Acórdão nº 10792/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelRui Pereira
Data da Resolução10 de Maio de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 1º JUÍZO LIQUIDATÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO Octaviano ...

, Médico Especialista de Oftalmologia, Chefe de Serviços do Hospital Infante D. Pedro, de Aveiro, veio interpor RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO do despacho do Sr. Ministro da Saúde, datado de 24 de Julho de 2001, exarado no Parecer nº 239/01 - Processo nº 01/0166 -, que, em decisão de recurso hierárquico necessário interposto pelo recorrente, manteve a pena disciplinar de 30 dias de suspensão que lhe havia sido aplicada pelo Sr. Inspector-Geral da Saúde.

A entidade recorrida respondeu, pugnando pela manutenção do decidido.

Na respectiva alegação, o recorrente formulou as seguintes conclusões: "1ª - Não se deu cumprimento às diligências solicitadas pelo arguido; 2ª - Não se fundamentou, nem se lhe comunicou o motivo pelo qual tais diligências não foram levadas a efeito; 3ª - Está, pois, violado o artigo 42º do ED - o que constitui nulidade insuprível; 4ª - A "confissão" do arguido, extraída da alínea c) da sua 2ª conclusão nunca teve a dimensão que lhe foi atribuída, tanto mais que o que se "disse" e "escreveu", nem foi em público, nem foi de carácter ofensivo - tais qualificações são da responsabilidade da Administração e só a ela caberia tê-lo provado, o que não conseguiu; 5ª - O recorrente não cometeu qualquer infracção de natureza disciplinar - onde estão as provas? E a contraprova?; 6ª - A haver qualquer falta mínima, estão reunidos os requisitos legais não só para a diminuição da pena a aplicar, mas, e sobretudo, para a sua suspensão - Cfr. artigos 33º e do ED, conjugados com o artigo 50º do Código Penal".

A entidade recorrida contra-alegou, concluindo pelo improvimento do recurso.

O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste TCA Sul emitiu parecer a fls. 64/65, no qual conclui nos seguintes termos: "[…] 2. A meu ver, sendo o pedido ilegal, deverá ser rejeitado ou improceder.

Desde logo, estamos em sede de recurso contencioso de mera legalidade e de anulação - artigo 6º do ETAF - e não de plena jurisdição: assim sendo, embora imperfeito o pedido na petição de recurso, poderia ser aperfeiçoado - de acordo com os artigos 36º, nº 1 e 40º, nº 1 da LPTA - era aceitável por razões de celeridade, eficácia e de economia processual; todavia, em sede de alegações - visto o disposto nos artigos 690º do CPCivil, aplicável "ex vi" do artigo 67º, § único do RSTA -, não é viável convite ao aperfeiçoamento designadamente perante as conclusões e o pedido que aqui foram apresentados, tanto mais que o recorrente abandonou nas alegações as pretensas ilegalidades que invocara na petição e nestas introduziu uma nulidade, o que lhe era vedado pelo princípio da estabilidade da instância.

Estando o julgador sujeito aos princípios do dispositivo e da legalidade estritos, não deverá conhecer do pedido, porque ilegal, de mandar "arquivar os presentes autos".

Mesmo havendo que conhecer de fundo, sempre improcederia o recurso, porque sendo a intervenção do tribunal reservada aos casos de erro grosseiro, isto é, àquelas contingências em que se verifica uma notória injustiça ou uma desproporção manifesta entre a sanção infligida e a falta cometida, não havia sequer lugar a sindicar judicialmente o acto recorrido, tanto mais que não foram sequer alegadas tais excepcionais irregularidades ou erros notórios de apreciação - cfr. o Acórdão do STA, de 4-3-97, Recurso nº 37.332.

No mesmo sentido, por exemplo, o Acórdão do STA, de 9-10-97, Recurso nº 40.274: "Assim a decisão punitiva só pode ser judicialmente controlada, neste aspecto, nos termos em que o é o exercício do poder discricionário, designadamente por erro nos pressupostos de facto, desvio de poder ou violação dos limites internos do poder discricionário [princípio da proporcionalidade, necessidade e adequação]." O Acórdão do STA, de 22-10-98, Recurso nº 42.159, também ensina: "V - Em sede das penas disciplinares o princípio da proporcionalidade postula a adequação da pena imposta à gravidade dos factos apurados. VII - A medida punitiva a aplicar deverá, assim, ser aquela que, sendo idónea aos fins a atingir se apresente como menos gravosa para o arguido. VIII - Pode, a este propósito, falar-se do princípio da intervenção mínima, necessariamente ligado ao princípio do "favor libertatis" que deve levar a Administração a escolher, de entre as medidas que satisfaçam igualmente o interesse público, a que se configure como menos lesiva." "Há erro grosseiro ou palmar na fixação da pena disciplinar quando esta é manifestamente injusta ou manifestamente desproporcionada, pelo que, em tais casos, a Administração infringe os princípios constitucionais a que está vinculada da justiça e da proporcionalidade, nos termos do nº 2 do artigo 266º da Constituição da República", como decidiu o Acórdão do STA, Pleno, de 23-6-98, Recurso nº 40.332.

