Acórdão nº 0634582 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução26 de Outubro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO.

  1. No …..º Juízo Cível do Porto, …..ª Secção, B………. instaurou acção especial de insolvência de pessoa singular contra C………. e D…………, requerendo a sua declaração de insolvência e bem assim a sua notificação para, designadamente, identificarem os seus cinco maiores credores.

    Alega, para tanto e em síntese, que é credor dos requeridos pelo valor de 57.385,80 Euros, para cujo recebimento instaurou acção executiva que corre termos no …º Juízo de Execução do Porto, ….ª Secção, sob o nº …../03.3TVPRT, no âmbito da qual foram penhorados vários imóveis e em que, na fase de reclamação de créditos, reclamaram créditos o Ministério Público, em representação do Estado - 25.149,53 Euros - e o "E……….., S.A." - 532.833,29 Euros -, montantes aos quais acrescem juros de mora, encontrando-se os requeridos impossibilitados de cumprir as suas obrigações por não lhes serem conhecidos, nem terem quaisquer bens, suficientes para pagamento das importâncias de que são devedores, que incluem outras pessoas ou entidades, nem crédito bancário ou de outra natureza.

  2. Os requeridos deduziram oposição e, tendo junto o documento de fls. 50 que intitularam "Lista dos Principais Credores ...", da qual fazem parte o "E………, S.A.", "F………., Ldª", "G………., Ldª", "H………, Ldª" e a Fazenda Pública por dívidas fiscais, nela impugnaram parcialmente os factos alegados pelo requerente, aduzindo, em resumo, que, posteriormente à instauração da acção, liquidaram parte dos créditos reclamados pelo Ministério Público e em relação a um outro crédito o processo se encontra suspenso na sequência de reclamação graciosa, e que, relativamente ao débito à instituição bancária, a execução se encontra suspensa por terem chegado a acordo quanto ao pagamento da quantia exequenda.

    Concluem pela improcedência da acção.

  3. Procedeu-se à realização da audiência de julgamento na qual foram fixados, sem censura, os factos assentes e organizada a base instrutória, com posterior declaração dos factos provados e não provados, que não foi objecto de reclamações, vindo a ser proferida sentença que indeferiu a requerida declaração de insolvência dos requeridos.

  4. Inconformado com a decisão, dela apelou o requerente que terminou as suas alegações com as seguintes conclusões: A) DA MATÉRIA DE FACTO: 1ª: Como decorre do preceituado no artigo 690º A do Código de Processo Civil, explicita-se que o presente recurso da matéria de facto pretende alterar a resposta dada ao quesito 3º da base instrutória, na parte em que considerou como não provada que "para além do requerente devem os requeridos a outras pessoas e entidades e ao fisco".

    1. : Tendo por base a confissão dos requeridos, consubstanciada no documento junto como doc. 1 à contestação (fls. … dos autos), com a epígrafe "lista dos principais credores de C………. e mulher D…………".

    2. : Ora, como se vê daquele documento, foram os próprios requeridos que confessaram dever a outras pessoas, entidades e fisco.

    3. : Já que no mesmo constam como credores, para além do Banco E………., S.A., as sociedades "F…………, Ldª", "G………., Ldª" e "H…………, Ldª".

      E ainda 5ª. A Fazenda Pública por dívidas fiscais.

    4. : E tal dívida à Fazenda Pública, não é aquela que os requeridos pagaram em 14.12.2005, e que se encontrava na reclamação de créditos elaborada pelo Ministério Público no âmbito da execução que corre termos na 3ª Secção do 1ª Juízo de Execução do Porto.

    5. : Pois a confissão plasmada no documento junto à contestação é posterior à data acima indicada de 14.12.2005.

    6. : Assim é inequívoco, por confissão dos próprios requeridos, que os mesmos também devem à Fazenda.

    7. : Pelo que deveria o terceiro quesito da base instrutória ter sido dado como provado em parte mais ampla do que o foi efectivamente, contemplando que "Para além do requerente devem os requeridos a outras pessoas e entidades, banco e fisco".

    8. : Nos termos do artº 376º do Código Civil, porquanto tal documento contém factos que devem ser considerados provados, na medida em que são contrários aos interesses dos declarantes (requeridos) e não foram impugnados pelo requerente.

