Acórdão nº 2536/2006-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelPEDRO LIMA GONÇALVES
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório 1.

M.[…9 Lda. intentou a presente acção de condenação, sob a forma sumária, contra Companhia de Seguros […] S.A., Brisa, Auto-Estradas de Portugal, S.A. e Instituto de Conservação das Estradas e Rede Rodoviária - ICERR, pedindo que os Réus sejam condenados, solidariamente (ou individualmente), a pagar-lhe a quantia de €4.281,37, acrescida de juros à taxa anual de 7%, desde a citação e até ao integral pagamento, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, em virtude de um acidente de viação em que um seu veículo automóvel colidiu com uma pedra com cerca de 30 a 40 kg que se encontrava na A5, e que o acidente ocorreu por negligência dos Réus Brisa e ICERR, sendo que a primeira havia transferido a responsabilidade civil para a ré seguradora.

  1. Citados, os Réus vieram contestar.

  2. A Ré seguradora refere que a Brisa procede ao patrulhamento constante da auto-estrada, bem como a GNR-BT, e não foi detectada a existência de qualquer pedra caída na estrada ao km.19,7.

    Concluindo pela improcedência da acção.

    2.2.

    O Réu ICERR alegou, em síntese, que é parte ilegítima, porquanto a via rodoviária é da jurisdição da Brisa, S.A., que o tribunal competente em razão da matéria para conhecer do seu comportamento é o Tribunal Administrativo e, por outro lado, desconhece os factos constantes da petição inicial.

    Conclui pela absolvição da instância por ser parte ilegítima, ou por o Tribunal não ser o competente em razão da matéria, e, se assim não for decidido, seja absolvida do pedido.

    2.3.

    A Ré Brisa refere que os danos no veículo não tinham o valor agora indicada pela A., que efectua vigilância constante na via, nenhuma anomalia foi detectada e que a condutora do veículo da A. foi interveniente num acidente onde intervieram outros veículos automóveis, tendo o acidente ocorrido por pouca destreza, distracção e precipitação, na avaliação que se deparou, por parte da condutora.

    Conclui pela improcedência da acção.

  3. Foi proferido despacho saneador que absolveu o Réu ICERR da instância, por o Tribunal ser incompetente em razão da matéria, e organizou a matéria de facto assente e a base instrutória.

  4. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo-se respondido à matéria de facto quesitada por despacho de fls.176-178.

  5. Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu as Rés do pedido.

  6. Inconformada com esta decisão, a Autora interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo, nas suas alegações de recurso, apresentado as seguintes (transcritas) conclusões: 1ª. - A Apelante pediu a condenação das Apeladas ao pagamento dos danos sofridos no seu automóvel.

    1. - Com efeito, circulava na Auto-Estrada de Lisboa - Cascais quando embateu numa pedra de 30 a 40 kg que se encontrava na via.

    2. - A Brisa, S.A., tinha passado pelo local do acidente 1h 25m antes da hora em que ele se verificou, pelas 7h 30m.

    3. - A Apelante pagou a portagem.

    4. - A Brisa, por força do contrato de concessão tem a obrigação de assegurar permanentemente em boas condições de segurança e comodidade, a circulação das auto-estradas que lhe estejam concessionadas (Base XLXXXIV).

    5. - Não foi alegado pela Brisa, S.A., nem dado por provado, qualquer caso de força maior devidamente verificado.

    6. - A presença da culpa da Brisa resulta do regime fixado no art. 799º, nº 1 do Código Civil, já que, 8ª.

      - Incumpriu o contrato - Artigo 762º, nº 1, a contrario.

    7. - Torna-se, por isso, responsável pelo prejuízo que causou à Apelante - Artigos 483º e 562º, ambos do Código Civil.

    8. - Uma vez que entre a Apelante e a Apelada Brisa foi celebrado um contrato inominado, tendo aquela pago uma portagem e esta obrigou-se a ceder a utilização da auto-estrada A5 com comodidade e segurança.

    9. - A Douta Sentença Recorrida, ao absolver as Rés, fez uma incorrecta aplicação do direito aos factos dados por provados.

    10. - Com a decisão tomada o Tribunal "a quo" violou o disposto no artigo 690º, nº 2 do Código Civil.

    11. - Pelas razões expostas, não devia fundamentar no artigo 483º do Código Civil para absolver as Rés, sim no disposto nos artigos 483º e 799º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil.