De resto, tendo o arguido do processo disciplinar, ora recorrente, confessado os factos que a acusação lhe imputou, sendo certo que abandonou a substância da petição e acrescentou ilegitimamente as alegações, não padece mais de incoerência que de falta de fundamentos para o demandado, estando desde sempre na posse de todos os elementos que lhe permitiam impugnar o acto; não pode deixar de se concordar com a posição da autoridade recorrida, quanto à impertinência ou desnecessidade das diligências e à aplicação do disposto no artigo 61º, nº 3 do ED, para afastar a pretensa nulidade do artigo 42º do mesmo ED. Como constitui Jurisprudência pacífica e se decidiu, por exemplo, no Acórdão do STA, de 20-5-99, Recurso nº 43.588, "A arguição dos vícios do acto impugnado deve ser feita na petição de recurso [artigo 36º, nº 1, alínea d) da LPTA], só podendo atender-se a arguição de novos vícios na alegação final em caso de conhecimento superveniente à interposição do recurso, salvo se forem de conhecimento oficioso".

3. Em conclusão, sendo formulado pedido ilegal, qual seja o de arquivamento do processo disciplinar, deverá ser rejeitado o recurso ou improceder, segundo o meu parecer".

Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a apreciação do mérito do presente recurso contencioso, consideram-se assentes os seguintes factos: i.

    O recorrente é chefe do serviço de oftalmologia do Hospital Infante D. Pedro, de Aveiro.

    ii.

    Na sequência de proposta nesse sentido formulada no Processo de Averiguações nº 32/98, foi, por despacho do Inspector-Geral da Saúde, datado de 28-6-99, determinada a instauração de procedimento disciplinar contra o recorrente [cfr. fls. 1 do processo instrutor apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].

    iii.

    Com data de 29-2-2000, foi deduzida acusação contra o recorrente, pela prática dos seguintes factos:"1º O arguido é funcionário público e tem vindo a desempenhar as suas funções no Serviço de Oftalmologia do Hospital Distrital de Aveiro, com a categoria de chefe de serviço.

    1. No dia 31 de Maio de 1999, o arguido observou no Hospital Distrital de Aveiro, na consulta externa de oftalmologia, o utente Francisco Renato Ferreira Arrais, o qual, por ser diabético, tinha sido submetido no citado Hospital a quatro sessões de laserterapia, três ministradas pelo Dr. Mário ..., e uma pelo Dr. Leonel ....

    2. Durante a consulta o arguido, que nunca antes tinha observado o mencionado utente, referindo-se aos médicos do Hospital Distrital de Aveiro que lhe haviam ministrado as laserterapias, proferiu a seguinte expressão: "São como crianças, quando têm um aparelho novo gostam de brincar com ele".

    3. Depois, reportando-se à forma como aqueles médicos efectuaram os disparos laser disse ao utente: "É como um caçador mandar dois disparos para uma árvore coberta de folhas sem ver os pássaros".

    4. Ainda no decorrer da consulta disse o arguido ao utente: "Lá vem ele mais uma vez, anda a ver se descobre mais alguma coisa", referindo-se à passagem pelo local de um enfermeiro que encaminhava os utentes para as consultas.

    5. Em 14 de Janeiro de 1999, o Conselho de Administração do HIDP decidiu alterar a modalidade da prestação do serviço de urgência a efectuar pelo arguido, alteração esta com efeitos a partir de Fevereiro de 1999.

    6. Devendo este, segundo a aludida decisão, efectuar o serviço de urgência não no regime de prevenção, mas no regime de presença física.

    7. O arguido foi formalmente notificado da referida decisão do Conselho de Administração do Hospital Distrital de Aveiro, em 20 de Maio de 1999.

    8. Todavia, este não cumpriu esta determinação, continuando, após o dia 20-5-99, a efectuar os serviços de urgência para que foi escalado, não no regime de presença física, mas no regime de prevenção.

    9. Assim, o arguido estando escalado para efectuar serviço de urgência em presença física, das 14 horas às 2 horas do dia seguinte, nos dias 26-5-99, 2-6-99, 9-6-99, 16-6-99, 23-6-99 e 30-6-99; das 14 horas às 20 horas, nos dias 21-7-99, 28-7-99, 4-8-99, 11-8-99, 18-8-99 e 25-8-99; e por fim, das 8 horas às 20 horas, nos dias 1-9-99, 8-9-99, 15-9-99, 13-10-99, 27-10-99, 3-11-99, 10-11-99, 17-11-99, 24-11-99 e 1-12-99,11º Não esteve em presença física no Serviço de Urgência do Hospital Distrital de Aveiro durante nenhum desses períodos.

    10. Tendo indicado nas folhas de ponto do Serviço de Urgência referentes aos dias citados no artigo 20º que cumpria o horário não no regime de presença física, conforme constava das referidas folhas, mas no regime de prevenção.

    11. Só não fazendo esta indicação nas folhas de ponto respeitantes aos dias 24-11-99 e 1-12-99.

    12. Com a conduta referida nos artigos 2º a 5º o arguido violou os deveres gerais de zelo e correcção previstos, respectivamente, nas alíneas b) e f) do nº 4 e nºs 6 e 10 do artigo 3º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro;15º Praticando, assim, infracção disciplinar punível, nos termos do artigo...

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