Acórdão nº 4890/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2006
Magistrado Responsável | ORLANDO NASCIMENTO |
Data da Resolução | 12 de Julho de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa.
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RELATÓRIO MARIA […] propôs contra, INSTITUTO DE SOLIDARIEDADE E SEGURANÇA SOCIAL, I.P., acção declarativa, com processo ordinário, pedindo que se declare a sua qualidade de herdeira hábil de O. […], com quem viveu em união de facto, para efeitos de pensão de sobrevivência, condenando-se o requerido a reconhecer e a pagar a respectiva pensão, com fundamento, em síntese, em que, viveu com o falecido O.[…] beneficiário do R, como se marido e mulher fossem, durante 17 anos até ao falecimento daquele e não dispõe de meios económicos para suportar as despesas mensais.
Citado, contestou o R declarando desconhecer se os factos alegados correspondem à verdade, por não serem factos pessoais ou de que deva ter conhecimento.
Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença julgando a acção procedente e declarando a A. titular do direito às prestações por morte de O. […] Inconformado com essa decisão o R dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo, a revogação da sentença, formulando, para o efeito, as seguintes conclusões: 1ª O art.º 8º do Dec. Lei 322/90 ao remeter para a situação prevista no art.º 2020º, nº 1 do Código Civil está a equiparar a situação de quem tem direito à pensão de sobrevivência à situação de quem tem direito a alimentos da herança.
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Isto é, a situação que se exige no art.º 8º, para ser reconhecido o direito às prestações de Segurança Social é a mesma daquele que tem direito a exigir alimentos da herança, nos termos do art.º 2020º, nº 1 do C.C.
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Na sequência do disposto no art.º 8º nº 2 do DL 322/90 foi publicado o Dec. Regulamentar 1/94 de 18 de Janeiro que nos seus art.ºs 3º e 5º estabeleceu as condições e processo de prova de atribuição das prestações às pessoas que se encontram na situação prevista no nº 1 do art.º 8º do DL 322/90 (o mesmo é dizer situação prevista no nº 1 do art.º 2020º do C.C.).
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Daqui resultando que atribuição das prestações por morte depende: da sentença judicial que reconheça o direito a alimentos da herança ao requerente (nº 1 do art.º 3 do Dec. Reg. 1/94 de 18/01), desde que na acção intervenha a Segurança Social (art.º 6º da Lei 7/2001), ou do reconhecimento judicial da qualidade de titular das prestações por morte no caso de não ter sentença que lhe reconheça o direito a alimentos por falta ou insuficiência de bens da herança (art.º 3º nº 2 do Dec. Reg. 1/94 e art.º 6º da Lei 7/2001).
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Isto é, tanto na situação prevista no nº 1 do art.º 3º, como na prevista no nº 2 do mesmo artigo do Dec. Regulamentar nº 1/94 será necessário alegar e provar: a) que o "de cujus" era pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens; b) factos demonstrativos ou integrados do conceito união de facto há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges (art.º 2020º C. Civil); c) factos demonstrativos da inexistência ou insuficiência de bens da herança (nº 2 do art.º 3º do Dec. Reg. Nº 1/94); d) factos demonstrativos de não obter alimentos nos termos das alíneas a) a d) do art.º 2009º C. Civil; e) factos demonstrativos da necessidade de alimentos e da impossibilidade de ela própria prover à sua subsistência.
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Donde para atribuição da pensão de sobrevivência é condição essencial e necessária a obtenção da sentença judicial onde se reconheçam e verifiquem todos aqueles pressupostos.
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Ora, conforme se pode ler na douta fundamentação da sentença recorrida do Tribunal "a quo", "Por outro lado, não se apurou que a Autora tenha irmãos, ascendentes, nem descendentes que lhe possam prestar alimentos. Em suma, a Autora não pode pedir prestação de alimentos à herança por óbito do falecido, nem a qualquer outra pessoa com a obrigação de lhe prestar alimentos.
