Acórdão nº 629/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Abril de 2007
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 19 de Abril de 2007 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: Os autores João de D...
e mulher Maria F...
intentaram no T. J. da comarca de Amares - processo n.º 64/2001 - a presente acção declarativa de condenação, com processo comum e forma ordinária, contra a ré “I...-Imobiliária L.da”, pedindo que a demandada seja condenada a ver reduzido o preço da prometida venda referida na p.i. à quantia de Esc: 4.147.000$00, liquidando os demandantes a quantia restante de Esc: 3.647.000$00 e que seja proferida sentença que produza os efeitos da declaração negocial da ré, declarando-se efectivada a compra e venda em causa.
Em alternativa, pede a condenação da ré a reparar os defeitos referidos nos art.ºs 18º, 21º e 23º da p.i. e, após tal reparação e decorridos 15 dias, a celebrar a escritura pública de venda do imóvel prometido vender.
A fundamentar este seu pedido alegam ter sido celebrado entre os AA. e a Ré um contrato-promessa de compra e venda relativo a imóvel que identificam em 3.º da p.i., pelo preço de Esc: 7.500.000$00, tendo os AA. entregue a esta a quantia de Esc: 500.000$00, a título de sinal e havendo tradição da coisa, ou seja, tendo sido entregue o apartamento em questão aos AA., que o foram habitar.
No decurso de tal uso os RR. constataram a existência de defeitos nesse imóvel, que identificam, no valor de Esc: 3.353.000$00.
De igual modo alegam que a escritura definitiva de compra e venda ainda não se realizou, apesar de terem interpelado a Ré para o fazer e que mantêm interesse no negócio celebrado.
Contestou e reconveio a Ré, contrapondo que a escritura relativa ao contrato definitivo não se realizou por culpa dos RR., sendo instados para tal, perdendo a autora interesse no negócio; negam a existência de defeitos, havendo apenas reparações a fazer decorrentes do desgaste referente ao uso da casa e ainda à sua má utilização.
Em reconvenção pedem a resolução do contrato promessa; em alternativa, a actualização do preço por terem decorrido 8 anos sobre a data da promessa de venda, bem como a sua condenação no pagamento de quantia em dinheiro, à razão diária de Esc: 50.000$00/dia pela ocupação da coisa a vender, desde 01.03.1994.
Na sua réplica os AA. rebatem os argumentos da R., mantendo a sua posição articulada na p.i..
Foi proferido despacho saneador, fixada a matéria assente e organizada a base instrutória que não sofreu reclamação.
Procedeu-se a julgamento e, a final, o Ex.mo Juiz proferiu sentença em que, julgando procedente a acção e improcedente a reconvenção, em consequência: - Condenou a Ré a reconhecer a redução do preço relativo ao contrato-promessa de compra e venda identificado no art.º 3º da petição à quantia de € 31.174,87 (trinta e um mil, cento e setenta e quatro euros e oitenta e sete cêntimos), pagando os AA. a quantia restante de € 26.186,89 (vinte e seis mil, cento e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos ), no prazo de trinta dias, a contar do trânsito em julgado desta decisão.
- Condenou a Ré na execução específica do referido contrato promessa identificado no art.º 3.º da petição e, consequentemente, suprindo a declaração negocial da ré, declarou celebrado um contrato de compra e venda do imóvel identificado no apontado art.º 3.º da p.i., de que a ré é titular, pelo preço de € 31.174,87, (trinta e um mil, cento e setenta e quatro euros e oitenta e sete cêntimos), transferindo-se assim para os AA. a propriedade do aludido imóvel, desde que paga à Ré a mencionada quantia restante de € 26.186,89 (vinte e seis mil, cento e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), no prazo de trinta dias, a contar do trânsito em julgado desta decisão.
- Absolveu os AA. dos pedidos contra si formulados pela Ré.
Inconformada com esta sentença dela recorreu a ré “I...-Imobiliária L.da”que alegou e concluiu do modo seguinte: I.
Constando dos autos elementos probatórios que impunham decisão da matéria de facto diferente da proferida pelo Tribunal recorrido deverá o Tribunal de Recurso alterar as respostas. Assim, deverá alterar-se a resposta aos quesitos 4° e 5° para não provado e as respostas aos quesitos 14°,15° e 21° para provado; II.
Tendo a Ré, ora recorrente, alegado na sua contestação factos susceptíveis de integrar a excepção de caducidade, ainda que não a tenha invocado expressamente, deverão tais factos ser incluídos na Base Instrutória e, não o tendo sido, deverá a mesma ser ampliada com tais factos para que se conheça da dita excepção; III.
A excepção de não cumprimento do contrato tem que ser invocada pelo contraente a quem aproveite, não podendo o Tribunal, oficiosamente, conhecer da mesma; IV.
