Acórdão nº 1613/06-1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Outubro de 2006

Data17 Outubro 2006

Processo n.º 1613/06-1 Acordam, em conferência, os Juizes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.

  1. Relatório: 1.

Nos autos de processo comum a correr termos no …Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial de …. o demandante A. … e a demandada B. … transigiram sobre o objecto do pedido de indemnização civil, nos termos que constam de fls. 280 dos autos.

*2.

Proferiu, então, em 22 de Março de 2006, a fls. 281/284, a M.ma Juíza sentença homologatória do acordo firmado e, relativamente às custas cíveis, teve o demandante e a demandada delas dispensados, ao abrigo da disposição vertida no art. 66.º, n.º 1, da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro.

*3.

Inconformado com o assim decidido quanto a custas, o Magistrado do Ministério Público interpôs recurso, formulando na respectiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): «1.ª - O despacho recorrido entendeu que, onde se lê no artigo 66.º, n.º 1 da Lei 60-A/2005 de 30/12, "acções cíveis" deve entender-se "instância cível", pelo que a transacção efectuada nos autos está abrangida pela dispensa de custas.

  1. - Contudo o mencionado artigo 66.º, n.º 1, é claro, fala apenas em acções cíveis declarativas ou executivas.

  2. - O artigo 9.º do Código Civil não permite ao intérprete que suponha que o legislador usa palavras ao acaso.

  3. - Lendo o artigo 66.º na sua totalidade, nada há que indique que o legislador pensou no pedido cível deduzido em processo penal, antes pelo contrário.

  4. - Por outro lado, no orçamento para 2000 (Lei n.º 3-B/2000, de 4/4/2000) existia uma norma semelhante a esta (e certamente esteve na base desta), o artigo 73.º, a qual falava em acções cíveis pendentes, bem como em pedidos de indemnização em processos de outra natureza.

  5. - Não se pode dizer que o legislador que elaborou o artigo 66.º da Lei 60-A/20005, de 30/12, desconhecia o disposto no art. 73.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4/4, antes pelo contrário (terá certamente sido inspirado por esta norma legal).

  6. - E sendo inspirado por esta norma legal, dela retirou a expressão "bem como aos pedidos de indemnização em processos de outra natureza".

  7. - Ou seja, o legislador deliberadamente optou por afastar desta disposição (art. 66.º, n.º 1) os pedidos de indemnização cíveis efectuados em processo penal.

  8. - E fez isso porque a extinção da instância cível em processo penal na maior parte das vezes não termina com o processo penal (no caso de crimes públicos nunca termina).

  9. - Assim as partes não estão dispensadas de pagar custas, nos termos do disposto no art. 66.º, n.º 1, da Lei 60-A/2000, de 30/12, pelo que o despacho de fls. 281 a 284 deve ser substituído por outro que condene as partes em custas, sendo as mesmas pagas a meio (art. 451.º, n.º 2, do C.P.Civil, uma vez que não houve acordo quanto a custas).

    11.º - Foi violado o artigo 66.º, n.º 1, da Lei 60-A/2005, de 30/12, e o artigo 451.º, n.º 2, do C.P.Civil».

    *4.

    Recebido o recurso e cumprido o disposto no art. 411.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, apenas a demandada B. … apresentou resposta, sintetizada nestes termos: «1.ª - O disposto no art. 66.º, n.º 1, da Lei 60-A/2005, de 30 de Dezembro, constitui um incentivo excepcional ao descongestionamento das pendências judiciais.

  10. - Não é aceitável defender que o legislador teve a intenção de reduzir as pendências judiciais nas acções cíveis e mantê-las nos pedidos cíveis enxertados nos processos crime, sabendo-se que muitos dos processos até terminam por desistência de queixa, após acordo quanto aos montantes indemnizatórios.

  11. - Ao ultrapassar uma visão ou leitura limitada e meramente literal do disposto no mencionado art. 66.º, n.º 1 e ao equiparar "acções cíveis" e "pedidos cíveis" para efeitos de isenção do pagamento de custas, o M.mo Juiz foi ao encontro do verdadeiro pensamento e objectivo do legislador, fazendo, assim, irrepreensível aplicação da lei.

  12. - Deve, pois, manter-se o douto despacho recorrido (...)».

    * 5.

    Subidos os autos a esta Relação, o Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto, em douto parecer, pronunciou-se no sentido de o recurso merecer provimento.

    Dele notificados, nos termos do que dispõe o art. 417.º, n.º 2, do CPP, o demandante e a demandada cíveis não exerceram o seu direito de resposta.

    *6.

    Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

    *II. Fundamentação: 1. Delimitação do objecto do recurso e poderes cognitivos do Tribunal ad quem: Conforme Jurisprudência uniforme nos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respectiva motivação que delimitam e fixam o objecto do recurso, sem prejuízo da apreciação das demais questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

    No caso sub-judice, a única questão submetida à apreciação deste Tribunal da Relação consiste em determinar se o regime previsivo do art. 66.º, n.º 1, da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, também abrange os pedidos de indemnização civil...

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