Acórdão nº 07S1934 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução26 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 26 de Abril de 2004, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, S. A., pedindo: (a) seja declarada a ilicitude do seu despedimento e a condenação da ré a pagar-lhe a remuneração já vencida de 530,22 euros, acrescida de juros e das remunerações que se vencerem até final; (b) seja a ré condenada a reintegrá-la ao seu serviço, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, com a qualidade de trabalhadora permanente, ou a pagar-lhe a indemnização de antiguidade, acrescida dos juros respectivos, calculada nos termos do artigo 13.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, adiante designado por LCCT, se tal for a sua opção.

Alega que foi admitida ao serviço da ré para exercer as funções de carteira no Centro de Distribuição Postal (CDP) da Moita, mediante contrato de trabalho a termo certo, ao abrigo da alínea h) do n.º 1 do artigo 41.º da LCCT, celebrado em 9 de Fevereiro de 2001, pelo prazo de 6 meses, com início em 12 de Fevereiro de 2001 e que caducou em 12 de Agosto de 2001, referindo-se como motivo justificativo a contratação de jovem à procura de primeiro emprego, quando a verdade é que a ré a contratou para substituir uma carteira transferida para o CDP do Montijo.

Em 13 de Agosto de 2001, as partes firmaram novo contrato de trabalho a termo certo para o exercício das mesmas funções, pelo prazo de 12 meses, referindo--se como motivo justificativo a contratação de jovem à procura de primeiro emprego, sendo que este segundo contrato, mediante adenda formalizada em 13 de Agosto de 2002, foi renovado pelo período de doze meses, «por virtude de o segundo contraente não ter, ainda, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional», tendo caducado em 12 de Agosto de 2003, mediante comunicação da ré à autora de que não seria renovado.

Portanto, esteve ao serviço da ré, de forma ininterrupta, de 12 de Fevereiro de 2001 até 12 de Agosto de 2003, para o exercício das funções de carteira no CDP da Moita, sendo que a motivação da referida Adenda «é completamente irreal, pois a Ré sabia que a A. assinou a mesma porque não queria perder o emprego», o que determina a conversão automática desta relação jurídica em contrato sem termo, nos termos do n.º 1 do artigo 41.º-A da LCCT, já que a ré, ao celebrar sucessivos contratos a termo com a autora, para o exercício das mesmas funções, mais não visou que ludibriar o regime legal da contratação sem termo e fê-lo por necessitar dos serviços da autora de forma permanente.

Assim, a cessação do contrato de trabalho da autora por parte da ré equivale a um despedimento sem justa causa e devendo considerar-se ilícita.

A ré contestou, sustentando a prescrição dos créditos relativos ao contrato caducado em 12 de Agosto de 2001, a validade do termo aposto nos contratos em causa, já que a autora declarou nunca ter sido contratada por tempo indeterminado, e a licitude da cessação do contrato de trabalho da autora.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente, declarou ilícito o despedimento da autora e condenou a ré a reintegrá-la ao seu serviço como trabalhadora permanente, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, e a pagar-lhe a quantia de € 11.929,95 (€ 530,22 x 22 meses e quinze dias).

  1. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou procedente, revogando a decisão da primeira instância e absolvendo a ré do pedido, sendo contra esta decisão que a autora se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões: «1.ª O presente recurso é interposto do douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que concedeu provimento ao recurso de apelação da R. e revogou a sentença do Tribunal de 1.ª Instância. O douto parecer da Procuradoria no Tribunal da Relação é de se manter a sentença de 1.ª instância; 2.ª Salvo todo o muito respeito que é devido ao acórdão da Tribunal de 2.ª Instância, a A. continua convicta que essa decisão viola a lei substantiva por erro de interpretação e de aplicação e é inconstitucional; 3.ª Com efeito, em face dos factos provados "a declaração" da A. "de nunca ter sido contratada por tempo indeterminado" representar a realidade correspondente à situação de primeiro emprego segundo a própria definição do Dec. Lei n.º 257/86, substituído pelo Dec. Lei n.º 34/96 e art. 41.º, n.º 1, al.

    h), da LCCT, representando uma confissão extrajudicial da A., como entende o Tribunal de 2.ª Instância, é completamente irreal, quando se pode ver que a R. contratou a A. para substituir a carteira que foi desempenhar as suas funções para o CDP do Montijo (cfr. n.º 2 dos factos provados), e a R. contratou a A. para o CDP da Moita onde estavam três giros sem carteiros efectivos; 4.ª Assim sendo, o motivo do 1.º contrato devia ser por substituição temporária de trabalhador, previsto no art. 41.º, al.

    a), [n.º 1], do D.L. n.º 64-A/89, e a R. devia, pelo menos, contratar a A. para ocupar o giro de um desses carteiros efectivos, em vez de usar o "tipo de contratação" previsto na al.

