Acórdão nº 0643175 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Março de 2007
Magistrado Responsável | DIAS CABRAL |
Data da Resolução | 28 de Março de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam em audiência no Tribunal da Relação do Porto.
No .º Juízo Criminal do Porto foram submetidos a julgamento, em processo comum singular, B………., C………., e "D………., Lda.", todos devidamente identificados nos autos, tendo, a final, além do mais, sido decidido: 1º Absolver o arguido C………, da prática do crime de que vinha acusado e do pedido de indemnização civil formulado; 2º Condenar o arguido B………., como autor material de um crime de abuso de confiança em relação à segurança social, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 9.º, n.º 2, 27.º - B e 24º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, na redacção que a este diploma foi aportada pelos Decretos-Lei n.º 394/93, de 4 de Novembro e 140/95, de 14 de Junho, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de 75,00 €; 3º Condenar a arguida D………., Lda., como autora material de um crime de abuso de confiança em relação à segurança social, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 9.º, n.º 2, 27.º - B e 24.º, n.º 1 do Decreto Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, na redacção que a este diploma foi aportada pelos Decreto Lei n.º 394/93, de 4 de Novembro e 140/95, de 14 de Junho, na pena de 300 (trezentos) dias de multa à taxa diária de 25,00 €; 4º Suspender a execução das penas de multa aplicadas aos arguidos B………. e D………., Lda, pelo período de 3 anos, condicionada ao pagamento à Segurança Social do montante ainda em dívida e respectivos acréscimos legais, num prazo de dois anos; 5º Julgar o pedido de indemnização cível deduzido pelo INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL procedente por parcialmente provado, e em consequência, condenar os arguidos B………. e D………., Lda. a pagarem ao demandante a quantia de 13.249,59 €, bem como os juros de mora vencidos sobre o capital em dívida, contados sobre as datas de vencimento das contribuições e que à data da entrada do pedido cível ascendiam a 8.253,40 €, acrescida ainda de juros de mora vincendos à taxa legal, até efectivo pagamento.
Da sentença interpôs recurso o arguido B………. motivado com as conclusões que se transcrevem: 1º O Tribunal a quo errou na apreciação da prova.
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Dos depoimentos prestados pelas testemunhas E………., F………. e G………., bem como das declarações do arguido, devidamente gravados, resulta provado que não houve qualquer propósito previamente delineado pelo arguido.
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Antes resulta que tudo se ficou a dever às sérias dificuldades económicas com que a sociedade se deparou.
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Da prova referida resulta também claro, contrariamente ao que entendeu o Tribunal recorrido, que era impossível para a sociedade suportar os salários se entregasse os montantes deduzidos à Segurança Social.
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O Tribunal recorrido interpretou o artigo 27°-B do Regime Jurídico das Infracções não Aduaneiras no sentido de que é indiferente o motivo pelo qual não foram entregues à Segurança Social os descontos efectuados no salário dos trabalhadores.
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Ora, ao proceder desta forma reduziu o conceito de "apropriação" à mera não entrega.
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O que não é de todo consentâneo com o entendimento que deve ser dado ao referido preceito.
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Tal como a maioria da doutrina sustenta para que haja apropriação tem que haver uma manifestação de vontade do agente de haver a coisa para si.
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Animus que não se verifica sempre que há vontade de restituir.
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Ora, no caso em apreço, o Tribunal recorrido deu como provada a vontade de restituição.
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Logo, não se encontra preenchido o requisito "apropriação" exigido pelo artigo 27°-B, pelo que o comportamento do arguido não integra o tipo.
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Se assim se não entender estaremos a desrespeitar a Constituição.
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Desrespeito que se traduz no facto de se estar a enquadrar o mesmo facto simultaneamente num ilícito penal e num ilícito contra-ordenacional.
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O que significa punir criminalmente um comportamento que, por não ter dignidade penal, não carece desta tutela.
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O que significa punir criminalmente a mera mora e aqui, como Costa Andrade, «Onde fica a igualdade, a proporcionalidade e, mais radical, aquela "superioridade ética" do Estado sem a qual não faz sentido falar de Estado de Direito?».
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Impõe-se, por isso, a absolvição do arguido.
Sem prescindir, 17º Provou-se que o arguido vive da ajuda de familiares e não aufere qualquer rendimento.
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Pelo que um quantitativo diário de multa de €75,00 mostra-se completamente desadequado à situação económico-financeira do arguido que é de grande precariedade.
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Face à sua situação, uma pequena multa será já dotada de eficácia penal.
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Deve o quantitativo de multa ser fixado no mínimo legal.
* * *Respondeu o Mº Pº defendendo o provimento parcial do recurso.
O Exmº Procurador Geral Adjunto concordou com aquela resposta embora depois refira "razão por que entendo que o recurso não merece provimento".
Cumprido o nº 2 do artº 417º do CPP respondeu o arguido mantendo a posição assumida na motivação de recurso e salientando a contradição do lapso do Exmº Procurador Geral Adjunto.
Considerando que o recorrente impugnava a decisão de facto foi ordenada a remessa dos autos à 1ª instância para ser efectuada a transcrição da prova oralmente produzida em audiência de julgamento, gravada em fita magnética.
Como não foi pago o preparo para despesas, conforme o disposto no artº 89º, nº 2 do CCJ, foi proferido despacho, transitado em julgado, em que foi decidido não haver lugar à transcrição (artº 45º, nº 1, e) do CCJ).
* * * Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, foi adiada sine die a prolação da decisão face às alterações introduzidas no artº 105º do RGIT (Lei nº 15/2001, de 5/6) pelo artº 95º da Lei nº 53-A/2006, de 29/12.
Cumpre decidir.
Face à referida alteração o nº 4 do artº 105º do RGIT passou a ter a seguinte redacção: «Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se: a) Tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal de entrega da prestação; b) A prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito».
Ao texto existente na redacção anterior, com a nova redacção, foi-lhe aditado o constante naquela al. b).
Não é diferente o fim, nem são diferentes os efeitos, deste novo preceito e os do n.º 6 do mesmo artigo. Aí se dispõe que «[s]e o valor da prestação a que se referem os números anteriores não exceder € 2 000 (o valor anterior à Lei 60-A/2005 era 1000,00 euros), a responsabilidade criminal extingue-se pelo pagamento da prestação, juros respectivos e valor mínimo da coima aplicável pela falta de entrega da prestação no prazo legal, até 30 dias após a notificação para o efeito pela administração tributária».
Também nesse nº 6, que se mantém, o Estado visa evitar a instauração de processos criminais desnecessários e assegurar a cobrança de receitas fiscais em dívida por parte dos contribuintes e, essencialmente, não sobrecarregar a justiça criminal fiscal com bagatelas.
A única diferença entre ambas as normas é que a última - a do n.º 6 do artigo 105.º do RGIT - parece, ao menos em abstracto, abranger todos os casos em que estejam em causa prestações de...
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