Acórdão nº 10780/06-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução22 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

15 Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO 1. Em 15.12.2003 M F R C intentou, no Tribunal Judicial de Almada, acção de prestação de contas, com processo especial, contra M A M C F e marido A A F, advogados.

  1. A A. alegou que em 07.7.1997 outorgou a favor de ambos os Réus uma procuração forense, a fim de a patrocinarem no processo de inventário que decorreu por apenso ao seu processo de divórcio, o qual correra termos, sob o nº 286/96, no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Moita. Na conferência de interessados foi celebrada transacção, nos termos da qual todos os bens relacionados foram adjudicados ao cabeça de casal, o qual se obrigou a pagar à ora A., a título de tornas, a quantia de Esc. 32 500 000$00. Como o ex-marido da A. não cumpriu a referida obrigação, foi requerida execução, contra a qual foram deduzidos embargos, julgados improcedentes. Em 05.6.2002 o ex marido da ora A. decidiu efectuar o pagamento das tornas, voluntariamente. Os RR. também deram entrada a um requerimento visando o cumprimento coercivo da pensão de alimentos a que o ex marido da A. estava obrigado para com os filhos menores do casal. Face a esse requerimento o pai dos menores regularizou o pagamento das prestações da pensão em atraso. Em 27.5.2002 o Réu marido exigiu à A., no escritório dos Réus, a passagem e entrega de um cheque, no valor de € 53 870,00, isto para lhe efectuar a entrega do cheque de € 179 569,03, equivalente aos Esc. 32 500 000$00, acrescidos de juros de mora. O R. marido pôs, como conditio sine qua non da entrega do aludido cheque de tornas, a prévia passagem e entrega por parte da ora A., do cheque no montante atrás mencionado. Por outro lado exigiu que a A., no mesmo dia, o acompanhasse à agência do Banco da Cova da Piedade e procedesse ao depósito das tornas, para logo no dia seguinte levantar, como levantou, o cheque extorquido à A. A A., embora praticamente em estado de choque, perante a exigência do R. marido, anuiu efectuar o pagamento convencida que parte substancial da referida quantia seria destinada ao pagamento das custas judiciais. Quando, dias depois, apurou junto do tribunal que as custas finais estavam muito longe daquele exorbitante valor, repetidamente insistiu junto dos RR. para que estes lhe apresentassem contas do dinheiro que de forma abusiva lhe haviam extorquido - sem sucesso.

  2. A A. termina pedindo que a acção seja julgada procedente por provada e, em conformidade, sejam os Réus citados nos termos do art.º 1014º-A do Código de Processo Civil, para apresentarem as contas do mandato exercido, no âmbito dos processos judiciais acima referidos, ou contestarem a presente acção. Mais pede que os Réus sejam condenados a restituir à A. a diferença entre o montante das despesas e honorários que venham a apresentar, ou que sejam julgados justos no laudo a solicitar à Ordem dos Advogados e a quantia de € 53 870,00, que receberam da A.. Pede também que os Réus sejam condenados no pagamento dos juros, sobre o aludido saldo, contados desde 27.05.2002 e até a efectiva restituição, à taxa legal.

  3. Indicou meios de prova.

  4. Citados, os RR. contestaram, alegando, no que releva e em síntese, o seguinte: a) A A. apenas pretende obter um laudo, após o pagamento de honorários, sendo certo que a conta de honorários de € 53 870,00 foi apresentada verbalmente à A., na presença do seu filho e de testemunhas, após a entrega do quantitativo exequendo, tendo os honorários sido pagos, com plena aquiescência e agradecimento por parte da A., não se tendo constatado a mínima divergência; b) Se esta acção fosse de prestação de contas, seria competente o tribunal da causa na qual foi exercido o mandato, devendo aquela correr por apenso a esta, isto é, o processo devia correr no Tribunal Judicial da Moita, por apenso ao proc. de inventário nº 286/96, 1º Juízo Cível, ao abrigo do disposto no art.º 76º do Código de Processo Civil, "a contrario".

