Acórdão nº 1617/2007-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelPEDRO LIMA GONÇALVES
Data da Resolução26 de Abril de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório 1.

Bernardo […] e mulher Inês […] intentaram a presente acção de condenação, sob a forma ordinária, contra Sociedade de Construção Civil […] ., pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhes a quantia de €73.589,90, acrescida de juros desde a data de resolução do contrato-promessa até efectivo e integral pagamento.

Alegam, em síntese, que: - em 19/01/2004, celebraram com a Ré um contrato-promessa de compra e venda da fracção que corresponderia ao r/c Esq. de um prédio urbano pertença da Ré; - os AA. entregaram à Ré a quantia de €5.000 a título de reserva da fracção e, aquando da celebração do contrato - promessa, o montante de €31.794,90 a título de sinal e princípio de pagamento; - ficou acordado que a escritura de compra e venda seria outorgada no prazo de 120 dias a contar da assinatura do contrato-promessa, prazo susceptível de prorrogação por 30 dias no interesse dos promitentes compradores; - a marcação da escritura ficou a cargo da Ré, a qual, contudo, não o fez, tendo os AA insistido, telefónica e pessoalmente, para que o fizesse e, finalmente, através do seu mandatário remeteram à Ré a carta de 26/04/2004, solicitando informação acerca da escritura e manifestando o seu interesse na sua celebração; - não tendo a escritura sido marcada, os AA. acabaram por remeter à Ré carta datada de 21/10/2004 resolvendo o contrato-promessa, imputando-lhe o incumprimento definitivo do mesmo.

  1. Citada, a Ré não contestou.

  2. Foi proferido despacho a considerar confessados os factos articulados pelos AA. saneador e a determinar o cumprimento do disposto no nº2 do artigo 484º do Código de Processo Civil.

  3. Os AA. apresentaram alegações.

  4. Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido.

  5. Inconformados com esta decisão, os Autores interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo, nas suas alegações de recurso, apresentado as seguintes (transcritas) conclusões: 1ª. - Desde logo é manifesto que todos os factos que os AA. explanaram na respectiva petição inicial, foram considerados confessados pela R. (cfr. art. 484º, nº 1 do CPC), a qual, regularmente citada para o efeito, não contestou os termos da acção.

    1. - À revelia do princípio da auto-responsabilidade das partes, a R. não cumpriu o ónus de adoptar uma posição definida sobre a pretensão dos AA., assim, se sujeitando a ver confessada a factualidade contra si deduzida.

    2. - Por falta de contestação é circunstância assente que na sequência dos sucessivos atrasos na marcação da escritura, o longo tempo já decorrido, os prejuízos e incómodos que têm vindo a sofrer, os AA. desinteressaram-se pela aquisição da fracção e que se sentiram, como se sentem, verdadeiramente enganados pela R. que não lhes dava qualquer importância, chegando ao ponto de lhes desligar o telefone.

    3. - Menos verdade não é, que da conjugação de todas estas circunstâncias, aliada à incorrecção da R. e ao total desrespeito pelas expectativas dos AA. levou a que o mesmos se desinteressassem do negócio, nessa consonância, procedendo à resolução do contrato - promessa de compra e venda que a 19.01.2004 tinham celebrado com a R., fazendo-o por carta datada de 21 de Outubro de 2004.

    4. - Foi alegado (art. 39º da p.i.) que a R. deu azo ao incumprimento definitivo do contrato promessa dos autos dado que não procedeu à marcação da escritura pública de compra e venda no prazo estipulado, como era sua obrigação, seja ainda por força da demora e silêncio que se seguiu posteriormente.

    5. - Assim, foi a própria R. a aceitar que deu origem ao incumprimento definitivo do contrato, circunstância que deixou confessada nos autos, mas que mesmo assim, levou o tribunal recorrido a não atender a pretensão dos recorrentes.

    6. - Não obstante, e mesmo que assim não fosse, como é (aceitação, reconhecimento e confissão pela R., que o incumprimento definitivo do contrato de si procede), não se conformam os recorrentes com a opinião do tribunal a quo de que não foi por si invocada, qualquer perca justificada de interesse na prestação da R., tendo-se limitado a afirmar o seu "desinteresse total pela aquisição do imóvel".

    7. - Não é isso, porém, que da petição inicial dos AA. consta, parece-nos inquestionável que os AA. deixaram bem definida as razões do seu desinteresse no negócio no segmento fáctico aí vertido, mostra-se explicito todo elenco de elementos factuais motivadores desse desinteresse, o que também se deixou expressamente veiculado na carta pela qual resolveram o contrato-promessa.

