Acórdão nº 03508/00 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelEUGÉNIO SEQUEIRA
Data da Resolução05 de Dezembro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. G... - Gestão Imobiliária, Lda, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com o despacho do Sr. Ministro das Finanças de 12.1.2000 que ratificou o despacho do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de 27.4.1999, veio dele interpor recurso contencioso de anulação para este TCAS.

    Depois de notificada para o efeito veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais na íntegra se reproduzem: a) Com a douta resposta do Senhor Ministro das Finanças, que mais não é que um breve resumo do relatório do Senhor Perito de Fiscalização Manuel Valente, nada se alterou na postura autista desde o início adoptada pela Administração Fiscal.

    1. O artigo 57.º do CIRC é uma das mais complexas e controversas normas do actual ordenamento tributário pelo que, se não for inconstitucional a sua aplicação não pode andar dissociada de um cuidadoso esforço jurídico de interpretação dos respectivos pressupostos.

    2. A Administração Fiscal, corrigiu o lucro fiscal da Recorrente ao abrigo da referida norma sem ter tido o cuidado de definir os seus pressupostos de aplicação e sem que tenha alegado e provado os factos de que depende a sua aplicação.

    3. Esta manifesta insuficiência de fundamentos para a correcção efectuada, levou a Recorrente a apresentar um recurso hierárquico nos termos - do artigo 112.º do CIRC na expectativa de que o seu caso seria resolvido pela mais alta hierárquia da Administração Fiscal.

    4. Sucede que o recurso foi parcialmente indeferido por despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, ao tempo entidade legalmente incompetente "para o efeito, sem que tenham sido rebatidos os argumentos de fundo deduzidos peta Recorrente no Recurso Hierárquico apresentado, e daí que tenha sido apresentado desse acto do SEAF um recurso contencioso de anulação que corre os seus termos na 2.ª Secção do TCA com o n.º 2647/99.

    5. Na pendência do recurso contencioso de anulação desse despacho do SEAF, a Recorrente foi, em 20.01.20001 notificada do despacho do Ministro das Finanças, de 12.01.2000, pelo qual aquela autoridade veio ratificar o aludido despacho do SEAF de 27.04.99, constituindo esse acto do Ministro o objecto do presente recurso.

    6. O Acto de delegação de competência é um acto de natureza pessoal intuitu personae pelo que, de acordo com a ordem natural das coisas, tendo mudado as pessoas, i.e. delegante e delegado, torna-se impossível, do ponto de vista jurídico qualquer ulterior ratificação.

    7. O acto recorrido apresenta-se com uma dupla natureza: quer como acto de ratificação destinado a sanar as ilegalidades do despacho do SEAF de 27.04.99; quer como acto decisório do recurso hierárquico através da assunção do conteúdo desse mesmo despacho.

    8. A referida dupla natureza do acto recorrido assenta numa relação de dependência entre aqueles dois efeitos.

    9. Com efeito, o acto recorrido só assume a função decisória do recurso hierárquico por absorção do conteúdo integral do acto primário na medida em que a sanação operada sobre o acto primário produza os seus efeitos típicos, nomeadamente a substituição deste na ordem jurídica.

    10. O acto recorrido enquanto acto dirigido à sanação do despacho do SEAF de 21.04.99 está inquinado de vícios próprios determinante da sua anulabilidade e consequente repristinação daquele despacho - ilegalmente - ratificado, e daí que o presente recurso contencioso vise a título principal a anulação do acto recorrido na parte em que se dirige à ratificação do acto do SEAF de 21.04.99.

    11. Subsidiariamente, o acto recorrido deverá ser anulado na parte em que assume o conteúdo decisório do acto ratificado - o despacho do SEAF de 27-04.99 - de indeferimento parcial do recurso hierárquico apresentado pela Recorrente.

    12. Enquanto acto dirigido à ratificação do acto do SEAF o acto recorrido pretende assumir-se como um acto de ratificação-sanação n) Ora, prescreve o art. 137º, n.º 3, do CPA - aplicável subsidiariamente ao procedimento tributário por força do art. 2º, n.º6, do mesmo Código - que "em caso de incompetência, o poder de ratificar o acto cabe ao órgão competente para a sua prática".

    13. Ora, no momento da prática do acto recorrido - 12.01.2000 - o actual Ministro das Finanças - a ora Autoridade Recorrida- não tinha competência para ratificar o despacho do SEAF de 27.04.99 porquanto, consubstanciando o despacho do SEAF de 27.04.99 uma decisão de um recurso hierárquico interposto pela Recorrente ao abrigo do art. 112º, n.º 2, do CIRC, só o órgão competente para a decisão dos recursos hierárquicos previstos nesse artigo é que podia ratificar aquele acto.

