Acórdão nº 0066526 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Outubro de 1994

Data20 Outubro 1994
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: - (A) e (B) propuseram acção com processo ordinário contra (C), (D), e Sociedade de Comunicação Independente, SA, pedindo a condenação solidária dos réus no pagamento, a cada um dos autores, da quantia de 10000000 escudos, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação do último, montante aquele em que computam os danos por cada um deles sofridos em consequência da publicação, no semanário "O Independente", de notícias que consideram atentatórias do seu bom nome, uma delas, pelo menos, da autoria dos dois primeiros réus. Todos os réus, - a última, aliás, denominada mais exactamente por Soci - Sociedade de Comunicação Independente, SA -, contestaram, em conjunto, sustentando que as notícias em causa eram rigorosamente verdadeiras, nunca tendo havido, mesmo com os respectivos títulos, a menor intenção de imputar práticas criminosas aos autores, e correspondendo as notícias ao interesse do público em geral, além dos títulos utilizados se enquadrarem no estilo desde sempre assumido por o Independente; impugnando ainda os danos, concluem pela improcedência da acção. Proferido despacho saneador que decidiu não haver excepções nem nulidades secundárias, foram elaborados especificação e questionário, de que ninguém reclamou. No seu requerimento de produção de prova, as rés pediram, além do mais, para prova do quesito 19, que se procedesse a exame médico aos autores. E, nessa parte, tal requerimento foi indeferido por despacho de que agravou a ré (C). Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido dadas respostas aos quesitos, após o que foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou solidariamente os réus a pagarem a cada um dos autores, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos em consequência da notícia da autoria dos dois primeiros réus, a quantia de 1500000 escudos, e juros de mora respectivos, à taxa de 15% ao ano, os vencidos desde 4/11/91 até à data da sentença, e os vincendos até integral pagamento, sempre à taxa legal; e condenou ainda a ré Soci a pagar ao autor (A), a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos em consequência da outra notícia, igual quantia de 1500000 escudos e juros de mora respectivos calculados nos mesmos termos; na parte restante, a sentença julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido. Apelaram os réus, que, em alegações, formularam as seguintes conclusões: 1 - O exame médico aos recorridos, requerido oportunamente, era essencial para a correcta determinação dos danos não patrimoniais que aqueles alegam ter sofrido. Em concreto, o referido exame era essencial para uma criteriosa resposta ao quesito 19, pelo que, salvo o devido respeito, a realização do mesmo não era, de modo algum, impertinente. Decidindo em contrário, o despacho recorrido enferma de nulidade por haver recusado aos recorrentes, sem fundamento, uma faculdade que lhes é conferida pela lei, com prejuízo para o correcto apuramento da verdade material (artigos 512 e 568 e seguintes do Código de Processo Civil), pelo que deverá ser revogado e substituido por outro que admita a realização dessa diligência de prova, com as demais consequências legais; 2 - As alíneas A), E), e G) a X), tal como os quesitos 1, 3, 9 a 13, 17, 18, 24, 27 e 29 a 34, em virtude de haverem sido elaborados através de remissão para documentos juntos aos autos, dando por reproduzidos os mesmos, são destituidos de conteúdo, o que prejudica a sua consideração como fundamento da sentença que veio a ser proferida. Tal deficiência implica, em simultâneo, que não constem, nem da especificação, nem do questionário, os factos que pretensamente foram imputados aos recorridos e que subjazem ao pedido por estes deduzido; O despacho saneador, enfermando de tal omissão, é manifestamente nulo por deixar de fora a quase totalidade da matéria fáctica essencial à boa decisão do pleito (artigo 511 do Código de Processo Civil); 3 - A expressão "ataques jornalísticos" inserta nos quesitos 19 e 20 consubstancia uma conclusão e indícia, logo na fase de saneamento do processo, uma tomada de posição quanto à valia e licitude das notícias, o que é inadmissível; 4 - Os quesitos 24 e 27, aos quais o Mmo. Juiz a quo reduziu toda a matéria de facto alegada pelos recorrentes nos artigos 7 a 47 da contestação são conclusivos, porquanto afirmar todo um conjunto de factos é verdadeiro ou falso é um juízo conclusivo que resulta da indagação da realidade de cada um dos factos que componha esse conjunto. A formulação desses quesitos não tem a virtualidade de permitir uma correcta indagação e produção de prova sobre os factos articulados nos referidos artigos 7 a 47, revelando-se, antes, redundante e tendo como efeito que esses factos alegados pelos recorrentes, por falta de individualização, acabaram por não ser levados, nem à especificação, nem ao questionário, não obstante a sua incontroversa importâncias para a decisão