Acórdão nº 4047/2007-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelLEOPOLDO SOARES
Data da Resolução12 de Julho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: SCC - , S.A.

, com sede ..., Vialonga, requereu contra (J), residente na Rua ...Lisboa, providência cautelar não especificada.

Pede que se intime o requerido para se abster de divulgar junto de quaisquer pessoas, qualquer informação interna e confidencial da requerente, relativa à sua organização e estratégias de produção e comercialização, quer o faça, através de documentos que tenha em seu poder, quer por simples transmissão verbal, sob pena de ficar obrigado a liquidar uma sanção pecuniária compulsória de € 1.000.000,00 por cada divulgação que efectuar.

A requerimento da SCC , por despacho de fls. 27 , foi dispensada a audiência prévia do requerido.

Inquiridas as testemunhas arroladas pela requerente o Tribunal proferiu a decisão de fls. 54 a 63 na qual considerou estarem sumariamente provados os seguintes factos: (…) O procedimento cautelar foi então julgado procedente, tendo a sua parte decisória o seguinte teor: " Nestes termos, julgo o presente procedimento procedente , por provado, ordenando que o requerido se abstenha de divulgar junto de quaisquer pessoas, qualquer informação interna e confidencial da requerente , relativa à sua organização e estratégias de produção e comercialização, quer o faça , através de documentos que tenha em seu poder, quer por simples transmissão verbal, sob pena de ficar obrigado a liquidar uma sanção pecuniária compulsória de € 100.000( cem mil euros) por cada violação do dever de abstenção".

A decisão em apreço foi proferida com os seguintes fundamentos de direito: " São dois os requisitos da providência cautelar : (a) que o requerente seja titular de um direito; (b) que haja fundado receio de que esse direito esteja ameaçado de lesão grave e de difícil reparação. Sobre o conteúdo das providências, isto é, sobre as espécies de actos que o Tribunal pode ordenar, o art. 381º do C. P. Civil enuncia o princípio de que o titular do direito pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado. O que importa é que a providência requerida seja adequada ou idónea para conjurar o perigo, para evitar a lesão que se receia (cfr. Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil Anotado, Vol. I, p. 685).

O requerido está sujeito aos deveres laborais decorrentes do contrato de trabalho a que está vinculado, entre os quais o dever de lealdade, previsto na alínea e) do n.º 1º do Art.º 121º do Código do Trabalho, nos termos da qual deve guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não divulgando informações referentes à sua organização, métodos produção ou negócios.

Tal dever de fidelidade, ínsito na própria essência das relações laborais, compreende o dever de guardar sigilo ou reserva profissional e a intensidade com que se impõe ao trabalhador depende da posição que este ocupa dentro da organização empresarial de que faz parte e à importância da informação confidencial a que lhe é permitido aceder.

Da matéria de facto sumariamente provada resulta que o requerido teve e tem por força das suas funções acesso a um conjunto de informação, relacionada com a estratégia de produção e comercialização da requerente, de carácter confidencial e de grande importância e relevo e que violou o dever de lealdade, divulgando parte dessa informação junto do jornalista (PJ), sendo que parte dessa informação foi já divulgada junto da Unicer, a principal concorrente da requerente, sendo o requerido a causa dessa divulgação.

Conclui-se, pois que a requerente é titular do direito a exigir lealdade por parte do requerido.

Face ao comportamento já assumido pelo requerido, é de temer que este exiba documentos confidenciais e internos a que teve acesso no âmbito das suas funções, perante outras pessoas ou entidades, ou até outros jornalistas.

A transmissão pública, através de uma cadeia de televisão ou de um jornal, de uma peça jornalística que tenha por base documentos internos e confidencias da requerente, prejudicará de forma irreversível sua a imagem no mercado se pela sua utilização descontextualizada permitir concluir que esta actua de modo pouco ético no mercado.

A imagem da requerente sofrerá, pois, um imediato prejuízo junto de todos aqueles que acedam à peça jornalística em causa, nos quais se incluirão não só os consumidores dos produtos por ela comercializados, como também, muitas outras pessoas que com ela têm relações comerciais.

O requerido teve e tem acesso a diversos outros documentos nos quais são abordadas e desenvolvidas as estratégias de comercialização da requerente e que a serem revelados, publicamente, ou junto de empresas dela concorrentes prejudicarão seriamente a sua actividade e posição no mercado.