    8. - Na verdade, e ao invés do vertido na sentença recorrida, os AA. não se limitaram a afirmar o seu desinteresse total pela aquisição do imóvel, tendo-o justificado nas duas sedes (seja no seu articulado inicial, seja na carta de resolução) à luz dos atrasos sistemáticos verificados, com o silêncio da promitente-vendedora e com a sua falta de resposta às constantes solicitações para a marcação da escritura pública de compra e venda, ainda lhe referindo os prejuízos advindos da situação, nomeadamente, em termos de compromissos bancários.

    9. - Em consequência da mora da R., os AA. perderam o interesse que tinham na prestação, daí resolvendo o contrato-promessa., dado, que objectivamente, insistiram das mais variadas formas com a sociedade empreiteira, promitente-vendedora, fizeram-no telefonicamente e mesmo em pessoa, junto dos responsáveis da empresa. Foi comunicada àquela, a disposição dos recorrentes para a outorga da escritura e depois disso, nos meses que se seguiram, os AA. instaram a R. para que marcasse a escritura pública, sendo certo, que à generalidade das solicitações dos AA. para a R. marcar a escritura não era dada qualquer resposta, quando àqueles já tinha sido aprovado um empréstimo bancário para a aquisição da fracção.

    10. - Todas estas circunstâncias conjugadas foram causa adequada à perda de interesse dos recorrentes, não lhes sendo exigível, que de acordo com os padrões de normalidade o mantivessem de uma forma indefinida, daqui se entendendo, que a situação dos autos, não tange à simples mora da promitente-vendedora, trata-se, necessariamente, de um incumprimento definitivo, motivado por perda de interesse da contra-parte, o que ficou objectivamente demonstrado e que à R. foi devidamente comunicado.

    11. - Essa objectividade da perda de interesse dos AA., terá de se ter por verificada, fundada que foi em causas objectivas, perfeitamente compreensíveis e aceitáveis ao juízo comum de pessoas normais, donde, a resolução do contrato-promessa em apreço foi validamente efectuada, tendo os AA. motivos para a efectivar, existindo, em concreto, razões bastantes e suficientes para produzir os seus efeitos.

    12. - Ao invés do entendimento explanado pela decisão sob recurso, o mecanismo referido no art. 808º do CC foi desencadeado, assim sucedendo, pela perda do interesse dos recorrentes na aquisição da fracção, objectivamente apreciada e assistindo, como assiste, legitimidade resolutiva aos recorrentes no contrato-promessa de fls. com base na perda do seu interesse.

    13. - Assim não entendendo, violou a decisão sob recurso, por erro de interpretação e aplicação, o disposto no art. 808º, nsº 1 e 2 e 442º, nº 2, ambos do Código Civil, merecendo o devido reparo.

    Conclui pela procedência do recurso e, consequentemente, pela revogação da decisão recorrida, condenando-se a Ré a restituir em dobro aos recorrentes, do prestado no âmbito do contrato-promessa de compra e venda outorgado entre as partes no dia 19.01.2004.

  6. A recorrida não veio contra - alegar.

  7. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    II - Delimitação do objecto do recurso Conforme deflui do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 690º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, o âmbito de intervenção do tribunal ad quem é delimitado em função do teor das conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida), só sendo lícito ao tribunal de recurso apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente.

    Dentro dos referidos parâmetros, emerge das conclusões da alegação do recurso apresentada que o objecto do presente recurso está circunscrito à seguinte questão: - se se verifica a alegação de factos por parte dos AA. no sentido de terem perdido o interesse na celebração do contrato.

    1. Fundamentação 1. Na decisão recorrida, perante a falta de contestação, deu como provados os factos articulados pelos AA., sem os discriminar.

    Assim, encontram-se provados os seguintes factos: 1.1.

    No dia 19 de Janeiro de 2004, os AA. e a Ré outorgaram contrato promessa de compra e venda da fracção que corresponderia ao r/c esquerdo do prédio […] descrito na Conservatória do Registo Predial […] sob o nº […] os AA. na qualidade de promitentes-compradores e a Ré na qualidade de promitente-vendedora - documento de fls.10 a 15.

    1.2.

    Os AA. entregaram à Ré, antes de 19 de Janeiro de 2004, e a pedido da Ré, a quantia de €5.000, a título de reserva da fracção.

    1.3.

    E na data da celebração do contrato-promessa, o montante de €31.794,90 a título de sinal e princípio de pagamento.

    1.4.

    A parte restante do preço - €74.188,10 - seria paga no acto de outorga da escritura pública de compra e venda.

    1.5.

    Ficou acordado que a escritura de compra e venda seria outorgada no prazo de 120 dias a contar da assinatura do contrato-promessa, prazo susceptível de prorrogação por 30 dias no interesse dos AA./promitentes-compradores.

    1.6.

    A marcação da escritura ficou a cargo da Ré, o que esta não fez no referido prazo de 120 dias, nem posteriormente.

    1.7.

    Os AA. insistiram com a Ré para...

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