    12. - Por isso, existe uma errada aplicação das normas jurídicas aos factos provados, violando assim o disposto no artigo 659º do Código Processo Civil.

      Conclui pela procedência do recurso e, consequentemente, pela revogação da decisão recorrida, condenando-se as Rés a pagar-lhe os danos sofridos e cujo montante consta da matéria dada por provada.

  7. As recorridas vieram contra - alegar.

    7.1.

    A recorrida Companhia de Seguros […] S.A. apresentou as seguintes conclusões: 1ª. - A sentença recorrida fez uma sábia e adequada apreciação dos factos provados e a aplicação do Direito.

    1. - Consequentemente, deve negar-se provimento ao recurso, mantendo-se, na íntegra, o decidido.

      7.2.

      A recorrida Brisa - Auto-Estradas de Portugal, S.A. apresentou as seguintes conclusões: 1ª. - Ficou provado que a ora apelada efectuou, na data do sinistro, o patrulhamento, como sempre o faz, das auto-estradas sob a sua jurisdição, durante 24 horas por dia, tendo agido com diligência devida, 2ª. - E que nada foi detectado, até momentos antes do sinistro, durante esses patrulhamentos qualquer obstáculo na via, quer pela patrulha da Brisa quer pela GNR-BT, igualmente nos seus patrulhamentos; 3ª. - No caso vertente importa referir que ninguém sabe como surgiu a pedra de 30 a 40 kg na AE, e mesmo que a A. o soubesse, tendo o mesmo originado os danos que o veículo sofreu, não se vislumbra, ainda assim, um facto ilícito cometido pela Brisa, 4ª. - Pois, não impede sobre a mesma, nem decorre do D.L. n.º 294/97 de 24 de Outubro, a obrigação de a todo o tempo e em toda a extensão da auto-estrada assegurar que não existe qualquer obstáculo que possa dificultar ou pôr em perigo a circulação automóvel.

    2. - Tão somente se exige que "em termos razoáveis, em tempo oportuno e de modo eficaz, a Brisa assegure a boa circulação nas auto-estradas concessionadas, fazendo as reparações devidas, mantendo uma vigilância permanente (esta em termos realistas) (...)" (cf. Ac. da Relação de Lisboa de 31/10/96, in CJ IV, pág. 149) 6ª. - Não podia ainda o tribunal "a quo" estabelecer a aplicabilidade do estatuído no art.º 493º n.º 1 do C.C., dado que, "Podemos, com algum esforço, considerar as AE como uma coisa imóvel; seria, então, um prédio rústico. Simplesmente: apenas relevamos os danos naturalísticos causados pelo risco da própria coisa: cai uma ponte ou desaba um piso. Tais eventualidade iriam concorrer com os deveres legais da concessionária (....) mas "já as hipóteses exógenas (animais nas faixas de rodagem, água, gelo, peças à solta, gasóleo, etc.) não têm a ver com "danos causados pela auto-estrada, mas com outras realidades." (Prof. Doutor António Menezes Cordeiro, in Igualdade rodoviária e acidentes de viação nas auto-estradas, Estudo de Direito Civil Português 2004 pág. 48, Ed. Almedina), isto é, 7ª. - o regime do art.º 493º n.º 1 do C.C., só opera perante danos causados pelo imóvel; não no imóvel (Obra cit., pág. 55).

    3. - E como provado está, igualmente, que a Ré tem ao seu dispor meios efectivos de fiscalização que são compostas por veículos automóveis da Brisa que constantemente, 24 horas sobre 24 horas, circulam pelas várias auto-estradas do país, compreendidas no contrato de concessão, a fiscalizar, a verificar e a solucionar eventuais problemas que surjam e a prestar assistência aos demais utentes dessas mesmas auto-estradas, 9ª. - A douta Sentença de todo não poderia presumir da culpa e prática de facto ilícito por parte da Ré Brisa, pelo que atrás foi referido e como bem se decidiu.

    4. - Não podendo a douta sentença recorrida extrair "in casu" a culpa da BRISA, S.A., uma vez que nada se sabe quanto à origem do aludido "obstáculo", às condições e modo por que surgiu na via ou ao momento em que ali apareceu, logo, é manifesto que não é possível concluir-se que a Brisa podia, em tempo útil, ter removido tal obstáculo, e...

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