    14. Ora, se bem que de acordo com o art. 112º, n.º 2, do CIRC, o Ministro das Finanças seja o órgão competente para a decisão dos recursos hierárquicos aí previstos, o C...to é que através do Despacho n.º 24.264/99, de 23.11.99, publicado no DR, II Série, de 10.12.99, o Ministro das Finanças havia delegado a competência para decidir os recursos hierárquicos - mesmo os previstos no artigo 112.º - na pessoa do novo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

    15. Com efeito, constando do ponto 1.2. deste despacho recente que é delegado no SEAF o poder "(...) de decisão dos assuntos no âmbito da DGCI (...)" e sendo esse o serviço do Ministério das Finanças que tem por missão administrar os impostos sobre o rendimento como é o caso do IRC não restam dúvidas de que a decisão dos recursos hierárquicos interpostos em sede do art. 112º do Código do IRC foi matéria objecto de delegação no secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

    16. Tal conclusão resulta também do Despacho n.º 24.840/99, de 24.11.99, publicado no DR, II Série, de 17. 12.99, pelo qual o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais subdelegou no Director-Geral dos Impostos o poder para a apreciar e decidir os recursos hierárquicos previstos nos artigos 91.º e 100.º do Código do Procedimento Tributário, com excepção dos previstos nos artigos 112.º do Código do IRC e 132.º do Código do IRS.

    17. Resulta do exposto que à data da prática do acto recorrido - 12.01.2000 - o órgão competente para a decisão dos recursos hierárquicos previstos no art. 112º do CIRC era o actual Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e não o Ministro recorrido.

    18. Ora, de acordo com o disposto no artigo 137.º do CPA era, pois, o novo SEAF e não o Ministro quem detinha competência para ratificar o despacho ilegalmente proferido pelo SEAF de 27.04.99.

    19. Só mediante um acto prévio de avocação do caso da Recorrente é que o Ministro das Finanças poderia retomar o exercício da competência para posteriormente poder proceder à ratificação do despacho do SEAF de 27.04.99 (Cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO COSTA GONÇALVES/PACHECO DE AMORIM, em comentário ao art. 39º, n.º 2, do seu Código do Procedimento Administrativo - Comentado - 2ª edição, p. 230).

    20. Em cada momento há um único órgão competente - antes da delegação, só o potencial delegante é competente; praticada a delegação, só o delegado pode exerC... os poderes delegados; decidida a avocação, de novo só o delegante pode resolver o caso avocado (Cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. I, 2ª edição, p. 672).

    21. Assim, não tendo o Ministro das Finanças chamado a si a resolução do caso concreto da Recorrente através de um acto de avocação legalmente exigido, era o mesmo incompetente para poder proceder tout court à ratificação do despacho do anterior SEAF de 27.04.99, pelo que o acto recorrido sofre assim de vício de incompetência relativa, determinante da sua anulabilidade.

    22. Por outro lado, inserindo-se a prática do acto de ratificação-sanação num determinado procedimento, neste caso num procedimento tributário, a sua formação devia ter respeitado formalidades essenciais, o que não sucedeu no caso.

    23. Com efeito, sendo o acto recorrido totalmente omisso quanto às razões de facto e de direito que motivaram a decisão da Autoridade Recorrida de proceder à ratificação do despacho do SEAF de 27.04.99, sendo C...to que a ratificação se dirige à sanação dos vícios do acto primário, e tendo a Recorrente suscitado no recurso contencioso de anulação do despacho do anterior SEAF diversos vícios de que este padecia, torna-se impossível de compreender o alcance do acto recorrido e quais tenham sido, em concreto, os vícios do acto primário que foram objecto da ratificação, o que consubstancia um vício de forma de falta de fundamentação determinante da anulação do acto recorrido.

    24. Por outro lado, ainda, o acto recorrido ao proceder à ratificação-sanação do acto primário - o despacho do SEAF - operou uma verdadeira revogação substitutiva desse acto, passando a representar a decisão final da administração quanto à resposta ao recurso hierárquico apresentado pela Recorrente pelo que a Autoridade Recorrida antes de praticar o acto recorrido deveria ter ouvido a Recorrente ao abrigo do disposto no artigo 60.º da LGT.

    aa) Se o tivesse feito, a Recorrente teria informado "que o imóvel que motivou todo este processo foi vendido em hasta pública em 1999 por um milhão e quarenta e três mil contos, valor que devidamente reportado a 1994 não anda distanciado do valor da avaliação que havia sido junta pela Recorrente no âmbito do recurso hierárquico decidido pelo SEAF.

    bb) caso se julguem improcedentes os vícios supra alegados e se considere válida a ratificação operada pelo acto recorrido sempre o acto deverá ser anulado na parte em que absorveu o conteúdo do despacho do SEAF de 27.04.99 de indeferimento parcial do recurso hierárquico apresentado pela Recorrente peta motivação seguinte: cc) Em primeiro lugar, e ainda sem se entrar no fundo da questão, o acto recorrido violou frontalmente o disposto no artigo 6O.º da Lei Geral Tributária na medida em que foi negada à Recorrente a possibilidade de se pronunciar sobre o projecto de decisão de indeferimento.

    dd) Como fundamento foi invocado que a mesma não carreou...

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