A invocação de tal excepção é, todavia, e em todo o caso, incompatível com a notificação do outro contraente para comparecer à escritura de compra e venda do contrato prometido; V.
Tal excepção não pode ser invocada pelo contraente que se constituiu em mora; VI.
Incorre em mora o contraente que se recusa a celebrar a escritura de compra e venda ou que não comparece à escritura que previamente marcara; VII.
Enquanto não for celebrado o contrato prometido, ao promitente comprador não é reconhecida legitimidade para invocar a ocorrência de defeitos de construção e a disciplina dos artigos 916° e seguintes do Código Civil mas, apenas, as regras relativas ao cumprimento/incumprimento das obrigações; VIII.
Mesmo que se reconheça ao promitente/comprador tal legitimidade, está-lhe vedada a possibilidade de, sem mais, proceder à sua reparação, cabendo tal direito ao promitente vendedor; IX.
Inexistindo incumprimento por parte da promitente vendedora e/ou existindo incumprimento por parte dos promitentes/compradores, não podem estes pedir a execução específica do contrato promessa de compra e venda; X.
Estando os autores, promitentes compradores, na posse da fracção desde Dezembro de 1994 e tendo sido convencionado que o respectivo preço deveria ser pago no acto da escritura em caso de financiamento bancário a ser concedido no prazo de três meses ou, não sendo este concedido, no prazo de três anos, com juros e nada mais tendo sido pago até à presente data, constitui um manifesto abuso de direito pedir, decorridos cerca de doze anos desde a data da celebração do contrato, a redução do preço estabelecido, com fundamento em alegados defeitos de construção.
XI.
Tal invocação é intoleravelmente injusta e violadora dos princípios da boa fé e o seu acolhimento na douta sentença recorrida traduz-se num desequilíbrio das prestações, violando os princípios da liberdade contratual e da autonomia da vontade; XII.
Tendo os autores, promitentes/compradores, recusado a celebração da escritura de compra e venda da fracção prometida vender e tendo a ré, dado o tempo decorrido, perdido o interesse na conclusão do negócio prometido, pode, a mesma ré, resolver o contrato promessa, bastando para isso, a comunicação aos autores por carta registada com aviso de recepção; XIII.
Sendo reconhecido aos autores, promitentes/compradores, o direito à execução específica da promessa de compra e venda, a sentença recorrida pode, a requerimento do outro contraente, ordenar a modificação do contrato nos termos do artigo 437° do Código Civil; XIV.
Não constando dos autos todos os elementos necessários à fixação do valor da alteração do preço com recurso à equidade, deve o Tribunal remeter a sua fixação para execução de sentença.
XV.
A douta sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 830°, 437°, 410°, 808°, 813°, 405°, 914° e 916° do Código Civil e 660° e 661°, n.° 2 do Código de Processo Civil.
Termina pedindo que seja revogada a sentença recorrida e substituída por outra que decrete a improcedência da acção e a procedência da reconvenção.
Contra-alegaram os recorridos pedindo a manutenção do julgado.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
Estão assentes os factos seguintes: 1.
A Ré dedica-se, com regularidade, fins lucrativos e por conta própria construção civil e compra e venda de propriedades.
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A Ré adquire terrenos e depois de neles implantar as construções procede a sua adjudicação ou venda.
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Foi no exercício dessa actividade que, por documento escrito outorgado no dia 17 de Novembro de 1993, a Ré declarou prometer vender aos Autores que, por sua vez, declararam prometer comprar-lhe, livre de ónus, encargos ou obrigações, UM APARTAMENTO, TIPO T3, localizado no 4° andar, esquerdo, lado Norte (gaveto) e uma garagem individual na cave do mesmo prédio, inscrito na matriz sob o artigo 1022, fracção "M".
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O apartamento referido em 3. foi construído pela Ré.
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Na data referida em 3. o apartamento encontrava-se em construção, mais precisamente na fase de acabamentos.
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Concluído o apartamento, os Autores foram habitá-lo no mês de Dezembro de 1993.
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Quando os Autores celebraram o acordo referido em 3. e, posteriormente, o foram habitar, o referido apartamento não apresentava quaisquer defeitos.
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A escritura pública de compra e venda ainda não foi celebrada.
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Em 23 de Maio de 2000, por notificação judicial avulsa promovida pelos Autores, a Ré foi notificada para comparecer no dia 14 de Junho de 2000, pelas 11 horas, no Cartório Notarial de Amares a fim de outorgar a escritura de compra e venda e receber o preço de 5.000.000$00.
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No dia 14 de Junho de 2000 compareceu no Cartório Notarial de Amares o gerente da Ré para assinar a...
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