Acórdão nº 9631/2006-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução18 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Texto integral: Acordam, precedendo audiência, na 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I 1.

No processo comum colectivo n.º 48/05.9JDLSB da 1.ª Secção da 2.ª Vara Criminal de Lisboa, foi submetido a julgamento o arguido M.

, melhor identificado a fls. 262, sob acusação da prática, em autoria material, de cinco crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 172 n.º1 e 2 do Código Penal.

  1. O arguido não apresentou contestação.

  2. Efectuado o julgamento, na ausência do arguido, o tribunal, por acórdão proferido em 6 de Junho de 2006, na procedência da acusação, deliberou condenar o arguido, por cada um desses crimes na pena de três anos e seis meses de prisão, tendo, em cúmulo jurídico, fixado a pena única em sete anos e seis meses de prisão. Decretou ainda a expulsão do arguido do território nacional, por 10 anos, a executar, de imediato, após cumprimento da pena (v.fls.262 a 278).

  3. Inconformado com o assim decidido, o arguido M.

    veio recorrer, extraindo da sua motivação, na sequência de convite que lhe foi formulado, as conclusões de fls.438 e 439, que a seguir se transcrevem, procedendo-se à sua numeração: 1.ª - O arguido não teve qualquer oportunidade de exercer o princípio do contraditório, dada a total impossibilidade de ter conhecimento da existência da audiência de discussão e julgamento; 2.ª - A matéria de facto dada como provada, é manifestamente insuficiente para sustentar a decisão proferida; 3.ª - Pelo que, nessa precisa conformidade, deverá proceder-se à renovação integral da prova, nos termos do art. 412 n.º3 e 410 n.º2 do CPP, e consequente reenvio do processo para novo julgamento, nos termos do disposto nos art. 426 e 426-A do CPP, por forma a assegurar a cabal realização da justiça; 4.ª - E ainda que este não seja o entendimento de V. Ex.ª, e já no que concerne à pena acessória de expulsão do arguido, pelo período de dez anos, esta deverá ser revogada, porquanto viola o disposto no art. 101 n.º1 e n.º4, alin. b) do Decreto-Lei n.º 244/98, de 6 de Agosto, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, e pelo Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro.

  4. O recurso foi admitido por despacho de 16 de Outubro de 2006 (v. fls.344).

  5. O Ministério Público em 1.ª instância veio responder ao recurso nos termos constantes de fls.369 a 372, entendendo que a audiência de julgamento se mostra válida e regular, que o recurso deve ser julgado improcedente quanto à impugnação da matéria de facto, por o arguido não observar o disposto no art.412 do CPP, devendo revogar-se, contudo, a pena acessória de expulsão do território nacional, por falta de suporte legal na sua aplicação, porque o arguido comprova que obteve a nacionalidade portuguesa, mantendo-se, quanto ao mais, o decidido.

  6. Neste Tribunal de Relação, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto, não emitiu qualquer parecer.

  7. Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre decidir.

    II9.

    Na primeira instância foram dados como provados e não provados os seguintes factos: 9.1 - Factos Provados: No início do ano de 2002, o arguido subarrendou um quarto numa casa sita na Rua …em São Domingos de Benfica, Lisboa, onde residia a locatária, F. , e a sua filha, K. , nascida a …de 1993.

    No ano de 2002, em dia indeterminado, o arguido, aproveitando o facto de a menor, K., se encontrar, sozinha, no seu quarto, dirigiu-se-lhe e começou a acariciar-lhe o corpo, na zona do peito.

    Após, o arguido, tirou-lhe as calças, e as cuecas, que aquela trazia vestidas, e introduziu o seu pénis, erecto, na vagina da menor, aí o friccionando, acabando por ejacular para o chão, sem uso de qualquer preservativo, tendo provocado dores na menor, e sangramento na vagina.

    O arguido mandou, então, a menor limpar o esperma, e o sangue, que tinham ficado no chão, e disse-lhe que não deveria falar daquilo a ninguém, com a ameaça de que agarrá-la-ia, e à sua mãe, e mataria as duas.