    h) [do n.º 1] do art. 41.º da LCCT, na satisfação das suas necessidades permanentes (cfr. n.os 7 e 14 dos factos provados), aten[t]o o princípio da boa fé que deve informar todas as relações jurídicas e muito mais as dirigidas às pessoas; 5.ª Ainda, conjugando o facto n.º 5 e o n.º 10 infere-se claramente que a "declaração" da A. de nunca ter sido contratada por tempo indeterminado valorizada pelo Tribunal de 2.ª Instância substancialmente nada vale, por a A. encontrar-se numa situação de sujeição perante a R. e não querer perder o "emprego" (cfr. n. ° 10 dos factos provados), situação que nas relações laborais não pode deixar de ser valorizada a favor da A.; 6.ª Por fim, vistos os factos provados sob os n.os 1 a 10 e 12 a 14, que a R. não consegui[u] contraditar como lhe competia, verifica-se que a R. usa e abusa do motivo previsto na al.

    h) [do n.º 1] do art. 41.º do D.L. n.º 64-A/89, de forma que nada tem haver com a razão da lei de combater o desemprego, usando esse regime para manter situações de precariedade de emprego das pessoas, o que é ilegal nos termos do n.º 2 do citado artigo e inconstitucional nos termos dos arts. 53.º, 59.º, n.º 1, al.

    b) [e] c), da CRP; 7.ª Deste modo, o Tribunal de 2.ª Instância interpretou e aplicou mal os arts. 41.º, n.º 1, al.

    h), da LCCT e arts. 358.º, n.º 2, e 376.º, n.o[s] 1 e 2, do CC no caso sub judice, devendo considerar-se que os contratos são nulos por insuficiência do motivo justificativo do termo; 8.ª Por outro lado, considerar-se que "apenas um contrato a termo foi celebrado em momento posterior à vigência do art. 41.º-A" para concluir que "não pode dizer-se que se verifica uma sucessão de contratos de trabalho, capaz de integrar uma previsão de tal preceito", como faz o Tribunal de 2.ª Instância, deve considerar-se uma má aplicação e interpretação do disposto no preceito em causa, visto que de acordo com os factos provados n.os 1, 2, e 4, a Ré contratou uma segunda vez a A. depois de a Lei n.º 18/2001 de 3.07 ter entrado em vigor e ainda durante a vigência do primeiro contrato, pelo que sabia, conscientemente, que estava a celebrar contratos sucessivos com a A., para o exercício das mesmas funções, pelo que deve considerar-se que a relação jurídica entre a R. e a A. se converteu num contrato sem termo; 9.ª Acresce, a consideração de "a renovação do segundo contrato, efectuada em 13.08.02, não consubstanciar uma verdadeira e própria celebração de contrato a termo", pois, de harmonia com o disposto no n.º 4 do art. 44.º da LCTT, "considera-se como único contrato aquele que seja objecto de renovação", como entende o Tribunal de 2.ª Instância, é uma errada aplicação do n.º 4 do art. 44.º, visto o[s] n.o[s] 5 e 10 e 4 dos factos provados, verifica-se que a motivação da "pretensa" renovação do contrato feita pela R. é diferente da prevista no contrato de 13.08.01, a qual nem sequer está prevista na al.

    h) [do n.º 1] do art. 41.º da LCCT, havendo, assim, uma verdadeira sucessão de contratos de trabalho, nos termos e para efeitos do art. 41.º-A, n.º 1, do D.L. n.º 64-A/89 [por lapso manifesto a sequência das conclusões passa da 9.ª para a 12.ª]; 12.ª Pelo exposto, o Tribunal de 2.ª Instância errou ao interpretar e aplicar as normas jurídicas aos factos, nos termos supra referidos, devendo manter-se a decisão do Tribunal de l.ª Instância.» A recorrida não contra-alegou.

    Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta considera que deve ser concedida a revista, parecer que, notificado às partes, não suscitou resposta.

  2. No caso vertente, sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da pertinente alegação, as questões suscitadas reconduzem-se a ajuizar: - Se deve alterar-se a decisão sobre a matéria de facto por alegada violação dos artigos 358.º, n.º 2, e 376.º, n.os 1 e 2, do Código Civil (conclusões 3.ª, 5.ª e 7.ª); - Se é ou não válida a estipulação do termo nos dois contratos de trabalho celebrados entre as partes (conclusões 3.ª, 4.ª, 6.ª e 7.ª); - Se ocorre a violação dos artigos 53.º e 59.º, n.º 1, alíneas b) e c), da Constituição da República Portuguesa (conclusão 6.ª); - Se a celebração sucessiva de contratos de trabalho a termo entre a autora e a ré determina a conversão automática da relação jurídica em contrato de trabalho sem termo, por força do previsto no n.º 1 do artigo 41.º-A da LCCT, na redacção conferida pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, que entrou em vigor em 2 de Agosto de 2001 (conclusão 8.ª); - Se a «adenda» firmada em 13 de Agosto de 2002 configura a renovação do contrato de trabalho inicial ou antes um novo contrato de trabalho...

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