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Acontece que tais factos, a impossibilidade de prestar alimentos pelos familiares das alíneas c) e d) do art.º 2009º do C. Civil, bem como a inexistência ou a insuficiência de bens na herança do "de cujus" para suprirem a necessidade de alimentos da Autora, não só não foram alegados na douta Petição, como não constam da matéria assente e dada como provada pela Mm.ª Juíza a "a quo".
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Assim não se entende como se pode concluir pela procedência da acção e pelo reconhecimento à Autora do direito à qualidade de titular das prestações por morte do beneficiário falecido.
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Ora, com o devido respeito, não concordamos com esta conclusão, na qual se prescindiu de alguns factos que no nosso modesto entendimento, são imprescindíveis para a boa decisão da causa.
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Sendo certo que existiu alguma divergência na jurisprudência no que toca aos requisitos essenciais a provar nestas acções intentadas contra a Segurança Social, hoje, vai sendo pacífica a orientação jurisprudencial que se vem firmando, nomeadamente, aquela que resulta do Plenário do Tribunal Constitucional e que foi proferida no Acórdão nº 614/2005, de 09/11/2005, no qual se considerou não discriminatória, nem desproporcionada a exigência à companheira sobreviva, para além de convivência em condições análogas à das cônjuges por mais de dois anos, o reconhecimento judicial do direito a receber alimentos, nos moldes previstos pelo artigo 2020º do C. Civil, por remissão efectuada pelos artigos 8º do DL 322/90 de 28/10 e artigo 3º do D. Reg. Nº 1/94 de 18/01.
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Acontece que na matéria de facto alegada e dada como provada, nada se diz quanto aos requisitos relativos aos familiares alíneas c) e d) do art.º 2009º do Código Civil (ascendentes e irmãos), como nada sabemos no que respeita a inexistência ou à insuficiência de bens na herança do "de cujus".
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Ou seja, não foram alegados nem provados factos que preencham os requisitos que determinem a impossibilidade ou incapacidade dos familiares das alíneas c) e d) do art.º 2009º do C. Civil em prestarem alimentos à Autora.
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Resulta também, que nem na douta Petição, nem na matéria assente e dada como provada, existe qualquer referência, mesmo que genérica, a factos que indiciem a inexistência ou a insuficiência de bens na herança do "de cujus".
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E como o que conta são os factos que constam dos autos, que a Autora alegou e provou em julgamento, essa matéria, na nossa modesta opinião é insuficiente, é curta, para atingir o objectivo que visava com a propositura da presente acção - o reconhecimento à Autora do direito à qualidade de titular das prestações por morte do beneficiário Orlando Vaz de Pina.
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Ora, como resulta do disposto no art.º 342º nº 1 do C. Civil "aquele que invoca um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado".
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No caso sub judice, face ao quadro factual, não tendo ficado provada a impossibilidade dos familiares obrigados a alimentos nos termos das alíneas c) e d) do art.º 2009º do C. Civil de suprirem a necessidade de alimentos da Autora, caso existam, nomeadamente, ascendentes e irmãos, como não ficou provado que a herança inexista ou seja insuficiente, mal decidiu o Tribunal "a quo" ao concluir da forma como o fez, pela procedência da acção, tendo sido violados, o art.º 8º do DL nº 322/90, de 18/10, art.º 3º do Dec. Reg. Nº 1/94, de 18/10, art.º 1º e 6º da Lei nº 7/2001, de 11/05, art.º 2009º e 2020º do C. Civil.
A apelada não apresentou contra-alegações.
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FUNDAMENTAÇÃO A) OS FACTOS 1) O.[…] faleceu a 12/11/1994, no estado de solteiro (alínea A) dos Factos Assentes).
2) O. […] era o beneficiário n.º […] do Réu "Instituto de Solidariedade e de Segurança Social" (alínea B) dos Factos Assentes).
3) A Autora Maria […] aufere como rendimentos do trabalho a quantia mensal...
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