Acórdão nº 00246/06.8BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Março de 2007

Data15 Março 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do TCAN: I- RELATÓRIO MUNICÍPIO DE CARRAZEDA DE ANSIÃES, inconformado com a sentença do TAF de Braga, datada de 09.NOV.06, que julgou improcedente o pedido de adopção de PROVIDÊNCIAS CAUTELARES, oportunamente por si deduzido, contra o MINISTÉRIO DA SAÚDE, com sede na Av. João Crisóstomo, 9-6º, Lisboa, consistente na suspensão de eficácia do despacho do Ministro da Saúde, proferido em 28 de Agosto de 2006, nos termos do qual foi determinado o encerramento da Sala de partos da Unidade Hospitalar de Mirandela e a consequente concentração dos mesmos na Unidade Hospitalar de Bragança, recorreu para o TCAN, formulando as seguintes conclusões: 1 - Baseia-se o presente recurso no facto de a douta sentença recorrida ter decidido recusar a adopção da providência cautelar requerida.

2 – O recorrente havia requerido a suspensão da eficácia despacho do Ministro da Saúde, proferido em 28 de Agosto de 2006, pelo qual determinou a concentração dos partos realizados na Unidade Hospitalar de Mirandela na Unidade Hospitalar de Bragança, com consequente encerramento do bloco de partos da Unidade Hospitalar de Mirandela.

3 – O recorrente não se conforma com a selecção e decisão da matéria de facto, que consta da fundamentação da sentença recorrida.

4 – Nos termos da qual apenas foram considerados relevantes e com interesse para a boa decisão os factos constantes em 1 e 2 do ponto II, e que se reportam à prolação de dois despacho ministeriais.

5 - Na decisão recorrida não se seleccionou de forma adequada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, remetendo-se à “inexistência” (porque, nem foram dados como provados, nem como não provados) pontos de facto de indiscutível interesse para uma boa decisão.

6 – Foram, desta forma, incorrectamente julgados, pelo menos, os pontos de factos constantes do requerimento inicial sob os n.º(s) 12.º, 13.º, 19.º a 22.º, 24.º a 26.º, 28.º a 44.º, 48.º a 57.º, 59.º a 93.º, 98.º a 100.º, 107.º a 111.º, matéria alegada pelo requerente, que se afigura imprescindível para a boa decisão da causa e se impunha fosse seleccionada como tal.

7 – O que determina se impugne a decisão sobre tal matéria de facto, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 690.º do Código de Processo Civil.

Sem prescindir, 8 – A sentença recorrida violou o disposto no artigo 120.º n.º 1 alínea b) do C.P.T.A. ao concluir pela não verificação do “periculum in mora”, porquanto não estarem alegados factos integradores de prejuízos de difícil reparação ou receio de situação de facto consumado.

9 – No requerimento inicial foi alegada factualidade, que, a dar-se como provada, preenche o requisito do periculum in mora, ou seja encontram-se elencados prejuízos de difícil (senão impossível) reparação, bem como concretizado o receio de situação de facto consumada, no tocante aos interesses que o ora recorrente pretende ver reconhecidos no processo principal.

10 – A não adopção da providência requerida, tem consequências que se traduzem num maior desconforto e incómodo para as parturientes, mas também o aumento do risco obstétrico, podendo causar lesões irreversíveis na integridade física das parturientes e dos seus filhos.

11 – Prejuízos que advêm da falta de condições de segurança e qualidade da sala de partos da Unidade Hospitalar de Bragança e da maior distância que as parturientes têm que percorrer para acederem a tal maternidade.

12 – Por outro lado, para além da existência de danos decorrentes da não suspensão da eficácia do despacho ministerial, não subsiste qualquer razão - a não ser política -, que sustente que decorra grave lesão do interesse público do diferimento da execução do despacho que determinou o encerramento do bloco de partos da Unidade Hospitalar de Mirandela.

13 - Na verdade tal lesão grave e irreversível resulta, como se encontra demonstrado nos autos, da execução do despacho suspendendo.

14 - A douta decisão recorrida faz, nos termos expostos, incorrecta interpretação e aplicação do disposto nos n.º(s) 1 e 2 do artigo 120.º do C.P.T.A., .

15 – Violando igualmente tal sentença o disposto no artigo 659.º n.º(s) 1, 2 e 3 do Código de Processo Civil.

16 – Por constarem do processo os elementos que, só por si, implicam necessariamente decisão diversa da proferida, e na hipótese de os mesmos não terem sido considerados, por lapso, desde já se requer a reforma da sentença.

A não se proceder a tal reforma, 17 – Deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra, que adopte a providência requerida, determinando a suspensão da eficácia do despacho Ministerial, proferido em 28 de Agosto de 2006, e que determinou o encerramento do bloco de partos da Unidade Hospitalar de Mirandela e encaminhamento das parturientes para a Unidade Hospitalar de Bragança.

18 – Para a hipótese de se entender necessária a produção de prova, deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra, que determine se proceda à realização das diligências de prova requeridas.