Os prejuízos da requerente, para além dos relacionados com a sua imagem e a das marcas que comercializa, terão reflexos na vertente patrimonial, prejudicando as vendas por falta de credibilidade junto dos consumidores grossistas, retalhistas e do público em geral, sobretudo se as empresas que com ela concorrem acederem às suas estratégias comerciais, o que lhes permitirá, utilizando tal conhecimento, delinearem estratégias de eficaz reacção no mercado à actuação da requerente.

De tal resultará uma situação de dificuldade acrescida no mercado, que a poderá levar a perder valores substanciais da quota que aí detém, com uma consequente diminuição dos lucros que possa gerar.

Conclui-se também haver fundado receio de o direito da requerente está ameaçado de lesão grave e de difícil reparação.

A providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado não pode colidir com direitos constitucionalmente garantidos, designadamente o direito à segurança no emprego, consagrado no art. 53º da C.R.P., tendo em conta, designadamente, que o requerido é objecto, em conjunto com outros quadros da requerente, de um processo de extinção de posto de trabalho, originado por uma decisão relacionada com a reorganização interna desta, processo que decorrerá até 28 de Fevereiro de 2006 (19- da matéria de facto).

Assim sendo, a providência decretada terá sempre de entender-se como salvaguardando o direito de acesso aos tribunais para garantia do direito consagrado no art. 53º da C.R.P., tendo-se em consideração o dever de segredo profissional que decorre do art. 81º do estatuto da Ordem dos Advogados, com a redacção decorrente da Lei 80/2001 de 20 de Julho.

Importa ainda salientar que a providência decretada não colide com a liberdade de expressão e informação consagrada no art. 37º da C.R.P., na medida em que tal direito tem como limites o direito ao bom nome e à imagem".

Devidamente notificado o requerido deduziu oposição ( vide fls 178 a 200) na qual finalizou solicitando a revogação integral da providência cautelar, nomeadamente da sanção pecuniária compulsória.

Alegou , em síntese, que encontra-se sem funções desde 29/4/2005.

Entrou de baixa em Setembro de 2005.

Não se desloca à empresa desde pelo menos 8/9/2005, tendo deixado no seu gabinete todas as pastas e dossiers relacionados com a sua actividade , bem como o computador pessoal cedido pela requerente.

Não tem por esse motivo, conhecimento da vida da requerente ou das suas estratégias a nível comercial.

O único conhecimento que tem da actividade da empresa requerente resulta do que é publicado e transmitido pelos órgãos de comunicação social em especial pelo Presidente da Comissão Executiva da requerida Dr (AP).

Não é verdade que as suas funções passassem pelo contacto constante com as empresas distribuidoras independentes de modo a integrá-las nas estratégias comerciais dos produtos em causa.

O requerido nada tinha de ver com a actividade de venda propriamente dita, cujas estratégias, políticas comerciais, descontos, contratos de exclusividade, "Rappel" ou outras concessões dadas aos clientes ou distribuidores, era da competência única e exclusiva da Direcção de Vendas É falso que as estratégias comerciais da requerente sejam matéria sigilosa, pois têm vindo a ser amplamente divulgadas pelo responsáveis da requerente em diversas entrevistas e informações dadas aos órgãos de comunicação social, antecipando a divulgação de produtos ainda por lançar, zonas estratégicas de actuação, zonas alvo preferenciais em termos de crescimento.

É falso que tenha acedido, para além dos elementos públicos e acessíveis a qualquer trabalhador da requerente, aos elementos pelos quais essas estratégias comerciais são desenvolvidas e implementadas A DADE não tinha acesso às informações específicas de vendas que a Direcção de Vendas queria implementar nem mesmo às decisões estratégicas da requerente decididas em Conselho de Administração, Conselho Executivo ou mesmo ao nível das competentes direcções.

Não teve acesso aos documentos juntos aos autos com excepção daquele que emitiu.

É falso que tenha entregue alguma vez qualquer documento ou parte de documento, informação ou equivalente, pertencente à requerente e respectivas estratégias comerciais, passadas, presentes ou futuras ao jornalista (PJ) ou sequer que lhe tenha...

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