Acórdão nº 5720/2003-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Julho de 2003

Data09 Julho 2003
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório Banco Mais, SA propôs no dia 10-7-2002 acção declarativa com processo ordinário contra (C) pedindo a condenação da Ré no pagamento de € 16.074,36, acrescida de € 1698,28 de juros vencidos até ao presente - 10/7/2002 - e de € 67,93 de imposto de selo sobre estes juros e ainda os juros que, sobre a dita quantia de € 16.074,36, se vencerem à taxa anual de 18,19% desde 11-7-2002 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à referida taxa de 4%, sobre estes juros recair.

Alegou o A. que, tendo em vista a aquisição de um veículo automóvel, mutuou à Ré € 10.574,52.

Foi mutuada a dita quantia com juros à taxa anual de 14,19%.

Foram 72 as prestações fixadas para pagamento.

No montante de cada prestação incluiam-se os juros e outras quantias que elevavam a TAEG (Taxa de Encargos Efectiva Global) a 16,32% sendo o montante de cada prestação de 45.389$00.

Não pagou a Ré a 2ª prestação (10-12-2001) e seguintes vencendo-se a primeira em 10-11-2001.

O débito reclamado pelo A. corresponde a 71 prestações num total de € 16.074,36.

Sobre a quantia em dívida, que se venceu imediatamente face ao não pagamento da dita prestação, incide a cláusula penal estipulada que corresponde à taxa de juro contratual (14,19%) mais (4%) conforme cláusula 8ª do contrato.

Assim, à data em que a acção foi proposta (10-7-2002), reclama o A. juros vencidos no montante de € 1698,28 sobre a quantia total de € 16.074,36 na qual se inclui o capital mutuado de € 10.574,52.

E reclama também o A. juros vincendos até efectivo pagamento à taxa de 18,19% a incidir sobre € 16.074,36.

A decisão recorrida considerou a acção parcialmente procedente.

E, assim, condenou a Ré a pagar as prestações de capital não pagas, a liquidar em execução de sentença, acrescidas de juros à taxa anual de 14,19% desde 10-12-2001 até integral pagamento bem como o correspondente imposto de selo.

As prestações de capital correspondem, portanto, à diferença não apurada entre o total do capital mutuado e o valor, que foi pago, de capital da 1ª prestação; o resultado é obviamente inferior ao somatório das prestações mensais estipuladas de 45.389$00 visto que cada uma delas inclui, como se disse, para além do valor correspondente à fracção de capital mutuado, o montante dos correspondentes juros remuneratórios que, no entender da decisão recorrida, não são devidos.

Foi interposto recurso da decisão pelo Banco Mais.

O Banco Mais, SA sustenta a (I) validade da estipulada cláusula penal (18,19%).

Sustenta depois (II) que a taxa estipulada de 14,19% é válida por não existir qualquer taxa de juros especificamente fixada para o Banco de Portugal para a actividade de financiamento de aquisições a crédito. Em relação a este ponto adiante-se, desde já, que não estamos face a questão controvertida: a sentença - basta ver a decisão - aceita a estipulação pela instituição de crédito, Banco Mais,SA, da referida taxa de juro (14,19%).

Considera finalmente o recorrente (III) que é admissível a capitalização de juros por parte das instituições de crédito não sendo aplicável ao caso vertente o disposto no artigo 560º do Código Civil.

2. Factos provados: 1- A A. é uma sociedade financeira para aquisições a crédito.

2- Em 10-10-2001, no exercício da sua actividade social, a A. celebrou com a Ré (C) contrato de mútuo destinado à aquisição de um veículo automóvel.

3- Do referido escrito consta o seguinte: montante de crédito - 2.120.000$00; número de prestações - 72; valor de cada prestação - 45.389$00; data de vencimento da primeira prestação - 10.11.2001; taxa de juro - 14,19%; TAEG - 16,32%.

4- O referido escrito constitui um formulário com cláusulas previamente elaboradas pela A e impressas no verso da página onde consta a assinatura da Ré.

5- A Ré não pagou a prestação vencida em 10-12-2001 e as prestações seguintes 3. A questão essencial.

A principal questão que aqui se impõe resolver é a de saber se, por se vencerem todas as prestações de um contrato de mútuo por não ter sido liquidada uma delas, pode o credor exigir os juros remuneratórios incluídos no montante de cada uma dessas prestações ou se o valor em dívida se deve limitar ao valor de capital.

Então, a dar-se este último caso, os juros moratórios estipulados a título de cláusula penal (14,4%+4%) incidiriam apenas sobre o valor de capital (2.120.000$00 ou € 10.574,52).

4. A questão de saber se a cláusula penal constante do artigo 8º, alínea c) do contrato deve ou não deve ser afastada.

Diz a cláusula: " em caso de mora, e sem prejuízo do disposto no número anterior, incidirá sobre o montante em débito, e durante o tempo de mora, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de 4 pontos percentuais, bem como outras despesas decorrentes do incumprimento, nomeadamente uma comissão de gestão por cada prestação em mora" Na decisão recorrida considerou-se que, em princípio, a referida cláusula penal (cláusula 8ª do contrato que faz acrescer 4 pontos percentuais à taxa de juro contratual) seria atendível por ser válida (artigo 7º/2 do Decreto-Lei nº 344/78, de 17 de Novembro) e não desproporcionada face aos danos a ressarcir (artigo 19º,alínea c) do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro).

No entanto, a decisão acabou, como se disse, por não considerar aplicável a aludida cláusula penal (18,19%) fazendo incidir sobre o valor da prestação, deduzida dos juros remuneratórios do capital, apenas a taxa de juros moratórios estipulada de 14,19% desde o momento do incumprimento ( vencimento da 2ª prestação).

É que, de acordo com a decisão recorrida, tal cláusula, bem vistas as coisas, não faz parte do contrato.

E não faz parte do contrato...

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