Acórdão nº 0614664 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelANDRÉ DA SILVA
Data da Resolução22 de Novembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 4664/06 Processo n.º ……/03.1PEVRL da Comarca de Vila Real Relator: Des.º André da Silva Adjuntos: Des.º Francisco Marcolino Des.º Ângelo Morais Acordam na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I Relatório 1º A decisão de 1ª instância: - Tribunal Singular - Tribunal Colectivo "Decide-se considerar a acusação deduzida improcedente por não provada e em consequência, absolve-se o arguido B……….. da prática em autoria material de um crime de detenção de estupefaciente para consumo p. e p. pelo art.º 40º n.ºs 1 e 2 do Dec. Lei n.º 15/93 de 22/01".

  1. O Recurso: Inconformado com a decisão, veio o Digno Magistrado do M.º P.º interpor recurso tendo concluído da seguinte forma: a) o arguido vinha acusado da prática de um crime de consumo de estupefacientes, previsto e punido no art.º 40º, n.º 1 e 2, do decreto-lei n.º 15/93, de 22-01.

    1. fez-se prova de que o arguido destinava a heroína, com peso de 1,694 gramas, ao consumo pessoal; c) tal quantidade de estupefacientes excede o consumo médico por 10 dias; d) em tais circunstâncias, o arguido deveria ter sido condenado pelo crime de consumo de estupefacientes, previsto e punido no artigo 40º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01, já que tal preceito não foi revogado pelo art.º 28º da citada Lei n.º 30/2000.

    2. ao decidir que o art.º 40º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01 está revogado e que o arguido não pode ser condenado por tal crime, não obstante os factos dados como provados, interpretou-se erradamente a lei.

    3. devendo por isso a sentença ser revogada e substituída por decisão que condene o arguido pelo cometimento do citado crime de crime de consumo de estupefacientes, previsto e punido no art.º 40º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-01.

    Aproveitando a modéstia do meu parecer, analisando os autos e revogando e alterando a decisão sob recurso, farão V.ªs Exas, Justiça.

    A fls. 168 o recurso foi admitido.

  2. - Resposta: O arguido não respondeu ao recurso interposto.

    Os autos subiram a este Tribunal Superior e aqui o Senhor Procurador Geral Adjunto é de parecer que deve ser negado provimento ao recurso.

    Cumpriu-se o art.º 417º n.º 2 do CPP e nada foi requerido.

    Colheram-se os vistos legais.

    Procedeu-se ao julgamento com observância do legal formalismo sendo: 4º - Os factos provados os seguintes: 1. No dia 17/05/03, pelas 09h30horas, e quando se encontrava na qualidade de utente, no serviço de urgências do Centro Hospitalar Peso da Régua/Vila Real, detinha no bolso do par de calças que trazia vestidas, quatro pequenos pacotes de plástico, contendo dois deles, com o peso líquido de 1,694 gr. De heroína e o contido nos restantes dois, com o peso líquido de 1,314 gr. De cocaína, tendo tais pacotes vindo a ser apreendidos por agente da PSP e examinados parcialmente.

    1. O arguido adquirira tais produtos, cuja natureza e características bem conhecia, com vista ao seu próprio consumo, em Felgueiras, em data não apurada, os quais faziam parte de um lote de 2,5 gr. De heroína e de 2,5 gr. De cocaína, que o arguido já havia consumido parcialmente, tanto fumada, como pela via injectada.

    2. Agiu consciente e livremente, bem sabendo que a sua conduta é censurada por lei.

    3. O exame pericial efectuado no arguido em 21/01/2004, tendente a apurar do seu eventual estado de toxicodependência, não detectou o uso de quaisquer drogas.

    4. O arguido apresenta diversas condenações anteriores, dando-se aqui cumprido pena de 2 anos e 10 meses de prisão, tendo saído em liberdade no passado dia 19 de Março do corrente ano de 2006.

