Acórdão nº 228/07-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Março de 2007
Magistrado Responsável | MARIA JOSÉ MOURO |
Data da Resolução | 29 de Março de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Proc. nº 228-07 - 2ª Secção Apelação Proc. nº 8618/03.TVLSB da 2ª Secção da 6ª Vara Cível de Lisboa 20 Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa: * I - M C da S C e M intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra «Companhia de Seguros, SA».
Alegou a A., em resumo: No dia 2 de Outubro de 2000 ocorreu um acidente de viação na Av. de Roma, em Lisboa, consistente no atropelamento pelo veículo com a matrícula AC, seguro na R., do peão C F A M, marido da A. - e pai de P F de A C e M e P A de C e M - o qual veio a falecer no dia 11 subsequente em virtude das lesões sofridas.
A A. pretende ser ressarcida dos danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos em consequência da morte do seu marido, e reclama ainda o direito a ser indemnizada, conjuntamente com aqueles P e P C e M pelos danos não patrimoniais sofridos pela própria vítima incluindo o dano morte, tudo em consequência daquele acidente de viação, cuja responsabilidade imputa em exclusivo à condutora do veículo segurado pela R.
Pediu a A. que a Ré seja condenada a pagar: a) à A. a quantia de Eur. 50.000,00 pelos danos patrimoniais sofridos com a morte do seu marido; b) em conjunto à A. e seus filhos, a quantia de Eur. 150.000,00, pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do mesmo sinistro.
Logo na p.i., a A. requereu a intervenção principal dos seus dois filhos, P F de A C e M e P A de C e M, intervenção essa que foi admitida.
A Ré contestou imputando ao falecido peão a ocorrência do acidente, a título de culpa única e exclusiva e impugnando os danos invocados.
O processo prosseguiu vindo, a final, a ser proferida sentença que absolveu a R. do pedido.
Da sentença apelou a A., concluindo pela seguinte forma a respectiva alegação de recurso: 1ª.- O acidente de trânsito em discussão nestes autos consistiu num atropelamento mortal na Av. de Roma, em Lisboa, quando o peão atravessava a artéria; 2ª.- E foi assim configurado nos articulados, havendo pois acordo de A. e R., que a travessia do peão era feita da direita para a esquerda do automóvel atropelante; 3ª.- Aliás, era essa mesma versão que constava e consta da participação policial da ocorrência, a qual foi feita com base em declarações da condutora e observação do guarda participante; 4ª.- Ora, foram ouvidas nos autos como testemunhas aquele guarda participante - 1ª testemunha -, uma acompanhante da condutora - 2ª testemunha -, uma passante 3ª testemunha - e a condutora - 4ª. testemunha; 5ª.- Mas, como consta das gravações, o guarda não viu o sinistro, tendo apenas recolhido a versão da condutora e feito observações, tal como a passante também não viu o embate; 6ª.- Mas, a condutora e a acompanhante passaram agora curiosamente a lembrar-se melhor do que na altura, para virem dizer, além do mais, que a travessia do peão se fazia da esquerda para a direita e que o carro atropelante ficou danificado à esquerda; 7ª.- Consequentemente, segundo esta versão rocambolesca do acidente o guarda participante não enfermaria apenas do defeito de ouvir mal, mas também de ver mal, pois viu o carro embatido à direita, quando seria à esquerda; 8ª.- Em face disto, devem ser anuladas as respostas à matéria de facto constantes dos n°s. 28, 29, 30, 31, 33, 34, 36 e 38 da base instrutória; 9ª.- Assim, o sinistro ocorreu em artéria com ampla e total visibilidade, tendo apenas como explicação o excesso de velocidade, a incúria e negligência da condutora, 10ª.- Portanto, trata-se de um acidente culposo, para o qual o prazo de prescrição é de 5 anos (art. 498°. n°. 3 do Código Civil); 11ª.- De qualquer modo, em consequência de tal acidente foi instaurado o processo crime correspondente, mandado arquivar por despacho de 17-9-03; 12ª.- E só a partir daqui poderia contar-se qualquer prazo prescricional; 13ª.- Assim, ao decidir diversamente, a aliás douta sentença recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos art°s. 483°., n°. 1, e 498°., n°. 3, do Código Civil e 3°. e 24°., n°. 1 do Código da Estrada.
A R. contra alegou nos termos de fls. 230 e seguintes.
* II - O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos: 1. No dia 2 de Outubro de 2000 ocorreu um atropelamento na Avenida de Roma, em Lisboa, em que foi interveniente o veículo com a matrícula AC (al. A).
