaram a mais.
18) - Bem como tem direito à redução do preço da empreitada nos termos do disposto no art. 1222° do Código Civil.
19- Acresce por último que os RR. não estão na situação de mora, pelo que é indevida e ilegal a sua condenação no pagamento de juros a tal título.
20) - Muito menos à taxa comercial, por o contrato em discussão ser de natureza civil, quer por parte da A quer por parte dos RR.
21) - O Acórdão ora recorrido, de harmonia com o acima exposto, viola frontalmente o disposto nos arts. 712°, n°1°, 428°, n°1, 406°, n°1, 432°, 473°, 476°, 480°, 884°, 1222°, 1223° todos do Código Civil e 646°, n°4 e 661°,nº1, ambos do Código de Processo Civil.
Nestes termos deve o presente recurso de revista ser provido, para determinar a total revogação do Acórdão da Relação do Porto, ora recorrido, lavrando-se Acórdão que julgando improcedente e não provado o pedido...
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