    O arguido, durante o ano de 2002, voltou a repetir comportamentos semelhantes ao descrito, pelo menos em mais quatro ocasiões, aproveitando o facto da menor estar sozinha em casa, introduzindo-lhe o pénis erecto na vagina, aí o friccionando, e ejaculando sempre fora do corpo da menor.

    O arguido, em tais ocasiões, também lambia e acariciava o peito da menor, apesar do facto de, na altura, aquela ainda não ter os seios desenvolvidos.

    Naquelas ocasiões, o arguido ao acercar-se da K., foi "muito bruto", gritando-lhe para que ela baixasse as calças e as cuecas, sendo que era também aos gritos que ameaçava aquela de que a mataria, e à mãe, se contasse o que se passava.

    O arguido, ao agir como descrito, fê-lo consciente e voluntariamente, com perfeito conhecimento da idade da aludida criança, K., com intenção de satisfazer os seus instintos libidinosos, sabendo que tal menina, em razão da sua idade, não tinha a capacidade e o discernimento necessários a uma livre decisão, que aquele relacionamento sexual prejudicava o normal desenvolvimento da mesma, e que a sua conduta era proibida por lei.

    O arguido tem antecedentes criminais (cfr. CRC., de fls. 116 a 119, - de onde consta condenação do arguido como autor de crimes de uso de documento alheio, de condução sem carta e, de condução sob o efeito do álcool.

    9.2 - A respeito de factos não provados foi exarado que: "Não se provaram quaisquer outros factos; - e, designadamente, não se provou que o arguido, em data não apurada de 2002, quando a menor estava a dormir, se tivesse aproximado e procurasse desembrulhá-la dos "cobertores", tendo a mesma gritado, o que levou a tapar-lhe a boca, conseguindo aquela enrolar-se nas "mantas", por forma a evitar ser tocada pelo mesmo arguido." 9.3 - O tribunal recorrido exarou a seguinte fundamentação da matéria de facto: "Serviram para se formar a convicção do Tribunal Colectivo, o que resultou da inquirição às testemunhas, ouvidas em audiência, sobre factos de que possuíam conhecimento directo, e que constituíam o objecto da prova, K. Sanches - criança, vítima dos actos praticados pelo arguido, dados como provados, e na medida do, por ela, presenciado, e sofrido, a qual os descreveu, convicta, pormenorizada, e com a possível serenidade, com as lágrimas a correrem-lhe pelas faces, em particular no referente aos coitos consumados, consigo praticados, e que a levou, forçadamente, nos momentos a seguir, a ter de limpar o esperma, e o sangue, que, então, sentiu na vagina, e que visionou, após a consumação dos factos -, F., e L., mãe, e primo em 3° grau (e que, à data, vivia naquela casa), respectivamente, daquela menina, a quem a mesma, K., relatou o ocorrido, quanto a si, os quais afastaram, justifícadamente, a hipótese de eventual efabulacão da menor no relato de tais factos -, Z.

    prima do pai da K., que, por menção a período em que ali viveu, referenciou: - que o arguido visionava, no quarto, filmes pornográficos, deixando a porta aberta para que a K., que era curiosa, para ali espreitasse; - que a K. verbalizava não gostar de ficar em casa a sós com o arguido; - que o mesmo arguido a agarrou, por detrás, em determinado dia de 2002, encostando-se-lhe, ao que a testemunha reagiu, mas ficando "com medo" dele a partir de então; - e que associou tudo isto quando soube, pela menor, e mãe, do que acontecera, a K. -, H.

    e G.

    primos do pai da K., que naquela casa também residiram, os quais, no essencial, confirmaram o relatado pela testemunha Z., referindo o H. que o arguido lhe pediu, diversas vezes para ir fazer compras, ficando em casa, a sós, com a menor -, bem como o teor de fls. 18 a 19, 49 a 51, 70, 78 a 85 - designadamente, relatório de exame directo, documentação diversa, relatório de psicodiagnóstico, e assento de nascimento (tudo referenciado em audiência." 10.

    O recurso é um meio processual que visa provocar uma reapreciação de uma decisão judicial de forma a corrigi-la de...

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