Acórdão nº 253/04-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Abril de 2004

Magistrado ResponsávelMANSO RA
Data da Resolução28 de Abril de 2004
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na secção cível da Relação de Guimarães: "A" e mulher, "B", intentaram, pelo tribunal da comarca de Ponte de Lima, acção com processo na forma ordinária contra "C", peticionando a condenação desta no pagamento da quantia de 20.000.000$00, acrescida de juros.

Alegaram para o efeito, em síntese, que são donos do prédio urbano que identificam. Tal prédio representava uma verdadeira residência de descanso durante qualquer fase do ano, localizada frente a verdejante vale, em sítio servido de excelente qualidade ambiental e de bela quadra paisagística. Acontece que a R., em execução de um lanço da auto-estrada Braga-Valença, veio a implantar junto à estrema poente do prédio dos AA. um viaduto. Por força da construção de tal viaduto e por força da circulação rodoviária que nele se processa, passaram os AA. a sentir cheiro a gasolina e gasóleo queimados, poeiras e fumos de escapes. A paisagem de que desfrutavam, está agora comprometida. A casa é atingida durante grande parte do ano pela sombra projectada pelo viaduto. O vento, ao passar pelo viaduto, torna-se ruidoso, impedindo o descanso de dia e de noite na casa dos AA.. O ruído dos veículos que passam pelo viaduto projecta-se sobre a casa dos AA., sendo intolerável. Se o viaduto não tivesse sido construído o prédio dos AA. valeria 40.000.000$00. Com o viaduto ali presente ao lado, o prédio não vale agora mais que metade desse valor. A R. é concessionária da construção e exploração da auto-estrada onde se insere o viaduto, pelo que está obrigada a indemnizar os AA. pelo prejuízo que sofrem.

Contestou a R., concluindo pela improcedência da acção.

A final foi proferida sentença que, em procedência parcial do pedido, condenou a R. a pagar aos AA. a quantia indemnizatória de 50.000,0 euros, acrescida de juros.

Inconformada com o assim decidido, interpôs a R. a presente apelação.

Da respectiva alegação extrai as seguintes conclusões: 1 - Após esclarecimentos sobre o seu relatório, em audiência de julgamento, os peritos "X" e "Y" afirmaram que fumos e cheiros teriam alguma afectação.

2 - Quanto ao som do vento quando passa pela estrutura do viaduto, dizem-nos que é de prever que haja algum, mas não é determinante 3 - Da prova testemunhal produzida pela ora recorrente, foi afirmado que a sombra projectada na casa em questão, realizando-se uma linha recta fictícia, tinha origem numa montanha a poente, onde o sol se põe, isto é, 4 - o sol desapareceria não por causa do viaduto, mas por causa dessa mesma montanha.

5 - As mesmas testemunhas, referiram ainda que o barulho da junta de dilatação, que dista da casa a cerca de 200 metros, não se houve no imóvel, 6 - e que sendo a A3 (sub-lanço de Braga para cima, em direcção a Ponte de Lima) uma auto-estrada com pouco movimento diário, o pouco movimento na circulação automóvel e por a casa estar num plano inferior do viaduto, a uma distancia entre os 10 a 20 metros, os cheiros e gases quentes, que sobem para a atmosfera, não chegam a afectar a casa dos autores.

7 - Ficou provado que os autores têm neste momento alguns "incómodos".

8 - e por outro lado, "(...) atentas as altas velocidades atingidas pelos veículos nas auto-estradas (e que raramente se limitam aos 120 km/h permitidos), o ruído chega à casa dos Autores, mesmo não tendo sido objecto de concreta medição, é de certeza suficientemente incomodativo para, ( ....), perturbar o descanso daqueles." - pág. 390 último parágrafo da douta sentença.

9 - Mas não ficou provado, nos presentes autos, que o trânsito dos mais variados veículos automóveis, ligeiros e/ou pesados que por ali passam diariamente, provoquem ruído que exceda os limites previstos no DL. 251/87 de 24/06, que regulamentou a Lei de Bases do Ambiente de 07/04, porque nenhuma perícia avalizada foi realizada com esse fim, conforme diz também a douta sentença ora recorrida.