    5. O arguido fez entretanto tratamento de desintoxicação, não tendo voltado a consumir estupefacientes.

    6. O arguido confessou integralmente e sem reservas os factos supra descritos.

  3. Factos não provados: Com interesse para a causa não existem nenhuns.

  4. Motivação: Após a discussão da causa, o Tribunal baseou a sua convicção na prova documental junta aos autos, designadamente, nos documentos juntos a fls. 3 a 5, 27, 58 a 60 e 63 a 65 e no CRC acima indicado.

    Além disso, foi ainda relevante a confissão integral e sem reservas efectuada pelo arguido em sede de audiência de julgamento.

    II Fundamentação Como ficou dito o arguido B………….. foi absolvido da prática de um crime de consumo de estupefacientes p. e p. pelo art.º 40º n.ºs 1 e 2 do DL n.º 15/93 de 22/01, crime esse pelo qual se mostrava acusado.

    Como é sabido, o âmbito do recurso é determinado pelas conclusões que o recorrente extrai na sua motivação só abrangendo as questões nestas contidas - cfr. art.º 412º n.º 1 do CPP.

    A única questão a decidir nos presentes autos é saber se a detenção para consumo de heroína que exceda o consumo médio por 10 dias, constitui o crime p. e p. pelo art.º 40º do Dl n.º 15/93 de 22/01.

    A tese da sentença recorrida vai no sentido da despenalização do art.º 40º n.ºs 1 e 2 daquele DL citado, sendo que os factos apurados apenas permitem a integração da conduta do arguido como ilícito de contra-ordenação ao abrigo do preceituado na Lei 30/2000 de 22/09.

    Por seu turno, o Ex.mo recorrente entende que, e porque a quantidade de estupefaciente excede o consumo médio por 10 dias, o arguido deve ser punido pelo art.º 40º já citado, pois o mesmo não foi revogado pelo art.º 28º da citada Lei n.º 30/2000.

    Já defendemos no processo n.º 4394/06 desta Relação, e de cujo Acórdão fomos também Relator, numa situação como a dos autos que se verifica o crime previsto pelo art.º 40º n.º 2 do DL n.º 15/93 não obstante a revogação em termos genéricos do citado art.º 40º, revogação essa alterada pelo art.º 28º da citada Lei n.º 30/2000.

    No caso concreto fez-se prova que a heroína com o peso liquido de 1,694 gramas e a cocaína com 1,314 gramas encontradas na posse do arguido, se destinavam ao seu consumo pessoal. A quantidade média diária de consumo está fixada em 0,1 gramas conforme a Portaria n.º 93/96 de 26/03/96. A quantia apreendida ao arguido excede o consumo médio de tal droga pelo período de 10 dias conforme consta das disposições conjugadas do art.º 40º n.º 2 do DL n.º 15/93, na Tabela anexa à Portaria n.º 94/96 de 26/03 e art.º 2º n.º 2 da Lei n.º 30/2000 de 29/11.

    Há quem defenda que a situação dos autos configura uma simples contra-ordenação; não é esse o nosso entendimento.

    Na verdade, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 30/2000 de 29/11, tal questão foi levantada, pois o seu art.º 28º revoga o art.º 40º do DL n.º 15/93 excepto quanto ao cultivo, e no seu art.º 2º n.º 1 qualifica o consumo de produto estupefaciente como contra-ordenação; mas, diz o n.º 2 desse mesmo preceito que a detenção de estupefaciente para consumo só é contra-ordenação se não ultrapassar o consumo médio individual durante 10 dias. A questão é exactamente esta. Ou seja, como qualificar a detenção de produto estupefaciente quando excede o consumo médio individual de 10 dias? Sobre a questão, e citando o Acórdão da Relação de Coimbra de 16 de Junho de 2004, In CJ, Tomo III - 2004, tem-se teorizado do seguinte modo: "Cristina Líbano Monteiro in RPCC, 2001, vol. I, pág.67, e tendo em conta que se trata de interpretação mais favorável ao arguido, entende que o legislador não quis revogar completamente o art.º 40º referido, pelo que, "onde as palavras parecem apontar, para um completo desaparecimento do art.º 40 da lei de 93 (excepto no que diz respeito ao...

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