Acórdão nº 10342/06-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução15 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

18 Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 19.10.2001 Banco intentou nas Varas Cíveis de Lisboa a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra J B M , a sua alegada mulher, S O F, e contra A S.

Alega, em síntese (aqui se reproduzindo a resenha feita pelo tribunal a quo) que no exercício da sua actividade e com destino à aquisição de um veículo automóvel segundo informação prestada pelo R. J, por contrato constante de título particular datado de 6 de Outubro de 2000, concedeu ao dito R. sob a forma de crédito directo a importância de esc.3.000.000$00 com juros à taxa nominal de 19,25% ao ano, devendo a importância do empréstimo e os juros referidos bem como o prémio de seguro de vida serem pagos em 60 prestações mensais e sucessivas, com vencimento a primeira em 10 de Novembro de 2000 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes. Foi acordado que em caso de falta de pagamento de alguma das prestações na data do vencimento, vencer-se-iam imediatamente as restantes. Em caso de mora sobre o montante em débito a título de cláusula penal acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro acordada acrescida de 4 pontos percentuais. O referido R. não pagou a 7a prestação e seguintes vencida a primeira em 10 de Maio de 2001, vencendo-se então todas. O valor de cada prestação, que incluía juros, era de esc. 80.250$00. O total das prestações em débito ascende a esc. 4.333.500$00, quantitativo este a que acrescem juros. Instado pela A. a pagar a quantia em dívida, o dito Réu fez entrega à A. do veículo para que a A. procedesse à sua venda, revertendo o valor obtido com tal venda no abatimento da dívida. A A. procedeu à venda do veículo pelo preço de esc.1.598.640$00, tendo abatido tal valor à dívida, que ficou cifrada em esc.2.976.007$00. O R. J, apesar de instado ao pagamento, ao mesmo não procedeu. O empréstimo referido reverteu em proveito comum do casal pelo que a Ré mulher é igualmente responsável pela dívida. O Réu A assumiu por termo de fiança, datado de 6 de Outubro de 2000, perante a A. a responsabilidade de fiador solidário por todas e quaisquer obrigações assumidas no contrato referido pelo R. J pelo que é solidário com este pelo pagamento de tal montante.

A A. terminou pedindo a condenação dos RR. a pagarem à A. a importância de esc.2.976.007$00 acrescida de esc.147.863$00 de juros vencidos até 19 de Outubro de 2001 e de esc.5.915$00 de imposto de selo sobre estes juros e juros que sobre a dita quantia de esc.2.976.007$00 se vencerem, à taxa anual de 23,25% desde 20 de Outubro de 2001, até integral e efectivo pagamento.

Citados, todos os Réus contestaram.

O Réu J e a Ré S alegaram que o contrato firmado com a A. constitui um conjunto de cláusulas previamente elaboradas pela Autora, composto de condições gerais e específicas. No verso do mesmo e após as assinaturas, sob a epígrafe de condições gerais do contrato surgem uma série de cláusulas que vêm regulamentar as condições em que se celebra o referido contrato, cláusulas essas que foram previamente elaboradas pelo A., sem qualquer participação dos RR.. Tais cláusulas devem ser consideradas excluídas do contrato. Por outro lado, os RR. não foram esclarecidos do teor de tais cláusulas. O Autor nunca por qualquer meio pediu aos RR. ou exigiu a totalidade das prestações alegando o vencimento de todas.

O Réu A contestou em termos idênticos aos dos RR. S e J.

A A. respondeu às excepções arguidas, pugnando pela sua improcedência.

Em sede de audiência preliminar procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à fixação da base instrutória, sem reclamações.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, no final da qual o tribunal respondeu à base instrutória, sem reclamações.

Oportunamente foi proferida sentença, na qual o tribunal a quo julgou a acção parcialmente procedente e consequentemente decidiu: "a) Condenar os Réu, J B M e A S F no pagamento à autora "Banco" de uma quantia a liquidar em execução de sentença, correspondente às prestações de capital não pagas, acrescida de juros moratórios, à taxa anual de 19,25%, desde 11 de Maio de 2001 e até integral pagamento, bem como o correspondente imposto de selo; b) Absolver os mesmos Réus do mais peticionado pela autora Banco; c) Absolver a Ré, S O F, do pedido.

" A A. apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões: 1. As Condições Gerais, bem como as Condições Específicas acordadas no contrato de mútuo dos autos, encontravam-se já integralmente impressas quando o ora recorrido nele apôs a sua assinatura, não foram inseridas depois da assinatura de qualquer das partes, pelo que não existe qualquer violação do disposto na alínea d) do artigo 8° do Decreto-Lei n.° 446/85, de 25 de Outubro, não havendo que proceder à exclusão de qualquer cláusula do contrato.