final. Atendendo a essa omissão, deverá o processo baixar à 1. instância de forma a que sejam formulados novos quesitos que tenham em linha de conta tal matéria (artigo 712, n. 2, do Código de Processo Civil); 5 - Sendo certo que é relevante a investigação desenvolvida pelo jornalista em ordem à formação da sua convicção sobre a verdade dos factos noticiados para que se possa aferir da licitude ou ilicitude da notícia, o Mmo. Juiz a quo deveria ter quesitado os factos constantes dos artigos 36, 37, 39, 40, 42 e 87 da contestação, por serem tais factos imprescindíveis à boa decisão da causa. Tal omissão deverá ser cominada nos termos expostos na anterior conclusão; 6 - Não foi quesitada matéria atinente à situação económica dos recorridos e dos recorrentes, como se impunha pela iminência de haver que arbitrar uma indemnização por danos não patrimoniais (artigo 494, aplicável ex vi do artigo 496, n. 3, do Código Civil, e 411, n. 1, e 712, n. 2, do Código de Processo Civil). Impõe-se, por isso, a baixa dos autos para formulação de novos quesitos que tenham por objecto os factos referidos, a apreciar pelo colectivo; 7 - A resposta aos quesitos 24 e 27 é contraditória com o especificado na alínea B) e com a resposta dada aos quesitos 22. Por isso, a resposta aos quesitos 24 e 22 deverá ser anulada, já que, entre si, não são conciliáveis. De qualquer forma a resposta ao quesito 24 sempre se deveria ter como não escrita por estar em oposição com o especificado na alínea B) e a especificação prevalecer sobre as respostas do Colectivo (artigo 712, n. 2, do Código de Processo Civil); 8 - As respostas negativas dadas pelo Colectivo aos quesitos 24 e 27 são nulas por violação das regras gerais quanto à força probatória. Boa parte dos factos relatados, sobretudo na notícia referida em E) e no que diz respeito às áreas e avaliações, estão provados por documentos autênticos (fls. 236 a 240 e 249 a 297); Assim sendo, caso os quesitos 24 e 27 não venham a ser reformulados em atenção aos vícios atrás alegados, a resposta aos mesmos deverá sempre ser alterada em resposta à força probatória plena dos referidos documentos (artigos 363, n. 1 e 2, e 371, n. 1, do Código Civil, e 712, n. 1, b), do Código de Processo Civil); 9 - O quesito 5 é manifestamente conclusivo porquanto nele foi vertido o resultado de um conjunto de factos quesitados nos números 6, 7 e 8. Tal é realçado por a resposta positiva ao quesito 5 estar em contradição com as respostas negativas aos quesitos 6, 7 e 8, já que estes três últimos constituem, efectivamente, as premissas da conclusão que foi levada ao quesito 5. Não poderá, assim, ser atendida a resposta do colectivo ao quesito 5; 10 - As respostas aos quesitos 1 a 3, 5, 13 e 16, são nulas, por se fundamentarem num meio de prova que, no caso, era inadmissível (artigo 638, n. 1, do CPC). Em simultâneo, detecta-se que tais quesitos, ao perguntarem intenções e fins, revelam-se conclusivos, pois que aquelas só podem ser aferidas através dos elementos externos ao processo mental, esses sim consubstanciados em factos, o que implica, a nulidade dos mesmos (artigos 511 e 712 do CPC); 11 - A notícia publicada em 5 de Julho de 1991, referida na alínea A) da Especificação, revestia manifesto relevo social, sendo os factos nela relatados verdadeiros para efeitos de se considerar justificada a actuação dos recorrentes (C) e (D), caso se entenda que algum dano sobreveio, com a publicação da mesma, para os recorridos; 12 - Com a publicação desta notícia, incluindo o envolvimento que lhe foi dado, não excederam os recorrentes os limites da moderação, razoabilidade e adequação, que impedem sobre os meios de comunicação social, e não lesaram o bom nome dos recorridos mais do que o necessário ao relato dos factos; 13 - Com a publicação desta notícia, os recorrentes agiram apenas movidos pelo desígnio de informar os leitores de factos de manifesto interesse público, e nunca com a intenção de ofender os recorridos ou lesar o seu bom nome; 14 - Não foram, assim, ultrapassados os critérios materiais ou limites imanentes do direito - dever de informar e a liberdade de imprensa, não gerando a notícia qualquer forma de responsabilidade, designadamente responsabilidade civil; 15 - A responsabilidade pelos títluos, sub-títulos e legendagem não pode ser assacada aos recorrentes (C) e (D), já que a sua elaboração e publicação depende em exclusivo da direcção do jornal; 16 - Por fim, e relativamente a esta notícia, resultou, também, inquestionável o carácter ilegal do empréstimo contraido pelo recorrido (A) junto do Partido Social Democrata; 17 - Também em relação à notícia publicada em 12 de Julho de 1991, referida em E) da Especificação, enferma a sentença recorrida, sem quebra do devido respeito, de fundamentais erros na apreciação da matéria de facto, - que, aliás, pelos motivos acima expostos, nunca poderia ser correctamentea apreciada dado o modo como foi organizado o questionário -, bem como de uma incorrecta aplicação do Direito...

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