  5. Os RR. terminam pedindo que o Tribunal Judicial de Almada seja considerado incompetente para julgar o caso e, se assim não for entendido, seja decidido que os advogados signatários não estão obrigados a prestar contas, uma vez que a conta de honorários foi apresentada verbalmente à A., que a aceitou e pagou sem qualquer reserva e com plena aceitação.

  6. A A. respondeu, pugnando pela improcedência da excepção de incompetência, negando que os Réus tenham prestado as aludidas contas e pedindo a condenação dos Réus como litigantes de má fé.

  7. Foi designado o dia 06.01.2005 para inquirição de testemunhas e prestação de depoimento de parte pelos Réus.

  8. No decurso da inquirição da testemunha S M P arrolada pela A., o Réu marido (que advoga em causa própria) interrompeu o depoimento e solicitou que, em virtude de a testemunha ter referido que no dia 26 ou 27 de Maio de 2002 esteve presente numa determinada agência bancária, entre as 10h30 e as 12h, na presença da A., do seu filho e do Réu marido, altura em que foi depositado o cheque visado do Banco da Moita, situação que não corresponde à verdade, solicitou que se oficiasse à dita agência bancária para que remetesse o filme relativo à situação, que no documento do depósito consta ter ocorrido em 27.5.2002.

  9. O requerimento foi deferido e, após ter sido realizada a restante prova pessoal designou-se o dia 19 de Janeiro de 2005 para continuação da audiência.

  10. O banco respondeu informando que não era possível satisfazer o solicitado, uma vez que a cassete respectiva já tinha sido regravada.

  11. Notificados da resposta do banco em 17.01.2005, em 19.01.05 os Réus requereram que, face à aludida resposta, se notificasse a entidade patronal da testemunha S P para juntar aos autos a folha do Livro de Ponto correspondente ao dia 27.5.2002.

  12. Tal requerimento foi indeferido, por despacho datado de 19.01.2005.

  13. Os RR. agravaram do despacho.

  14. Oportunamente foi proferida decisão que julgou improcedente a excepção de incompetência do tribunal deduzida pelos Réus e considerou que os Réus estavam obrigados a prestar contas, tendo determinado que os Réus fossem notificados nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 1014º-A nº 5 do Código de Processo Civil.

  15. Os Réus apelaram da referida decisão.

  16. Ambos os recursos foram admitidos e os recorrentes apresentaram as respectivas alegações.

  17. O tribunal a quo sustentou o despacho alvo do agravo.

  18. Foram colhidos os vistos legais.

    Comecemos por apreciar o AGRAVO.

    Os agravantes apresentaram as seguintes conclusões: 1ª - O despacho em crise violou o direito constitucional do direito à prova, cerceando a prova, limitando à demandada a possibilidade de demonstração em juízo de que se tem razão, afastando a decisão da causa da realidade que o tribunal deveria, por todos os meios ao seu alcance, procurar conhecer para fazer Justiça (art.º 20º da Lei Fundamental).

    1. - Incumbia à 1ª instância ter evitado quaisquer limitações e restrições ao direito à contestação, e tendo restringido, como restringiu a prova, tal redundou numa contestação ilegalmente diminuída ou abafada.

    2. - Há a regra geral da admissibilidade de qualquer meio de prova (artigos 341º e 342º do Código Civil; e artigos 515º e 516º do CP Civil).

    3. - Para que um meio de prova não possa ser usado terá que a proibição ser estabelecida por disposição legal (art.º 515º do Código de Processo Civil).

    4. No processo cível há uma vincada afirmação do princípio da demanda da verdade material (art. 341 do Código Civil).

    5. Donde, a decisão recorrida violou o disposto nos arts 341º do CC e 515º do Código de Processo Civil, pelo que impõe-se a respectiva revogação já que afectou inquestionavelmente o legítimo direito à prova e à contestação da demandada.

      Os agravantes terminam pedindo que o despacho recorrido seja revogado e substituído por outro que admita o meio de prova requerido "que se revela essencial para a descoberta da verdade e para a decisão da causa." Notificada das alegações, a agravada limitou-se a, em requerimento dirigido ao tribunal a quo, manifestar a sua convicção de que as...

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