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Nesse acidente foi atropelado o peão C F A M, que acabou por morrer em consequência do mesmo, no dia 11 seguinte (al. B).
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No dia 2 de Outubro de 2000, cerca das 15.30 horas, o peão C F A M atravessava a Avenida de Roma, em Lisboa, no sentido poente/nascente (al. C).
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O peão residiu durante mais de 30 anos no prédio com o nº 70 da Avenida de Roma, em Lisboa, próximo do local do atropelamento (al. D).
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Naquele local a Avenida de Roma oferece visibilidade total, ao longo de centenas de metros (al. E).
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O veículo AC tinha amplo espaço livre à sua frente (al. F).
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O atropelado sofreu, em consequência do acidente, traumatismo craneo-encefálico, com perda de sentidos, lesões internas graves e várias contusões por todo o corpo (al. G).
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Por isso, foi de imediato conduzido ao Hospital de Santa Maria e aí permaneceu em estado grave durante 9 dias, até morrer, sendo que os sete primeiros dias foram passados nos cuidados intensivos (als. H, I e J).
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À data do acidente, o falecido C F A M tinha 73 anos de idade (al. L).
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O falecido era casado com a Autora, desde 20 de Agosto de 1963, em primeiras núpcias de ambos (al. M).
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Do casamento havia dois filhos maiores, P F de A C e M, nascido a de Outubro de 1967, e P A de C e M, nascido a de Abril de 1964 (al. N).
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O veículo AC circulava na Avenida de Roma no sentido norte/sul, ou seja, no sentido Alvalade/Praça de Londres (al. O).
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Na altura do acidente, o veículo AC era conduzido por M N de A da F e S (al. P).
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O acidente ocorreu após o cruzamento formado pela Avenida de Roma com a Rua António Patrício, cuja circulação é regulada por sinalização semafórica (al. Q).
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O veículo AC não deixou rastos de travagem no local do acidente (al. R).
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Por contrato de seguro titulado pela apólice nº, M N de A da F e S transferiu para a Ré a responsabilidade emergente da circulação do veículo com a matrícula AC (al. S).
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O peão C F A M atravessava a artéria referida em 3. a seguir ao entroncamento formado pela Avenida de Roma com a Rua António Patrício, em Lisboa (r. quesito 1º).
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O veículo AC, ao atropelar o peão C M, projectou-o para a frente (r. quesito 9º).
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O veículo AC circulava pela hemi-faixa da direita, atento o seu sentido de marcha (r. quesito 28º).
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Uma vez que a condutora do veículo com a matrícula AC pretendia virar à esquerda, para passar a circular pela Av. dos Estados Unidos da América, em direcção à Av. Gago Coutinho, deslocou-se para a via de tráfego mais à esquerda (r. quesito 29º).
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De forma repentina, surgiu à condutora do veículo AC, no meio da sua faixa de rodagem, o peão C M (r. quesito 30º).
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O peão atravessava a faixa de rodagem fora da passadeira para peões (r. quesito 31º).
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O peão atravessava a artéria referida em 3. mais à frente da passadeira existente no local (r. quesito 33º).
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No local existia sinalização reguladora tanto do trânsito de veículos como da travessia de peões (r. quesito 34º).
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No momento em que o Sr. Eng.º C M procedia ao atravessamento da via, para o trânsito automóvel que circulava pela Av. de Roma, no sentido norte/sul, como a condutora do veículo AC, o sinal semafórico apresentava-se a emitir luz verde (r. quesito 36º).
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O veículo AC antes do embate esteve parado no semáforo que antecede o local do acidente (r. quesito 38º).
* III - Coloca-se nos presentes autos uma questão que antecede as restantes e que cumpre decidir antes de mais: a referente à admissibilidade da junção aos autos pela recorrente e na oportunidade da apresentação das suas alegações de recurso, do documento de fls. 195 - certidão emitida pelos Serviços do Ministério Público dos Juízos Criminais de Lisboa, datada de 14-7-2006, referindo encontrarem-se registados naqueles serviços uns autos de inquérito que estiveram pendentes para investigação de eventual crime de homicídio por negligência de C F A de M, tendo os autos sido arquivados por despacho proferido em 17-9-2003.
Preceitua o nº 1 do art. 706 do CPC que as partes podem juntar documentos às alegações nos casos excepcionais a que se refere o art. 524, ou no caso de a junção se tornar necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.
Dispõe, por seu turno, o nº 1 do art. 524 do mesmo Código que depois do encerramento da...
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