Acórdão nº 0415798 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Dezembro de 2006
Magistrado Responsável | MARIA LEONOR ESTEVES |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em audiência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório No ….º juízo do Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foi submetido a julgamento o arguido B……………., devidamente identificado nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu condená-lo, como autor material de um crime de desobediência simples, p. e p. pelo art. 348.º n.º 1 do C. Penal, na pena de 50 dias de multa à taxa diária de 4 € e nas custas do processo.
Inconformado com a sentença, dela interpôs recurso o arguido, pedindo que seja revogada e substituída por outra que o absolva da prática daquele crime, formulando as seguintes conclusões: 1 - Respeita o recurso que ora se interpõe exclusivamente a matéria de direito.
2 - O arguido respondeu acusado da prática de um crime de desobediência simples, p. e p. pelo art° 348°, n° 1 do C. Penal, com referência ao art° 100°, n° 1 do D. L n°555/99, de 16/12. E por tal foi condenado.
3 - Afigura-se, no entanto, ao arguido faltar no caso dos autos um dos requisitos do tipo legal de crime em questão: a emanação por autoridade competente da ordem ou mandado legítimo.
4 - Nos termos do disposto no art° 109°, n° 1 daquele D. L n° 555/99, de 16/12, que regula o regime jurídico da urbanização e edificação, foi o arguido notificado para encerrar o estabelecimento comercial de padaria pelo mesmo explorado.
5 - Nos termos desta última norma legal, é ao presidente da câmara que compete ordenar e fixar prazo para a cessação de utilização de um edifício ou fracção autónoma.
6 - Tal competência exclusiva do presidente da Câmara não é delegável em vereadores, como parece resultar expressamente daquele mesmo D. L.
7 - Com efeito, tal diploma prevê de forma expressa em variados locais ao longo do seu conteúdo a possibilidade de determinadas competências do Presidente da Câmara serem delegadas ou subdelegadas; chegado ao mencionado art° 109°, n° 1 (que respeita não propriamente a situações de fiscalização, mas a medidas de tutela da legalidade urbanística) o mesmo diploma não prevê tal possibilidade.
8 - E, se o quisesse, tê-lo-ia previsto, como fez noutras situações; se não o disse, é porque não quis que tal acontecesse.
9 - Assim, não sendo, como é óbvio, legalmente admissível a "delegação" de competências "indelegáveis", se na sequência de tal "delegação", um vereador ordena a cessação de utilização de um estabelecimento, fá-lo de ilegítima e ilegal, sem ter poderes para tal.
10 - Não emanou, pois, a ordem de entidade competente, não sendo esta conclusão, de forma alguma, colocada em crise pelo disposto no art° 69° do D. L. n° 169/99, de 18/09, referido na sentença sob recurso (aliás, no sentido ora defendido pelo recorrente veja-se o vertido no art° 35°, n° 1 do C. Proc. Adm.).
11 - Mas, mesmo que assim não se entenda, sempre se colocaria uma outra questão, qual seja a da validade do acto de delegação: é que, para que um acto de delegação ou subdelegação seja válido e eficaz, tem necessariamente o órgão delegante ou subdelegante de especificar os poderes que são delegados ou subdelegados, quais os actos que o delegado ou subdelegado pode praticar, devendo tal acto ser publicado no boletim da autarquia e afixado nos lugares do estilo, quando tal boletim não exista (art° 37, nos. 1 e 2 do C. Proc. Adm.).
12 - Para aferir da competência do autor do acto ("in casu", o vereador), não basta a invocação, por este, de que foi praticado com competências subdelegadas, conforme ocorreu no caso dos autos; é obrigatório que se identifique de forma cabal os actos de delegação ou subdelegação, designadamente os seus autores, bem como as datas e os locais onde estão ou foram publicados.
13 - Assim, sendo inválido o acto de delegação, a consequência será a inexistência de competência por parte do vereador, o que se traduzirá na ilegitimidade da ordem que foi dada, pelo que o seu não acatamento jamais poderá levar ao cometimento de um crime de desobediência.
14 - Nada constando dos autos quanto a estas últimas questões ora levantadas, jamais poderia o arguido ser condenado como foi.
15 - Violou, pois, a Ma Juiz "a quo" os arts. 348°, n° 1 e 1°, n° 1 do Código Penal, bem como os arts. 100°, n° 1 e 109°, n° 1 do D. L. n° 555/99, de 16/12 e os arts. 35°, n° 1 e 37°, nos 1 e 2 do Código de Procedimento Administrativo.
16 - A Ma Juiz "a quo" interpretou pois incorrectamente as normas dos artigos indicados no item anterior, aí enquadrando os factos dados como provados, julgando-os susceptíveis de configurarem, na forma de autoria material, o crime de desobediência simples.
17 - Como se referiu nestas alegações, encontra-se por preencher um dos requisitos desse tipo legal de crime, pelo que...
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