Acórdão nº 9170/2005-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Outubro de 2005
Magistrado Responsável | FERNANDA ISABEL PEREIRA |
Data da Resolução | 20 de Outubro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório: Nos autos de procedimento cautelar de restituição provisória de posse movidos, no Tribunal Judicial de Cascais, por S contra SB e M, deduziram as requeridas oposição à providência decretada, a qual veio a ser reduzida.
Inconformadas agravaram as requeridas, tendo apresentado a respectiva alegação de recurso, com pedido de emissão de guias para pagamento da multa prevista no artigo 145º nº 5 do Código de Processo Civil, pretensão que a secretaria recusou motivando imediata reclamação das requeridas.
Foi proferido despacho que indeferiu a reclamação deduzida e considerou a alegação extemporânea, julgando o recurso deserto.
Deste despacho agravaram as requeridas, sustentando nas suas alegações a seguinte síntese conclusiva: «1ª Com a decisão de 15 de Março de 2005, o Tribunal a quo recusou as alegações apresentadas pelas Requeridas/Agravantes e julgou deserta a instância de recurso, referente ao agravo interposto pelas requeridas da decisão que reduziu a providência cautelar decretada anteriormente pelo Tribunal.
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Fundamenta o tribunal a quo a sua decisão na inaplicabilidade do disposto no n.º 6 do artigo 698º do C.P.C. ao recurso referido no n. ° 2 do artigo 388° do mesmo diploma no que tange à prova produzida pela Agravada em momento anterior à dedução de oposição.
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Entende assim o tribunal a quo que o artigo 388.° N.º 2 do C.P.C. limita o objecto de recurso da decisão final do procedimento cautelar sem audição prévia à prova produzida após a da oposição pelo requerido.
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Entendem as ora Agravantes que a recusa das alegações de recurso e o decretamento da deserção da instância de recurso foram tomadas em violação da Lei, designadamente dos artigos 2.º, 3.º, 3.º-A, 145.°, 388.° n.º 2, 666.°, 698.° n.º 6, 700.° n.º 1 al. e), 743° n ° l, todos do C.P.C.
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Entendem ainda as ora Agravantes que a interpretação do artigo 388° n.º 2 professada pelo tribunal a quo, interpretação da qual decorre essencialmente a decisão proferida, é errada, por não ter qualquer estribo nos elementos literal, teleológico, sistemático e histórico da interpretação.
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Por fim, entendem as ora Agravantes que a interpretação do n.º 2 do artigo 388.° professada pelo tribunal a quo é inconstitucional, por violar o princípio da igualdade processual e do contraditório, consignadas nos artigos 2°, 3° e 3°-A do C.P.C., e inscritos no direito de acesso aos tribunais ou à tutela jurisdicional efectiva, previsto nos artigos 2.°, 20.° e 202° da CRP.
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O tribunal a quo é incompetente para recusar as alegações apresentadas e para decretar a deserção do recurso porquanto tal implica, no caso presente, a análise do conteúdo das próprias alegações, algo que está, nos termos dos artigos 666.° e 700.° do C.P.C., atribuído ao tribunal de recurso, através do seu relator.
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Deve, por isso, ser imediatamente revogada a decisão do tribunal a quo, por incompetência, devendo ser ordenada a aceitação das alegações.
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A recusa das alegações como o fundamento apresentado é ainda contrária ao disposto nos artigos 743.° N.º 1 e 698° n.º 6, porquanto estes conferem à Agravantes uma extensão do prazo para apresentação de alegações, sempre que o recurso tenha por objecto a reapreciação prova gravada, o que sucedeu no recurso cujas alegações foram recusadas.
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Entendeu o tribunal a quo que estes artigos são inaplicáveis ao recurso previsto no n.º 2 do artigo 388.° do C.P.C., sempre que o recurso tenha por objecto a reapreciação da prova gravada em audiência anterior à apresentação de oposição à providência acautelar.
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É pois, convicção do tribunal a quo que o recurso previsto no n.º 2 do artigo 388 ° se limita à decisão proferida a final e à prova produzida após a apresentação de oposição.
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Não podem as agravantes concordar com essa interpretação, que não tem qualquer esteio na letra da lei e no seu espírito e que contraria jurisprudência superior, nomeadamente a resultante do Ac. do STJ de 6 de Julho de 2000 e do Ac. da RC de 28 de Outubro de 2003.
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Esta norma deve ser interpretada e aplicada no sentido de estender o objecto do recurso tanto à decisão final como à decisão preliminar, assim como a toda a prova, nomeadamente a gravada e produzida durante todo o processo, seja antes, seja depois da oposição.
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É esta interpretação a única conforme com a letra do n.º 2 do artigo 388° que estabelece que "cabe recurso desta decisão, que constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida", o que indica claramente que o objecto do recurso é uma decisão unitária, constituída pela decisão preliminar e final, abrangendo todos os seus respectivos fundamentos, de facto e de direito.
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É ainda a única interpretação coerente com a teleologia do artigo, com a sua inserção sistemática e com esteio histórico da sua elaboração.
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Após a reforma de 1995, o procedimento cautelar libertou-se da sua matriz «executiva» e a acção de matriz declarativa. A alteração ocorrida em 1995 e depois em 1996 é suficiente para sustentar a interpretação que considera a decisão final como unitária, que consome e integra a decisão preliminar e os respectivos fundamentos de facto e de direito.
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Surge ilógico que o recurso final da providência cautelar decretada com audição prévia tenha um objecto diverso daquela proferida sem audição prévia, sendo certo que...
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