  1. Não faz qualquer sentido - para além da inexistência de razão justificativa para a exclusão das cláusulas - pretender que estejam apenas em dívida as prestações de capital não pagas, acrescidas dos juros de mora à taxa de 19,25%, contabilizados desde 11.08.2001.

  2. Está provado nos presentes autos que o A. na acção, ora recorrente, é uma sociedade financeira de aquisições a crédito, constituindo, actualmente uma instituição de crédito.

  3. Não existe qualquer taxa de juro especificadamente fixada pelo Banco de Portugal para a actividade de financiamento de aquisições a crédito, isto é, para a actividade exercida pela A., ora recorrente.

  4. A taxa de juro - 19,25% - estabelecida por escrito para o financiamento de aquisição a crédito ao R., ora recorrido, do veiculo automóvel referido nos autos é inteiramente válida.

  5. O disposto no artigo 781° do Código Civil, não se restringe às prestações de capital, estendendo-se evidentemente aos juros remuneratórios que fazem parte de cada prestação que se vence.

  6. É admissível a capitalização de juros por parte das instituições de crédito ou parabancárias que incluem no capital já vencido, sobre o qual incidem juros de mora, salvo se tal capitalização incidir sobre juros correspondentes a um período inferior a três meses.

  7. Não é pois aplicável no contrato de mútuo dos autos o disposto no artigo 560° do Código Civil.

  8. Ressalta do contrato de mútuo de fls. , que os juros capitalizados respeitam ao período de cinco anos.

  9. A capitalização de juros é, pois, inteiramente válida, no caso do contrato dos autos.

  10. É, pois, manifesta a falta de razão do Senhor Juiz a quo na sentença recorrida, que ao julgar, como o fez, parcialmente improcedente e não provada a presente acção, violou o disposto no artigo 560° do Código Civil, nos artigos 5°, 6° e 7°, do Decreto-Lei 344/78, de 17 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 83/86, de 6 de Maio, o artigo 1° do Decreto-Lei 32/89, de 25 de Janeiro, o artigo 2° do Decreto-Lei 49/89, de 22 de Fevereiro, os artigos 1° e 2° do Decreto-Lei 206/95, de 14 de Agosto, e o artigo 3°, alínea I, do Decreto-Lei 298/92, de 31 de Dezembro.

  11. Quer a taxa de juro - 19,25% - convencionada por escrito para o financiamento de aquisição a crédito ao recorrente, quer a cláusula penal ínsita na alínea c) da cláusula 8a do contrato referido nos autos são inteiramente válidas.

  12. A cláusula penal consubstanciada no agravamento de 4% da taxa de juro - 19,25% - estipulada nesse mesmo contrato para os juros remuneratórios, corresponde precisamente ao acréscimo permitido pelo normativo ínsito no artigo 7°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 83/86, de 6 de Maio.

  13. Nada se contém na dita cláusula 8a, alínea c), do contrato de mútuo dos autos, que configure desproporção, e, muito menos, desproporção sensível, entre a pretensa pena nele estabelecida e os prejuízos a ressarcir.

  14. Lembre-se aliás que no quadro negocial padronizado do contrato dos autos se previa uma taxa de juro, legalmente válida, de 19,25%, e que a cláusula penal acordada se cifra num aumento de apenas 4% a acrescer à dita taxa de juros acordada, pelo que nunca se poderá considerar a cláusula penal acordada no contrato dos autos como excessiva.

  15. Não tem pois fundamento a pretensa desproporcionalidade da cláusula penal do contrato dos autos, e não tem, também, fundamento a pretensa nulidade da cláusula 8a do contrato dos autos.

  16. Porque de factos articulados pelo A., ora recorrente, e confessados pelos RR., ora recorridos, se trata devia o Senhor Juiz a quo ter considerado provada nos autos a matéria de facto não impugnada constante do artigo 21° da petição inicial de fls. - ou seja "O empréstimo referido reverteu em proveito comum do casal dos RR., - atento até o veiculo referido se destinar ao património comum do casal dos RR." -, nos termos e de harmonia com o disposto nos artigos 490°, n° 2 do Código de Processo Civil e condenado, por isso, todos os RR., ora recorridos, solidariamente entre si, no pedido dos autos. Tanto mais que, 18. Contrariamente ao "entendido" pelo Senhor Juiz a quo, a alegação de que "O empréstimo referido reverteu em proveito comum do casal dos RR., - atento até o veiculo referido se destinar ao património comum do casal dos RR." não só não é meramente conclusiva nem matéria de direito como contém em si mesma matéria de facto relevante para a decisão dos autos, que, uma vez provada - como é o caso -, impõe a condenação também da R S, ora recorrida, solidariamente entre si, no pedido dos autos.

  17. Ao decidir como decidiu na sentença recorrida o Senhor Juiz a quo violou, interpretou e aplicou erradamente o disposto nos artigos 490°, n.° 2 do Código de Processo Civil.

  18. Nestes termos, deve ser dado inteiro provimento ao presente...

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