      1. DO DIREITO.

    9. : O recorrente não se conforma com a decisão aqui em recurso, já que deveria ser decretada a insolvência dos requeridos.

    10. : De acordo com a jurisprudência, os factos enunciados no artº 20º, nº 1, do CIRE, constituem meros índices da situação de insolvência dos requeridos, assumindo, pois, a natureza de presunções juris tantum.

    11. : Tais factos devem ser apreciados objectivamente pelo julgador, no entanto, não deve haver especiais exigências de prova.

    12. : É que - como acentuavam Luís Carvalho Fernandes e João Labareda em anotação ao anterior artº 8º - é preciso não perder de vista a circunstância de estarmos aqui em presença de comportamentos alheios ao requerente, que ele naturalmente não domina.

    13. : Ora, feita a prova pelo requerente de qualquer dos factos contidos nas alíneas daquele artigo, ficará o requerido com o ónus da prova da sua situação de insolvência conforme preceitua o artº 30º, nº 4, do CIRE.

    14. : Tudo conforme doutamente exposto no Ac. Tribunal da Relação do Porto de 03.11.2005 (in Acórdãos TRP, processo 0534960).

    15. : Não existem dúvidas que de acordo com a matéria dada como provada resulta claro que os requeridos estão impossibilitados de cumprir as suas obrigações e, por isso, de acordo com a definição constante do nº 1 do artº 3º do CIRE, devem ser considerados insolventes.

    16. : O requerente enquadrou a insolvência dos requeridos nas alíneas a), b) e g) do nº 1 do artº 20º do CIRE, estando convicto que, pelo menos os factos que caracterizam os pressupostos constantes das alíneas b) e g) daquele preceito foram provados.

    17. : Assim no que respeita à alínea b) "Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade do devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações".

    18. : Dir-se-à que ficou provado, pelo menos, que para além do requerente, o requerido deve ao banco (resposta ao quesito 3º).

    19. : E de acordo com o recurso da matéria de facto acima exposto, dever-se-à também dar como provado que os requeridos devem a outras pessoas e entidades e ao fisco (como acima se alegou).

    20. : Ora, só por si, as dívidas ao requerente e ao Banco pelos seus montantes e circunstâncias do incumprimento são reveladoras da impossibilidade de pagamento, já que: 23ª: Em 04.04.2003 foi celebrado acordo de revogação de contrato promessa tendo no âmbito desse acordo os requeridos assumido várias obrigações designadamente: - devolver ao requerente, o sinal em singelo, no montante de 47.385,80 Euros impreterivelmente até ao dia 31.1.2003; - Na falta de pagamento integral e atempado desse montante os requeridos terão de pagar aos requerentes a título de cláusula penal o montante de 10.000 Euros, quantia esta que acresce ao valor que se obrigou a devolver.

      Tal matéria de facto ficou provada e consta da alínea D).

    21. : Desde logo ressalta que os requeridos, porque não cumpriram atempadamente a sua obrigação de devolução do valor em singelo, presumivelmente por falta de capacidade financeira para o fazer, colocaram-se na obrigação de pagar mais 10.000 Euros (cerca de 20% superior à que teriam de pagar se o fizessem atempadamente).

    22. : Passados cerca de dois anos, e apesar de terem sido alvo de execução e pedido de insolvência, os requeridos continuaram sem pagar ao requerente, o que só por si revela a sua insuficiência de fundos para cumprir as suas obrigações.

    23. : No entanto, para além da dívida ao requerente, os requeridos também não cumpriram as suas obrigações com o Banco E………., credor hipotecário, a quem devem a quantia de 532.833,29 Euros.

    24. : O que originou que essa instituição tivesse intentado também uma execução contra os requeridos (tudo conforme se vê pela resposta ao quesito 9).

    25. : Ora, o facto de se ter suspendido a execução, só por si, não ultrapassa a existência da mesma (não houve qualquer desistência), nem detém qualquer efeito sobre a dívida, que efectivamente continua a existir e não foi paga.

    26. : Ou seja, só entre o Banco e o requerente o valor em dívida pelos requeridos ascende a 590.219, 09 Euros.

    27. : Quantia essa que obviamente tem de ser considerada, para efeitos legais, como muito avultada.

    28. : E à qual terá de se somar os valores devidos aos outros credores...

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