10 - Lendo-se as Bases anexas ao DL 294/97 de 24 de Outubro, fácil é concluir que a responsabilidade da R. "C" será civil extracontratual subjectiva; 11 - Esta regula-se unicamente pelo princípio geral contido no art°. 483° do Código Civil, que estatui que aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrém ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação; 12 - . O mecanismo da responsabilidade civil em geral opera sempre da mesma forma; o facto (quer ilícito, quer proveniente duma actividade lícita) há-de ligar-se ao agente por um nexo de imputação (de natureza subjectiva ou objectiva, respectivamente) e o dano ou prejuízo que por seu turno há-de ligar-se ao facto por um nexo de causalidade (v. Dario Martins de Almeida, "Manual de Acidentes de Viação", 3ª edição, 1987, pág. 50); 13 - Só a verificação dos pressupostos anteriormente referidos faz marcar a obrigação de indemnizar, sendo aplicável o disposto no n°1 do artigo 487° do Código Civil - que dispõe incumbir ao lesado provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa; 14 - Os AA. deveriam ter alegado e demonstrado, o que não o fizeram, que os ruídos excediam os limites máximos previstos no D.L. 251/87 de 24/06, que regulamentou a Lei de Bases do Ambiente de 07/04, para que a douta Sentença, ora recorrida, pudesse vir a condenar, como o fez, a Ré "C"; 15 - Sem dúvida alguma que os direitos de personalidade, conforme art° 70 do C.C. e art° 66° n° 1 da C.R.P., gozam de protecção legal, mormente o direito ao repouso e a um ambiente sadio, sendo certo que a sua ofensa poderá dar lugar a indemnização, ou outro tipo de prestação de facto, a favor da pessoa ofendida, nos termos gerais da responsabilidade civil extracontratual - art° 70° e art° 483° n° 1, ambos do C.C. - definindo este último os pressupostos da obrigação de indemnizar; 16 - No que concerne à questão da ofensa aos direitos de repouso e a um ambiente sadio e, eventualmente, equilibrado, não se vislumbra que a conduta da Ré "C" tenha sido ilícita, tanto mais as estradas pertencem ao domínio público (art° 84° n° 1 al. d) C.R.), podendo a construção de auto-estradas ser objecto de concessão, atribuída a empresa constituída expressamente para esse fim (art° 15 n° 3 da Lei 10/90 de 17/03), e no caso em apreço, a construção da dita auto-estrada foi precedida de uma concessão à Ré "C" (D.L. n° 315/91 de 20 de Agosto), e por outro lado, 17 - Nos presentes autos, apenas se provou que o transito dos veículos automóveis que por ali passam diariamente, provocam ruído, não se tendo, no entanto, provado que o ruído provocado pela circulação motorizada, excedesse os limites previstos no D.L. 251/87 de 24/06, que regulamentou a Lei de Bases do Ambiente de 07/04.

18 - Não se provou, mais uma vez se frisa, que o barulho atingisse níveis de insuportabilidade, que pusessem em causa a saúde (física/psíquica) do A., ou dito de outro modo, que fosse ofendido o seu direito fundamental ao repouso e/ou a um ambiente sadio (relativo), como, 19 - Não é a produção de qualquer ruído que acarreta ilicitude.

20 - Sendo portanto de se entender que não é possível evitar ruídos, numa zona atravessada por uma auto-estrada, ter-se-ia de provar que os mesmos infringiam, excedessem os valores, os limites previstos no D.L. 251/87 de 24/06, que regulamentou a Lei de Bases do Ambiente de 07/04..

21 - Concluindo a douta Sentença do tribunal "a quo", ora recorrida, que condenou a Ré "C", violou art° 70° do C.C., e os art°s 483° n° 1 e 487° n° 1, ambos do C.P.C., e ainda, 14 - violou o D.L. 251/87 de 24/06, que regulamentou a Lei de Bases do Ambiente de 07/04, dado que não se provou que os limites de ruído estabelecidos tivessem sido ultrapassados.

15 - Finalmente, violou as Bases anexas do decreto-lei n° 294/97 de 24 de Outubro, nomeadamente, o n° 1 da Base XLIX, onde se estabelece que "Serão da inteira responsabilidade da concessionária todas as indemnizações que...

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