O Recorrido contra-alegou, tendo, por seu lado, formulado as seguintes conclusões: A. A douta sentença em recurso fez uma correcta aplicação e interpretação do direito.

B. O Despacho suspendendo não é ilegal, pelo que não é evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal não podendo, por conseguinte, ser decretada a providência cautelar.

C. O Recorrente também não logrou demonstrar os requisitos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.

D. Não existe a possibilidade de se constituir um facto consumado irreversível com o encerramento da sala de partos da Unidade Hospitalar de Mirandela.

E. O encerramento da sala de partos da Unidade Hospitalar de Mirandela não constitui um prejuízo de difícil reparação – antes se traduz num benefício para a saúde das parturientes e dos recém-nascidos.

F. A selecção e decisão da matéria de facto foram correctamente integradas na douta sentença recorrida.

G. O Meritíssimo Juiz a quo elencou os factos que reputou relevantes e enunciou-os na douta sentença, fazendo adequada aplicação dos poderes conferidos pelo artigo n.º 118º do CPTA.

H. Os factos dados como provados são insuficientes para a verificação do requisito do periculum in mora.

  1. Na sentença recorrida, o Meritíssimo Juiz isolou adequadamente os critérios de decisão do artigo 120º do CPTA, ao referir que “os requisitos enunciados para a concessão da providência são sequenciais e cumulativos, pelo que a não verificação de um prejudica a análise dos restantes.” O Dignº Procurador-Geral Adjunto emitiu pronúncia, no sentido da procedência do recurso.

Com dispensa de vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Administrativo para julgamento do recurso.

*II- QUESTÕES A DECIDIR NO RECURSO a) A invocada nulidade da sentença decorrente quer da falta de pronúncia sobre a matéria alegada sob os artºs 12.º, 13.º, 19.º a 22.º, 24.º a 26.º, 28.º a 44.º, 48.º a 57.º, 59.º a 93.º, 98.º a 100.º e 107.º a 111.º do requerimento inicial quer da falta de especificação dessa matéria, por forma a integrar a fundamentação fáctica da sentença; e b) O alegado erro de julgamento na apreciação dos pressupostos ou requisitos da providência cautelar requerida.

*III- FUNDAMENTAÇÃO III-1.

Matéria de facto A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos: 1. Com data de 14/03/2006, o Senhor Ministro da Saúde, proferiu o Despacho nº 7495/2006 (2ª série), publicado no Diário da República, II Série, n.º 67, de 04/04/2006 (que em parte se transcreve): «I – A Comissão Nacional da Saúde Materna e Neonatal entregou ao Ministro da Saúde, no passado dia 10 de Março, o relatório sobre a organização perinatal nacional, no qual se insere o Programa Nacional de Saúde Materna e Neonatal, e a proposta de requalificação dos serviços de urgência perinatal. Os documentos, de elevado valor técnico, evidenciam o enorme progresso realizado em Portugal desde que foi lançado, em 1989, o Programa Nacional de Saúde Materno-Infantil. O Programa criou uma rede de referência materno-infantil, que neste momento protege 80% dos recém-nascidos portugueses e permitiu um considerável progresso na saúde da mãe e do recém-nascido. Portugal passou de um país atrasado da Europa em indicadores de saúde materno-infantil para uma colocação entre os 10 países da União Europeia com melhores indicadores de mortalidade materna, mortalidade infantil e mortalidade perinatal.

II – O sucesso deste Programa deveu-se a um conjunto de factores de natureza social, económica e cultural, mas sobretudo á melhoria da organização dos cuidados prestados à mãe e à criança na altura do parto. Está hoje bem definido o conjunto de meios técnicos para que o parto decorra em condições de total segurança: equipas de assistência compostas por obstetras, anestesistas, pediatra-neonatologista e enfermeiras, equipamento técnico mínimo que permita acompanhar a vida fetal antes do parto e reanimar o recém-nascido, bem como o apoio permanente de serviço de sangue, de imagiologia, de laboratório e de cirurgia. A experiência nacional demonstra que estes requisitos apenas se conjugam, por óbvias razões de efectividade e eficiência, em serviços que garantam uma actividade de cerca de 1500 partos/ano.

III – De entre os 50 hospitais e maternidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS) onde hoje se processam partos, apenas 27 acumulam as condições técnicas exigidas com ritmo de trabalho que mantenha a actualização e adestramento do respectivo pessoal. De entre os 23 locais onde o número de partos ocorridos é inferior a 1500/ano, 15 encontram-se abaixo de 1200 partos/ano, 12 abaixo dos 1000 partos/ano e 5 abaixo de 500 partos/ano.

IV – Impõe-se, assim, uma política de concentração de locais de parto por razões de segurança da mãe e da criança. Uma perda de vida materna, por motivos de parto, é um acontecimento dramático para as famílias e que mancha a credibilidade do SNS. A perda actual de cerca de 12 vidas anuais de recém-nascidos por...

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