Acórdão nº 0636918 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO DE ALMEIDA
Data da Resolução18 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

B……………. veio propor esta acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma sumária, contra C……………..

Pediu o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o prédio urbano parcialmente ocupado pela Ré e a condenação desta a restituir-lhe a casa sobradada que habita e que integra o dito imóvel.

Como fundamento, alegou que o direito de propriedade sobre o referido imóvel está inscrito a seu favor e que a Ré ocupa uma das casas sobradadas que o compõem sem qualquer título e sem autorização da A, recusando-se a restitui-la.

A R. contestou, alegando que D……………, o seu ex marido e primitivo arrendatário da casa em apreço, cedeu-lhe tacitamente a sua posição de locatário em 1987 e com o consentimento da A e do seu marido, entretanto falecido. Invocou o abuso do direito da A, porquanto esta sabe que a Ré se encontra a residir naquela casa há mais de 30 anos. Caso assim se não entenda, deverá considerar-se que, em 1987, celebrou um contrato de arrendamento verbal com a A e o seu marido, pois estes acederam a que a Ré habitasse na casa desde então. Pagou sempre as rendas, que eram recebidas pelo falecido marido da A e pela A.

Respondendo, a A alegou que, em 1968, concluiu um contrato de arrendamento verbal com o então marido da Ré e que só teve conhecimento da morte deste no início de 2005, altura em que também tomou conhecimento de que o mesmo já se encontrava divorciado da Ré e que o divórcio ocorrera em 1987. A A consentiu que a R continuasse a habitar na casa, somente porque estava convicta que esta ainda permanecia casada com o primitivo inquilino. Por tal facto, recebia as rendas e emitia os respectivo recibos em nome do ex-marido da Ré, D…………...

Percorrida a tramitação normal, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, tendo a Ré sido absolvida do pedido.

Discordando do decidido, interpôs recurso a Autora, de apelação, tendo apresentado as seguintes Conclusões: 1. A douta sentença recorrida é nula por não se ter pronunciado, como devia, quando à peticionada condenação da apelada em reconhecer o direito de propriedade da apelante sobre o imóvel dos autos (alínea d) do nº 1 do art. 668° do CPCivil).

  1. A douta sentença recorrida devia ter julgado a acção totalmente procedente, condenando a apelada a reconhecer o aludido direito de propriedade e a restituir a casa sobradada dos autos, que esta ocupou, à apelante.

  2. A apelada não tem qualquer título que suporte essa ocupação.

  3. Inexiste qualquer fundamento legal que determine a recusa dessa restituição.

  4. Assim, a sentença recorrida violou o disposto no art. 1311° do C.Civil.

  5. Com efeito, no que respeita a essa restituição, dos autos resulta claramente a incomunicabilidade da posição de arrendatário à apelada bem como a caducidade do contrato de arrendamento celebrado entre o antecessor da apelante e o ex-marido da apelada.

  6. A prova de qualquer facto impeditivo da recusa da restituição da casa dos autos à apelante, atendendo à presunção do registo consignada no art. 7° do C.R.Predial, cabia à apelada (cfr. nº 2 do art. 342° do C.Civil).

  7. Não se provou qualquer cedência tácita ou expressa mesmo que a apelante tivesse reconhecido a apelada como beneficiária dela.

  8. Pelo contrário, provou-se que a apelante permitiu que a apelada permanecesse na casa dos autos por estar convencida que esta continuava casada com o titular, como inquilino, do contrato de arrendamento (facto nº 15 da douta sentença recorrida).

  9. O facto de a apelante saber, desde data indeterminada, anterior a 29.12.1993, que esse inquilino (actual ex-marido da apelada) deixou de ter residência permanente na casa dos autos e que a apelada se manteria a habitá-la, não é determinante nem permite concluir qualquer cedência ou comunicabilidade do arrendado uma vez que, face à lei vigente à data do divórcio e à do citado conhecimento, o senhorio nada podia opor a essa circunstância sendo obrigado a aceitar a manutenção do contrato de arrendamento com esse primitivo inquilino (art. 1093° nºs 1 i) e 2 c) do C. Civil e art. 64° nºs 1 i) e 2 c) do RAU).

  10. Nos contrato de arrendamento a lei a aplicar é a que vigore à data dos factos que possam determinar consequências para a vigência ou alteração dos vínculos assumidos naqueles contratos (Ac. do STJ, de 6/7/2001, in BMJ 499-300 e Ac. do STJ, de 12/2/2004, proc. 03B4105, in www.dgsi.pt).

  11. A comunicabilidade da posição de arrendatário ao cônjuge do inquilino, para ser eficaz relativamente ao senhorio depende sempre da comunicação prevista no art. 1038°, alínea g) do C.Civil.

  12. Nem no prazo de 15 dias a contar do divórcio nem nunca essa comunicação de cedência ou decisão judicial para efeitos daquela comunicabilidade foi provada ter sido feita.

  13. Mantém-se pois o regime geral de incomunicabilidade do arrendamento dos autos a favor da apelada, consignado nos arts. 1110°-1 do C.Civil e art. 83° do RAU, uma vez que a apelada não logrou provar o regime exceptivo previsto, respectivamente, nos nºs. 2 a 4 do art. 1110° do C. Civil ou no art. 84° do RAU.

  14. De resto, mesmo que essa prova exceptiva tivesse sido feita, sempre essa comunicabilidade não produzia efeitos ou seria inexistente de valor prático, face à ineficácia, tanto no sentido amplo como restrito, determinada pela falta de comunicação exigida pela alínea g) do art. 1038° do C. Civil.

  15. Assim o contrato de arrendamento dos autos caducou em 24 de Setembro de 2002, tendo-se mantido titulado pelo ex-marido da apelante até essa data, apesar da ocorrência do divórcio em Maio de 1987, não sendo despiciendo e até releve que a apelante apenas teve conhecimento desses dois factos somente em início de 2005.

  16. Estão, por conseguinte, preenchidos os requisitos da caducidade do contrato de arrendamento dos autos constantes do corpo e da alínea d) do art. 1051° do C.Civil.

  17. Na douta sentença recorrida, para além do art. 1311° do C. Civil, violaram-se ou interpretaram-se incorrectamente as normas jurídicas supra indicadas, porquanto deveriam ter sido no sentido de concluir pela inexistência de qualquer fundamento legal que permitisse decidir pela recusa da restituição da casa dos autos à apelante.

    Termos em que se deve conceder provimento à presente apelação e, por via disso, acordar-se na anulação da douta sentença recorrida e na substituição da decisão pela que...

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