Acórdão nº 0005733 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Fevereiro de 1996

Data14 Fevereiro 1996
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, na Relação de Lisboa: No processo comum n. 573/93.2TB.CLD - primeiro Juízo, da Comarca das Caldas da Rainha, o Ministério Público acusou o arguido, (J), imputando-lhe a autoria das contravenções p. p. pelos artigos 7, ns. 1 e 2, b), e 10, ns. 2 e 5, do Código da Estrada de 1954 - que viriam a declarar-se amnistiadas -, e de um crime de homicídio negligente, p. p. pelo artigo 59, b) - primeira parte, do mesmo código. Na qualidade de viúva e filho e de únicos herdeiros da vítima - (A) -, (D)a e (E) deduziram pedido cível contra a "Companhia de Seguros Fidelidade, SA". Realizado o julgamento, o arguido foi absolvido da acusação-crime e, por ter sido julgado parcialmente procedente o pedido cível, a "Fidelidade" foi condenada a pagar aos autores, a quantia de 2420000 escudos, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais e patrimoniais já apurados, e, ainda, o montante dos "danos patrimoniais sofridos que se vierem a liquidar em execução de sentença como os lesados pediram". Inconformados, recorrem: I - A Digna. Magistrada do Ministério Público, da decisão da questão criminal, concluindo a motivação, como segue (transcrição): "1 - Os factos provados apurados em audiência de julgamento conduzem necessariamente à condenação do arguido; 2 - Ao não o fazer o Mmo. Juiz violou o disposto no artigo 59 do CE; 3 - Este, porém, não tem já aplicação por ter sido revogado com a entrada em vigor do Dl 114/94. 4 - Pelo que a sentença ora recorrida deverá ser alterada por outra que condene o arguido (J) pela prática do crime previsto e punido pelo artigo 136, n. 2 do CP; 5 - Na pena de um ano de prisão efectiva que consideramos ajustada ao caso concreto; 6 - A qual deverá ser totalmente perdoada ao abrigo do disposto no artigo 8 alínea d) da Lei 15/94 de 11/5. 7 - Assim, a sentença recorrida deverá ser alterada e substituída por outra, que absolva o arguido". Na resposta, o arguido pugna pela manutenção do recorrido. II - A "Companhia de Seguros Fidelidade, SA", da decisão da questão cível, concluindo a motivação, como segue (transcrição): "a) a douta sentença ora sob recurso absolveu o arguido por entender que se não tinha provado a culpa deste no acidente a que os autos se reportam; b) mas entendeu, igualmente, que não se encontrava provada a culpa da vítima pelo que graduou, e bem, em 1/3 para esta e 2/3 para o arguido a contribuição causal de cada um dos intervenientes para o acidente; c) e, por isso, ficou a indemnização a pagar aos demandantes em Esc. 2420000 acrescida do montante correspondente "aos danos patrimoniais sofridos que se vierem a liquidar em execução de sentença"; d) tal condenação foi, obviamente, proferida com base na responsabilidade civil pelo risco, o que é perfeitamente legítimo, face ao disposto nos artigos 82 e 377 do Código de Processo Penal; e) simplesmente, por força do disposto no artigo 508 do Código Civil, tal responsabilidade está limitada a Esc. 4000000; f) daí que, da douta sentença recorrida, deve expressamente constar que a quantia a liquidar em execução de sentença não pode exceder a diferença entre o montante já liquidado de Esc. 2420000 e os Esc. 4000000 que resultam da limitação legal para a responsabilidade civil pelo risco; g) não o entendendo assim a douta decisão recorrida violou o disposto nos artigos 483, 506, 508 e 566 do Código Civil; h) termos em que deve conceder-se provimento ao recurso e alterar-se a douta sentença recorrida por forma a que à indemnização a liquidar em execução de sentença seja imposto, como limite máximo, a diferença que resultar da quantia já liquidada de Esc. 2420000 e a quantia de Esc. 4000000 que resulta do limite imposto pelo artigo 508 do Código Civil (...)". Na resposta, os autores do pedido cível sustentam, em síntese, que deve ser negado provimento ao recurso, uma vez que, devendo-se o acidente a culpa do arguido, este responde "sem o limite imposto pelo artigo 508 do Código Civil". III - Os autores do pedido cível, (D) e (E) - subordinadamente, em relação ao recurso de "Fidelidade" -, concluindo a motivação como segue (transcrição): "a) Com base nesta matéria de facto o Meritíssimo Juiz "a quo" decidiu atribuir dois terços de responsabilidade ao arguido e um terço à vítima, enquadrando a responsabilidade do arguido e inerentemente da demandada Companhia de Seguros Fidelidade, SA no âmbito da responsabilidade civil a título de culpa nos termos dos artigos 483 n. 1 e 570 ambos do Código Civil. b) Salvo o devido e merecido respeito consideramos que a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento, porque interpretou erradamente a Lei e aplicou-a incorrectamente aos factos. c) Mas, em nosso entender, a actuação do velocipedista ao circular ao meio da sua metade da faixa de rodagem que lhe estava destinada, a cerca de 1,27m da berma do lado direito, atento o seu sentido de marcha, não pode ser considerada como contravencional e sobretudo não se pode considerar causal do acidente. d) Não se provou que o arguido tivesse avisado a infeliz vítima da sua intenção de o ultrapassar, pelo que também não se pode concluir que impendia sobre a vítima o dever de facilitar a manobra de ultrapassagem. e) O arguido cometeu infracção aos deveres gerais de diligência, pois não imprimiu ao seu veículo a velocidade recomendada, nem se inibiu de ultrapassar o velocípede onde circulava a vítima efectuando a manobra de ultrapassagem ao velocípede temerariamente quando se cruzava com um veículo que circulava em sentido contrário. f) E por via disso ao verificar que não podia concluir a manobra já encetada o arguido guinou para a sua direita cortando a trajectória da vítima, embatendo ainda com a parte de trás da sua motorizada na parte lateral esquerda do velocípede provocando a queda ao solo do (A) e as lesões examinadas e descritas no relatório de autópsia de fls. 20 e 22, que foram causa directa e necessária da sua morte. g) Tal factualidade provada inculca que o arguido terá infringido o disposto nos artigos 7 n. 1 e 2 alínea e), 10 ns. 1, 2, 3 e 5 do Código da Estrada), aprovado pelo decreto-lei 39672 (artigos 24, 36 e 38 do actual Código da Estrada), sendo tais transgressões causais do acidente. h) Havendo contravenção a culpa do arguido presume-se, salvo prova em contrário, conforme o decidido em douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/10/92, BMJ 320, 422 e de 06/01/87 (TJ 27-25). i) Pelo que deverá considerar-se que foi a actuação contravencional e culposa do arguido que foi causal do acidente, assacando-se ao arguido a responsabilidade exclusiva pela produção do acidente, não devendo a demandada Companhia de Seguros Fidelidade SA responder a título de risco, com...

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